Selic precisa subir, mas PIB fraco vai forçar um corte possivelmente no ano que vem, dizem analistas
Analistas de 4 casas falam de causas e consequências da alta da Selic
Não houve surpresas na divulgação de uma Selic de 9,25% ao ano para a maior parte do mercado financeiro. A nova taxa veio em linha com as expectativas de gestores e investidores. No entanto, o PIB fraco vai forçar o Banco Central (BC) a cartar a taxa de juros assim que a inflação se normalizar, e isso pode acontecer a partir do segundo semestre do ano que vem.
Essa é a opinião dos analistas de quatro casas: XP, Itaú, Nova Futura, Messem Investimentos. Eles comentaram a última decisão da autoridade monetária ontem, após o fechamento do mercados.
Selic vai subir ainda mais no começo do ano que vem
Os especialistas na Nova Futura destacam o trecho do comunicado do Comitê de Política Monetária, emitido logo após o término da reunião da última quarta-feira, que observa o movimento contínuo de alta da inflação. Para o BC, além de superar as expectativas, a inflação surpreende por estar bastante difusa.
De acordo com o comunicado do Copom, as projeções de IPCA para 2021 subiram de 9,5% para 10,2%, de 4,1% para 4,7% em 2022, e de 3,1% para 3,2% em 2023. Uma alta que ocorre mesmo com “as reduções nas projeções de preços administrados, levando a crer que boa parte da revisão se deve à uma visão mais altista nos preços livres”.
Outro ponto que chamou a atenção dos profissionais da Nova Futura foi o que descreve que ‘o Comitê irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação, como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.’
Por tudo isso, a opinião dos analistas é a de que “o Copom vai prezar pelo controle das expectativas de inflação, que se encontram desancoradas até 2023, neste momento, apesar da queda nos prêmios de riscos fiscais, com a aprovação da PEC dos Precatórios, e a perspectiva de recessão prolongada”.
Assim, segundo eles, apesar de ressaltar as elevadas incertezas no cenário global e os dados de atividade abaixo do esperado, o Comitê segue convicto da necessidade de avançar sobre o terreno contracionista da política monetária, prometendo um ajuste da mesma magnitude na próxima reunião, marcada para 2 de fevereiro de 2022.
“Devemos ver a taxa Selic em níveis elevados por período de tempo considerável, pelo menos, até o fim do 1º semestre de 2022. Por ora, antecipamos nova alta de 1,50% na próxima reunião e outra alta de 1,00% na reunião de março, fazendo a taxa Selic encerrar o ciclo e 2022 em 11,75%”
Nova Futura
Ao mesmo tempo, ao considerar o atual cenário de piora na atividade econômica e uma queda na taxa de câmbio diante de perspectivas otimistas com a agenda econômica do próximo governo, o time da casa, acredita que o Copom terá de cortar a taxa Selic no segundo semestre de 2022.
PIB mostra economia desaquecida
Para o head de Renda Variável da Messem Investimentos, Gustavo Bertotti, a decisão do Copom em aumentar em 1,5 ponto porcentual a taxa Selic, passando de 7,75% para 9,25% ao ano, é condizente com o momento da economia do Brasil.
"Não faria sentido aumentar mais que isso, já que, mesmo diante de um cenário inflacionário, há dados de estagnação econômica"
Gustavo Bertotti - Messem Investimentos
Para justificar seu entendimento, Bertotti citou os últimos dados trimestrais do PIB e de vendas no varejo, que mostraram que a economia brasileira está desaquecida. "Por isso, foi a melhor decisão repetir o aumento de 1,5 pp da última reunião do Copom".
O PIB brasileiro registrou queda pelo segundo trimestre consecutivo, e o Brasil entrou em recessão técnica. Segundo dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a queda foi de 0,1% em relação ao segundo trimestre. Já as vendas do comércio varejista recuaram 0,1% em outubro ante setembro, a terceira queda seguida, informou o IBGE.
BC não pode ‘esperar para ver’
Para a equipe de Macroeconomia da XP, a decisão do Copom segue a tendência de controle da inflação e restrições diante de um cenário incerto e desafiador.
“O desafio para a política monetária continua grande. A inflação ao consumidor segue rodando muito acima da trajetória de metas e ainda há pressões no atacado para que sejam repassadas adiante”, explicam os analistas.
No entanto, “as incertezas ainda elevadas no cenário global e a redução da credibilidade fiscal no Brasil não permitem ao BC ‘esperar para ver’. Ele terá que continuar avançando no território contracionista para garantir a ancoragem das expectativas e se assegurar que os repasses de custos aos consumidores estarão mesmo mais contidos”, explicam os especialistas da XP.
O impacto da Selic na renda fixa
O time da XP também ressalta que, além do controle da economia, a Selic impacta diretamente os investimentos, principalmente na Renda Fixa.
“Esse reajuste não deve mudar tanto a curva de juros, uma vez que a maioria do mercado já precifica este movimento. Sendo assim, nossa visão para os ativos de renda fixa pouco se altera, bem como seus preços e taxas negociados no mercado”, comenta Camilla Dolle, head de Research de Renda Fixa da XP Investimentos.
Segundo ela, sobre o impacto real nos investimentos, há uma leve vantagem para títulos prefixados e indexados ao IPCA de prazos mais curtos, os quais também possuem uma parcela adicional prefixada (IPCA+X%).
Ambos os títulos apresentariam uma desvalorização por conta da taxa prefixada, sendo possível conseguir rentabilidades mais interessantes para prazos mais longos, a preços mais baixos em relação ao período pré-Copom.
“Neste cenário, com a redução dos prêmios (taxas) de longo prazo, os títulos de prazos mais longos se valorizam no mercado secundário, o que resultaria em possibilidade de ganhos de capital para quem já tivesse os títulos e decidisse vendê-los antes do vencimento, para capturar esta possível oportunidade”, acrescenta a especialista.
Para os títulos pós-fixados, que acompanham a taxa de juros, não haveria alterações de cenário.
Alta do DI favorece investidor mais conservador
Um outro viés é analisado por Martin Iglesias, especialista líder em investimentos e alocação de ativos do Itaú Unibanco. Com a alta da Selic, os investimentos mais conservadores indexados ao DI também projetam rentabilidades reais interessantes. Condição que já era oferecida pelos títulos indexados à inflação e pela bolsa de valores para investidores que aceitam assumir maior grau de risco.
Com a possibilidade aberta aos investimentos atrelados ao DI, os investidores de perfil mais conservador também serão atendidos com retorno mais atraente.
"Se as decisões sobre a carteira de ativos estiverem de acordo com o perfil de cada investidor, as chances de ter oportunidade de ganhos será muito maior neste cenário”, complementa Iglesias.