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contas do governo central
Economia

Arcabouço fiscal: bom o suficiente para reduzir os juros?

A queda da taxa Selic depende de regras factíveis para a execução do orçamento público

Data de publicação:04/04/2023 às 08:00 -
Atualizado um ano atrás
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Parte do mistério foi desfeito na semana passada, quando se divulgaram as regras que definirão o orçamento público (nosso arcabouço fiscal). Elas vieram para substituir o chamado “teto de gastos”, implementado em 2017 e desvirtuado ao longo do tempo por permitir uma lista cada vez maior de exceções (os “furos” no teto).

Ele tinha como premissa a inflação do ano anterior como limite para o aumento das despesas. 

Essa necessidade tinha surgido pelo descontrole nas contas públicas observado em dois anos de recessão (2015 e 2016), rompendo o que até então tinha sido honrado por governos anteriores: o superávit primário (receitas maiores que as despesas, desconsiderados os pagamentos de juros).

Juros
Tributação sobre fundos exclusivos é um dos alvos para o aumento de receitas - Foto: Reprodução

Um limite que funcione

Apesar de colocar uma certa ordem na casa, o limite imposto pelo teto estava longe de ser perfeito. Primeiro, por sacrificar os investimentos públicos.  Segundo, por deixar de fora do orçamento as demandas sociais.

O governo que assumiu em janeiro ganhou uma folga para poder endereçar parte dessas questões, desde que apresentasse o conjunto de regras sob as quais pretende funcionar.

De um modo geral, o anúncio feito passou a seguinte mensagem: existe um plano para que se volte aos superávits, é conhecido o percentual de despesas em relação à receita, há uma certa margem de manobra para a execução do orçamento caso surjam novos choques na economia (a vida como ela é).

O novo arcabouço fiscal

Sem entrar nos detalhes técnicos, mesmo porque muitas informações ainda são desconhecidas, alguns pontos se destacam. 

Primeiramente, a limitação das despesas a um percentual da receita (70%). Além disso, uma “banda” para o crescimento dos gastos (entre 0,6% e 2,5%), de forma que o governo evite dois problemas: 

  1. Frear os investimentos quando a arrecadação cai, estipulando um limite mínimo de 0,6%;
  2. Gastar demais quando a arrecadação aumenta, o que explica o limite máximo de 2,5%.

Mas, diferentemente do teto de gastos, os aumentos previstos são reais, ou seja, acima da inflação. Nesse sentido, o Brasil está seguindo uma tendência global, onde governos estão efetivamente gastando mais.

Crescimento a qualquer custo

Para que as novas regras façam sentido, o crescimento da arrecadação terá que ser superior ao da dívida para que ela não se acelere em ritmo superior ao PIB (a “regra orçamentária de ouro”). 

Do contrário, as altas taxas de juros apenas servirão para alimentar a inflação, conforme o governo se endivida cada vez mais para pagar os juros. 

Considerando a imprevisibilidade de um novo choque de oferta de commodities, que favoreceu as exportações brasileiras no ano passado, como obter novas receitas extraordinárias de 2023 em diante?

Passando o chapéu 

Para levantar entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões, existem algumas propostas na mesa. Uma é nova, mas a outra, nem tanto. 

A novidade seria a cobrança de imposto sobre apostas eletrônicas que, diferentemente das apostas feitas por leigos no mercado de ações ou de criptoativos, continuam firmes, independentemente dos resultados.

Já a tributação sobre fortunas é um assunto recorrente, ainda que não tenha obtido êxito no passado. No Projeto de Lei (PL) 2.337 de 2021, um dos alvos era um instrumento bastante conhecido das famílias abastadas: o fundo exclusivo.

Uma de suas grandes vantagens, além do planejamento sucessório e da infinidade de ativos que pode conter, é o fato de que não há qualquer tributação enquanto não se pede o resgate. Dito isso, dividendos e ganhos de capital se acumulam durante anos.   

Oportunismo fiscal

Na época, além do come-cotas, cobrado semestralmente, cogitou-se tributar os estoques, ou seja, toda a rentabilidade obtida no período anterior à elaboração do PL.  Se mantida a mesma intenção agora, pode-se observar um certo oportunismo arrecadatório por parte das autoridades.

Considerando a hipótese de se recolher o imposto sobre os anos anteriores a 2021, não haveria sequer a possibilidade de se compensar os prejuízos sofridos desde então, quando a Selic deixou o patamar de 2% para alcançar os 13,75% atuais. 

Na dúvida, cada um jogará o problema para o outro, sendo que os bancos adotarão uma postura bastante conservadora. Eles vão atirar primeiro (cobrar do cliente), para depois fazer as perguntas (pagar o imposto). 

Otimismo de brasileiro

O envelhecimento da população e a reversão da globalização jogam contra qualquer tese de crescimento mundial impulsionando também o crescimento interno.

Primeiramente, pela queda da produtividade. Adicionado a isso, a política industrial protecionista, que gera custos redundantes e impede o acesso a tecnologias importantes, de forma que cada país se defende como acha mais conveniente, reduzindo drasticamente o investimento estrangeiro direto no mundo.  

O jogo que sempre soma zero

jogo de soma zero do comércio internacional não fica restrito ao que acontece nos portos, haja vista a estrutura tributária brasileira e suas inúmeras exceções.  Nossos benefícios fiscais somam R$ 456 bilhões e qualquer tentativa de melhoria nesse quesito encontra resistências do lobby setorial de Brasília.

No resto do mundo, os juros continuam subindo, doa a quem doer. Os comunicados de banqueiros centrais têm sido bastante claros na questão da importância de sua independência para, combater a inflação. 

Nada de pressão política para amenizar parte do sacrifício econômico ou para atuar no câmbio, tal como se fazia durante a década de 80. Tudo o mais constante, estão dadas as condições para a manutenção dos juros nos patamares atuais no Brasil. 

Conclusão

A queda da taxa Selic depende de regras factíveis para a execução do orçamento público. Sem a redução dessa incerteza, não há como fazer o investimento voltar e a atividade crescer. 

Ao governo, cabe o árduo trabalho de convencer a sociedade de que não há caminho fácil (desonerações) ou atalhos (margem para a interpretação da lei tributária) para que a relação dívida/PIB se estabilize ao longo do tempo e, preferencialmente, entre as trocas de mandato presidencial. 

No que diz respeito à necessidade de aumento da arrecadação, as distorções são muito mais visíveis quando a forma de se tributar é uniforme e transparente. 

Não colocando a questão social de lado, trata-se da diferença entre um projeto de governo (politicamente calculado para durar 4 anos e beneficiar alguns grupos) e um projeto de Estado, que efetivamente torna o país melhor.

Sobre o autor
Nohad Harati
Possui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.

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