Tok&Stok: o que vai acontecer com a empresa após aporte de R$ 100 milhões? Entenda a situação
Segundo o especialista em reestruturação, Max Mustrangi, o valor de aporte não será suficiente diante das dívidas da Tok&Stok, estimadas em R$ 600 milhões
Nesta semana, mais um capítulo da novela da reestruturação da Tok&Stok veio a público. De acordo com informações do Estadão, o fundo de private equity controlador da varejista do Grupo Carlyle injetará R$ 100 milhões para socorrer a empresa.
A cifra não chega nem perto dos R$ 600 milhões em dívidas que estima-se a Tok&Stok tenha e marca um processo de reestruturação que a empresa vem realizando desde o começo de 2023.
Desde fevereiro, os problemas da Tok&Stok foram escancarados com a inadimplência anunciada pelo fundo imobiliário Vinci Logística. De acordo com fato relevante divulgado pelo FII, o aluguel da varejista referente ao mês de janeiro com vencimento em fevereiro estava pendente. Havia sido a primeira vez que a empresa deixava de honrar o compromisso referente a locação da propriedade Extrema Business Park I, em Minas Gerais.
O galpão é um dos principais de armazenagem de estoque para a empresa. O fundo entrou com ação de despejo, que foi encerrada apenas no final de março, com o pagamento integral das obrigações que a Tok&Stok devia.
“O fundo tomou conhecimento de que, no dia 24 de março de 2023, a Tok&Stok depositou em juízo o valor de R$ 2,092 milhões com o objetivo de quitar o valor de locação vencido em 6 de fevereiro de 2023”, divulgou o Vinci no fato relevante.
Na mesma época, a varejista contratou a consultoria Alvarez & Marsal, que também acompanha atualmente o processo de recuperação judicial da Americanas, para conduzir o processo de reestruturação da empresa.
A empreitada culminou, inclusive, na demissão de três diretores, segundo informações do Infomoney, e fez com que a direção executiva da empresa voltasse a ser assumida por Ghislaine Drubule. A empresária fundou a varejista, em 1978, com o marido Régis e, em 2012 vendeu 60% da empresa para o fundo de private equity do grupo Carlyle por R$ 700 milhões.
O Carlyle tem por modelo de atuação adquirir empresas, aprimorar gestão e vendê-las em seguida. Com a Tok&Stok, chegou inclusive a preparar o processo de IPO após a pandemia. Contudo, após pedir duas vezes o adiamento do processo, a varejista optou por continuar sem capital aberto.
O fundo Carlyle, que hoje detém mais de US$ 156 bilhões em recursos sob gestão, tem suas operações controladas no Brasil pela SPX. Nesta semana, conforme noticiado pelo Estadão, o fundo concordou em aportar mais R$ 100 milhões no negócio, uma vez que os novos investidores buscados não demonstraram interesse na varejista.
Na reestruturação em curso, há realização de queima de estoque, com descontos de 50% e previsão de fechamento de, ao menos, 6 lojas em cidades como Campinas, Rio de Janeiro, Recife e Fortaleza.
Entre os cotados para fusão com a empresa, a Mobly chegou a divulgar, via fato relevante, que estava em negociações com a Tok&Stok. Para a operação, segundo o Infomoney, a Mobly contratou o Itaú BBA e a Tok&Stok buscou o Bradesco BBI para assessoria.
No fato relevante, a Mobly negou que algum acordo já estivesse assinado ou alguma proposta feita, mas confirmou que “esteve em conversas recentes com a Tok&Stok”.
Crise no varejo
Com a crise de crédito, que se iniciou desde a descoberta de “inconsistências contábeis” nas Lojas Americanas, muitas varejistas começaram a apresentar dificuldades, como a Tok&Stok e a Marisa.
Para Max Mustrangi, sócio fundador da Excellance - Gestão de Turnaround e Reestruturação, os problemas do mercado varejista já são evidentes há muito tempo.
