Especialistas concordam que Selic deverá subir menos em março e divergem sobre tamanho da taxa e fim do ciclo
Se alta dos juros americanas for muito acentuada, Selic pode chegar a 14% ao ano, prevê especialista
A principal novidade indicada pelo Comitê de Política Monetária, Copom, em comunicado divulgado logo após o término da reunião desta terça-feira, 2, foi a de que a Selic não terá um aumento da mesma magnitude, de 1,5 ponto porcentual, em março. Esse foi um entendimento unânime entre os economistas e analistas do mercado financeiro, mas sobre se esse movimento indica que o fim de ciclo de alta está mais perto ou mais distante, e ao nível a ser alcançado pela taxa, há divergências.
"Em relação aos seus próximos passos, o Comitê antevê como mais adequada, neste momento, a redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros. Essa sinalização reflete o estágio do ciclo de aperto, cujos efeitos cumulativos se manifestarão ao longo do horizonte relevante."
Comitê de Política Monetária do Banco Central - Copom
Foi esse trecho do documento que deu a pista ao mercado. Como nas três últimas reuniões o ajuste foi de 1,5 ponto porcentual, as apostas recaem agora em algo entre 1,25 e 1 ponto porcentual para a elevação da taxa.
Segundo Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, explica que havia uma divisão de opiniões em relação a essa possibilidade, ou não, de as autoridades monetárias revelarem o tamanho da alta a ser aplicada à Selic na próxima reunião do Copom, em 16 de março.
Para o estrategista, isso pode ter sido precipitado, ou "traiçoeiro", porque não vê a perspectiva de desaceleração da inflação nesse primeiro trimestre do ano, e boa parte do mercado reclama e já precifica essa inflação mais persistente na curva de juros futuros. Segundo ele, trata-se de um risco, que é relevante e será acompanhado nos próximos 45 dias pelo mercado, e pode até levar o BC a voltar atrás até a próxima decisão, de modo a segurar as expectativas.
Para André Perfeito, economista da Necton, o comunicado "aponta claramente para o fim do aperto no ritmo atual de 150 pontos-base e o tom do comunicado nos pareceu marginalmente hawkish ao apontar diversos desafios, em especial a questão fiscal e a inflação mais persistente. Provavelmente o Banco Central preferiu agir mais duramente agora para abrir espaço para o fim do ciclo".
Perfeito espera por uma alta de 75 pontos base e mais uma de 50 o que faria a taxa fechar em 12%. No entanto, ele ressalta que é preciso avaliar a ata do Copom, na próxima semana, porque, ao dedicar mais atenção ao ano calendário de 2023, "talvez haja espaço para uma alta de 100 pontos-base e depois mais nenhuma fazendo a taxa ficar em 11,75%".
Além dessa questão de ritmo menor na elevação dos juros, Cruz destaca mais dois pontos no comunicado: "O ambiente menos favorável por conta da alta de juros nos Estados Unidos, e também com a covid-19 postergando a normalização das cadeias globais de produção". É que são fatores que estão totalmente fora do controle do Banco Central aqui, e por isso a autoridade monetária reconhece que nesse ano será bem mais difícil e desafiador cortar os juros e mantê-los em níveis mais baixos.
"O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas, e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária".
Comitê de Política Econômica do Banco Central - Copom
O estrategista chefe da Davos Investimentos, Mauro Morelli também destaca o fato de o Copom sinalizar um aumento menor que 1,5 ponto porcentual da Selic nas próximas reuniões, deixando uma margem para mudanças, caso as condições econômicas e de inflação mudem até lá.
Ao contrário de Cruz, no entanto, Morelli entende que esse movimento do Copom já mostra que o ciclo de aumento de juros está no final, o que é positivo para a economia e o crescimento do País. De acordo com o estrategisya da Davos, agora as atenções se voltam para os próximos números de inflação para saber se um avanço mais modesto dos juros poderá ser mesmo colocado em prática na próxima reunião dos diretores do Banco Central.
Samuel Cunha, sócio da H3 diz que "o aumento dos juros não deve parar por aqui, o movimento de alta deve continuar, pode ser que não continue com a mesma intensidade, de 150 bases points, e deve se encerrar próximo a 12%, até o meio de 2022".
Na opinião de Paloma Brum, analista de Investimentos da Toro, os dirigentes do Copom demonstraram uma visão de política monetária ainda mais contracionista para este ano, com a Selic devendo ser elevada para 12% já neste primeiro semestre e encerrando o ano em 11,75%.
"Possivelmente, os membros do Comitê devem subir os juros em mais 0,75 ponto percentual na reunião de março e mais 0,5 ponto percentual na reunião de maio", o que levaria a Selic ao nível de 12%.
"Na minha visão, entretanto, o ciclo de alta nos juros americanos, mais acelerada do que o esperado, pode demandar uma Selic ainda mais elevada até o final de 2022, próxima dos 14%, para reter capital no País, evitando um câmbio mais depreciado, o que aumentaria a pressão inflacionária na economia brasileira", complementa Paloma.
As consequências de Selic mais alta nos investimentos
Vitória leyne da PHI investimentos ressalta que as projeções do mercado apontam para a possibilidade de a Selic chegar a 11,75% já em maio.
"É importante que o investidor entenda as consequências da alta Selic, até para ele não ser pego de surpresa. O aumento da Selic causa uma desaceleração econômica e impacta setores específicos da bolsa, como empresas da construção civil, do varejo e de tecnologia".
Vitória Ieyne - PHI Investimentos
Ela explica que o setor de construção sofre porque trabalha com um produto que está muito atrelado ao crédito e, conforme o custo dos empréstimos vai subindo, a compra de um imóvel fica mais cara também.
Já o setor de varejo é afetado, de acordo com Vitória, porque diminui a quantidade de dinheiro para as famílias. "Os consumidores passam a gastar mais com as operações de crédito e sobra menos dinheiro para o consumo". E os produtos mais caros são os mais prejudicados, porque a sua venda depende mais de financiamento.
As empresas de tecnologia são atingidas em cheio, "porque são empresas que não costumam dar lucro, reinvestem todo o caixa delas e precisam de crédito no mercado para ampliar suas operações, ganhar escala e conseguir no médio e longo prazo viabilizar o seu plano de negócios", complementa ela.
De todo modo, o momento pode ser interessante para quem deseja entrar na bolsa pagando menos pelos papeis.
Em relação à renda fixa, ela destaca que a inflação deve continuar aumentando e, por consequência, os juros também. Nesse cenário investimentos atrelados à inflação, IPCA, e ao CDI são os mais indicados.
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