Enquanto os fundos BRIC entram em colapso, Jim O’Neill se mantém longe dos ativos
Criador do termo BRIC afirmou que nunca investiu e nunca investirá em um fundo BRIC
Quando o economista Jim O’Neill criou o acrônimo BRIC na virada do século, o ex-chefe do Goldman Sachs não pretendia que o termo fosse utilizado para explorar a comercialização de fundos de investimento. No entanto, os gestores lutaram para dar o pontapé inicial dos fundos com esse nome.
Porém, essa jogada de marketing desmoronou e agora os fundos do BRIC enfrentam uma grave crise. A guerra na Ucrânia tornou os ativos sem condições de receber investimentos e o MSCI Inc. removeu o índice BRIC dos benchmarks.
A China, que representa uma fatia importante desse benchmark, também está com sua economia em desaquecimento e embarcou em uma repressão sem precedentes às empresas de tecnologia, o que levou a perdas acentuadas para o país.
Para se ter ideia, segundo reportagem da Bloomberg, os fundos do BRIC perderam 14,6% somente neste ano, enquanto seus ativos somados caíram mais de 90% de seu pico, para cerca de US$ 3 bilhões.
Até então, empresas como Schroders Plc e Frankling Templeton – juntamente com o Goldman Sachs Asset Management – nos anos anteriores chegaram a devorar bilhões de dólares de clientes que buscavam colocar lucros no bolso com a combinação de investimentos no Brasil, Rússia, Índia e China.
O perigo dos fundos temáticos
O colapso dos fundos BRIC traz uma lição implacável para os investidores sobre os riscos dos fundos temáticos. Combinar quatro países de mercados emergentes diversos, complexos e com alto risco em um fundo soou como um jogo de palavras inteligentes, mas não como uma aposta bem-sucedida.
Enquanto as economias cresceram rapidamente, como previu O’Neill, as ações tiveram ganhos mistos. O índice MSCI BRIC agora segue atrás do S&P 500 e também dos retornos totais dos índices individuais para os quatro países.
“Não confunda os conceitos do BRIC. Todo o meu propósito de criar a sigla não tem nada a ver com investimento.”
Jim O'Neill, criador do termo BRIC, em entrevista
Guerra na Ucrânia: turbulência nos mercados
A guerra na Ucrânia tem gerado consequências extensas. A devastação em curso no país de Volodymyr Zelenski desencadeou volatilidade no mercado em âmbito global.
Os preços das commodities subiram em resposta às sanções impostas pelos países ocidentais para isolar o país, o que provocou temores inflacionários para grandes consumidores e importadores de commodities e energia, como Índia e China.
A turbulência do mercado prejudicou até mesmo os fundos de hedge projetados para prosperar em quaisquer condições de mercado, com gestoras como Autonomy Capital Research, H2O Asset Management e EDL Global Opportunities lidando com quedas de dois dígitos em seus fundos. Muitos foram forçados a zerar suas posições nos ativos russos.
A promessa do BRIC
O artigo de O'Neill, “Building Better Global Economic BRICs”, foi publicado em 30 de novembro de 2001 e apontava como a economia global seria impulsionada pelo crescimento dos mercados emergentes nas décadas seguintes. O economista argumentou que grupos como o G-7 deveriam ser reorganizados para incorporar representantes do BRIC.
Com isso, foram criados os fundos Schroder International Selection Fund BRIC e Templeton BRIC Fund BRIC em 2005, enquanto o Goldman Sachs lançou seu próprio fundo no ano seguinte.
O fundo Schroder chegou a atingir mais de US$ 4 bilhões em ativos, enquanto o Templeton acumulou US$ 3,3 bilhões em 2010.
Porém, a situação mudou com o passar dos anos. O fundo Schroder, que administrava US$ 710 milhões no final de fevereiro deste ano, caiu quase 16% este ano, segundo dados compilados pela Bloomberg.
O fundo de US$ 450 milhões da Templeton recuou mais de 14% após zerar suas posições russas, quando os mercados da Rússia fecharam, segundo uma fonte especialista no assunto.
Já o Goldman Sachs fundiu seu fundo BRIC em 2015 com um outro produto financeiro mais amplo com foco em mercados emergentes. Atualmente, a Bloomberg rastreia apenas 74 fundos BRIC que ainda estão disponíveis no mercado financeiro. Essa mesma quantia envolveu fundos que foram absorvidos a outros produtos ou passaram a não ser mais listados em bolsa.
Valor no longo prazo
Para Chetan Sehgal, gestor de portfólio do Templeton BRIC Fund, esse movimento de absorver os fundos em outros produtos ainda oferece valor no longo prazo, mesmo sem a presença da Rússia. Segundo ele, o Brasil, que é um país rico em recursos de energia, poderia se beneficiar de um mundo sem o país de Vladimir Putin.
“Embora a economia chinesa tenha desacelerado, seu caminho dependerá muito de como ela vai navegar no ambiente externo, já que muitas das reformas internas já foram promulgadas”, aponta Sehgal.
Porém, para outros especialistas, o conceito do BRIC “perdeu seu charme”. Ed Park, diretor de investimentos da gestora inglesa Brook Macdonald, acredita que a Rússia não é considerada um país alvo de investimentos e que o Brasil tem muitos riscos políticos.
“Sua empresa pode obter exposição à China fora dos fundos BRIC. Não acredito que iremos investir no BRIC olhando o médio prazo”.
Ed Park, diretor de investimentos da gestora inglesa Brook Macdonald
Economias emergentes crescem em tamanho e em influência
Para O’Neill, as economias emergentes estão crescendo em tamanho e em influência.
“Apesar dos problemas que Brasil e Rússia têm enfrentado, se você olhar onde estão todos juntos, ainda é viável que em meados da década de 2030 os BRICs sejam maiores que o G6”, disse.
Jim O'Neill
Ainda assim, O’Neill afirmou que nunca investiu em um fundo do BRIC. E nunca o fará.