Em dezembro de 2021, o especialista comentou, em vídeo, que o risco de inadimplência se elevaria muito com a alta de juros, uma vez que o crédito se tornaria mais caro. Assim, segundo Mustrangi, quem não conseguisse mais crédito, “morreria por caixa”
Perspectivas para a Tok&Stok
Segundo o especialista, o aporte realizado pelo fundo Carlyle seria realizado em busca de "boa vontade" para a negociação através de contrapartida para garantir "a vontade de alongar e ficar no risco". Ou seja, de acordo com Mustrangi, ainda que o valor do aporte atual seja muito inferior às cifras da dívida, sua função é quitar uma parte ou prover uma garantia melhor.
"A expectativa é: se eu não ajudar, pode ser que eu perca tudo, entra em falência e perde-se tudo", ensina o especialista. Um aporte dessa natureza, portanto, seria não para de fato quitar dívidas mas sim para que se possa prover condições para que a empresa volte aos eixos. "É melhor isso que nada, que tomar uma falência na cabeça", explica.
A diferença, conforme explica, entre a recuperação judicial e a reestruturação é meramente do momento que o processo se encontra. Todo o processo passaria pela reestruturação, seja qual for a modalidade necessária para a empresa. "É o nível de gravidade que vai dar o nome mas todas são reestruturações" esclarece o especialista, que conta com mais de 30 anos de experiência na área.
No caso da Americanas, ele entende que os R$ 12 bilhões que foram aportados, por exemplo, não seriam suficientes para que a empresa retornasse a uma condição anterior. Em sua avaliação, para que isso acontecesse, o aporte precisaria ser de R$ 15 a 20 bilhões, no mínimo.
No caso da Tok&Stok, ele também considera que o valor aportado é insuficiente para resolver a situação. "Então, assim, eu vou colocar um dinheiro para resolver a dívida, mas o negócio em si vai continuar abrindo buraco, cada dia vai puxar mais dinheiro", esclarece. "A perspectiva hoje é nada, estão fechando lojas, queimando estoques, entao, de curto prazo resolve, mas de médio a longo prazo, é nada".
Sobre a operação de reestruturação da empresa, Mustrangi ressalta o caráter aparentemente amigável do processo. "Todo o contexto que está se formando é de uma recuperação extrajudicial", ressaltando que a opção dos credores, que não esta, seria realização de pedido de falência, cenário mais prejudicial para todos os envolvidos.
Várias podem ser as razões que levaram a Tok&Stok à situação atual, mas o especialista dá certeza de que houve a perda do foco e o olho na rentabilidade do negócio. Com a perda do lucro, ainda que o faturamento se mantenha, a saída é a busca de crédito em bancos. "A empresa começa a ter a avalancagem financeira pegando, até a hora que é obrigada a pedir uma RJ (recuperação judicial) para se proteger", afirma Mustrangi.
Além disso, pela natureza do negócio da varejista, há perspectiva de que o momento atual, com juros elevados e altos patamares de inadimplência das famílias, não está favorável para a recuperação. “Não faz sentido, ninguém vai decorar casa no momento atual”, reforça.
Sobre o impacto do caso Americanas e também da Oi, de acordo com o especialista, houve perda de altos valores no mercado. Com isso, houve redução na concessão de crédito e maior cuidado, por parte dos bancos, no momento de emprestar, privilegiando empresas com garantias e patrimônios mais seguros. "Tem um efeito colateral? Claro que tem, para todo mundo", destaca.
Sobre a fusão entre a empresa e a Mobly, ele entende que o momento atual não é favorável para nenhuma das duas. Assim, ainda que haja um aumento de escala, se ambas as empresas não estão em uma situação favorável não haverá um bom resultado em uma possível fusão.
“Se fosse lá atrás, alguns anos atrás, com dinheiro barato, era possível cogitar inserir dinheiro e arrumar. Hoje, o mundo mudou, o dinheiro está caro, só essa mudança de premissa já mudou totalmente o contexto de análise”, conclui o especialista.