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gastos públicos
Mercado Financeiro

Com debandada da equipe de Guedes, o que esperar de bolsa, dólar e juros

Clima de instabilidade deve aumentar com impacto negativo na Bolsa e de alta no dólar e nos juros

Data de publicação:22/10/2021 às 05:00 -
Atualizado 3 anos atrás
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As baixas no alto escalão da equipe econômica do ministro Paulo Guedes, da Economia, acirraram o clima de instabilidade e provocam mais turbulências no mercado financeiro nesta sexta-feira, 22. A Bolsa iniciou o pregão com forte queda e o dólar disparou.

Deixaram o time do ministro no dia anterior o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e sua adjunta, Gildenora Dantas; o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, e seu adjunto, Rafael Araújo.

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Edifício-sede do Banco Central no Setor Bancário Norte, em lote doado pela Prefeitura de Brasília, em outubro de 1967 - Foto: Agência Brasil

As demissões, em circunstâncias normais, não tenderiam a causar abalos significativos no mercado financeiro. O que deve aumentar o estresse nesse momento são os motivos que levaram à demissão.

Os secretários saíram por não concordar com a mudança do teto de gastos que abre espaço no Orçamento de 2022, de R$ 83,6 bilhões, para acomodar o Auxílio Brasil de R$ 400, novo valor do benefício anunciado pelo presidente Bolsonaro e pelo ministro Paulo Guedes.

Bolsa tende a cair e dólar, a subir

Os mercados devem acentuar o tom pessimista aos negócios nesta sexta-feira, com a bolsa de valores em queda e o dólar ganhando renovada tração. Na véspera, já em ambiente de maior pessimismo, a Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, recuou 2,75%, para 107.735,01 pontos, no fechamento, após cair mais de 4%. O dólar ganhou fôlego, disparou e subiu mais 1,23%, para R$ 5,666.

O mercado financeiro torceu o nariz, com redobrada desconfiança, para as mudanças. Para Carla Argenta, economista chefe da CM Capital, o “malabarismo” nas contas patrocinado pelo governo para não furar o teto não impedirá gastos crescentes e maiores. “Não é porque eles estão mudando a metodologia que a situação vai melhorar e é isso que o mercado está vendo.”

Irresponsabilidade fiscal e consequências

Rafael Ribeiro, analista da Clear Corretora, vai além. “Se tem uma coisa que o mercado não gosta é de governo que dá guinadas populistas e flerta com a irresponsabilidade fiscal, ainda mais tratando-se de um país emergente, como o Brasil”, critica.

O furo do teto fiscal e tudo o mais que vem em sua esteira, para especialistas, são a senha que põe em xeque, pelo cenário que projetam, toda a expectativa de crescimento para o próximo ano.

Sem um controle mais rigoroso dos gastos públicos, imposto pela lei do teto, a tendência é de aumento do déficit público (resultado de gastos acima das receitas), que é financiado com a venda de títulos públicos no mercado financeiro. Com a inflação alta e a percepção de aumento do risco fiscal, investidores passam a exigir juros cada vez mais altos para comprar títulos públicos e financiar o déficit do governo.

A percepção de risco fiscal mais elevado já é vista na escalada dos juros futuros, que refletem a expectativa dos agentes de como estarão as taxas em determinado tempo futuro. São esses os juros, e não os referenciados na Selic, que são usados como custo em créditos que as empresas tomam.

Daí que as empresas investem menos, produzem e faturam menos, o que achata o lucro e desvaloriza suas ações na bolsa de valores. Não é só por aí que o mercado de ações sofre com uma crise dessas. A elevação dos juros, em ambiente de bolsa desalentada, atrai o investidor para a renda fixa, até como proteção, por causa de risco mais baixo.

A constatação de risco fiscal mais alto está embutida também nas cotações cada vez mais elevadas do dólar, que acumula valorização de 4,04% no ano, dos quais 3,87% apenas nesta turbulenta semana.

Dólar mais caro pressiona a inflação, o que leva o Banco Central a aumentar a taxa básica de juros, a Selic, para conter a alta de preços.  O mercado já prevê um aumento de 1,25 ponto porcentual na Selic nas duas reuniões do Copom que restam no ano – uma delas, na próxima semana.

Dólar caro, inflação alta e juros elevados projetam um cenário que os analistas chamam de tempestade perfeita que pode abortar o já anêmico crescimento econômico projetado para 2022.

A farra fiscal do governo com manobras recheadas de medidas populistas, incluindo o Auxílio Diesel, para caminhoneiros, põe a lei de teto de gastos em frangalhos pela perda de credibilidade, de acordo com analistas.

Manobra para furar o teto causou inquietação

Além da acomodação do gasto adicional do Auxílio Brasil, com o valor de R$ 400, fora do teto, causou inquietação nos mercados o anúncio do relator da PEC dos Precatórios de que o cálculo do IPCA para a correção do limite de gastos passará de julho de um ano a junho do ano seguinte para janeiro a dezembro. Uma manobra que aproveitando a inflação mais elevada deste ano ampliaria a margem de gastos definida pelo teto.

O Instituto Fiscal Independente (IFI), do Senado, prevê que o rombo no teto, que engordará o déficit público, com as mudanças anunciadas pelo governo chegará a R$ 95,6 bilhões em 2022.

“O desmonte do teto se confirmará se essas medidas (mudanças no teto e na PEC do Precatórios, que possibilita mais gastos) forem anunciadas oficialmente”, disse Felipe Salto, presidente do IFI, em publicação no Twitter. A PEC dos Precatórios foi aprovada pela Comissão Especial da Câmara na noite de ontem.

Para o relator da proposta de Auxílio Brasil na Câmara, deputado Marcelo Aro, o pagamento de dois auxílios temporários para turbinar a política social até dezembro de 2022 é claramente eleitoreira. “Ele (Bolsonaro) não está dando um presente, está emprestando até ganhar a eleição.”

CPI da Covid: reação de Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro não recebeu bem a apresentação ao colegiado do relatório final dos trabalhos feitos pela comissão feita pelo senador Renan Calheiros. "Não vou discutir essa história de fantasia, festival de baboseiras", disse Bolsonaro, em transmissão ao vivo nas redes sociais.

"Parece a Comissão da Verdade do PT", acrescentou, em referência ao órgão instituído durante o governo Dilma Rousseff para investigar as violações de direitos humanos durante a ditadura militar.

O chefe do Executivo já defendeu publicamente a ditadura militar e, durante o julgamento do impeachment da ex-presidente Dilma, chegou a dedicar seu voto favorável à cassação, enquanto deputado federal, ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. O militar foi um torturador no regime de exceção e foi condenado pelo crime de tortura.

Além de Renan, Bolsonaro ainda fez novas críticas ao presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM). "Não foram buscar corrupção onde existia, no consórcio do Nordeste. Renan e Omar Aziz têm que defender os seus", disse o presidente, que chamou os dois, ainda, de "irmãos" e "patrulheiros de médicos".

Sem reconhecer as suspeitas de irregularidades expostas pela CPI e pela imprensa, Bolsonaro ainda repetiu, na live, que investigará casos de corrupção em seu governo.

Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, evitou comentar o relatório. "É muito importante que a CPI se esgote, que seja encaminhada às instâncias competentes essa conclusão", disse o presidente do Senado.

Pacheco afirmou que a prioridade dele é construir soluções para um novo programa social, o pagamento de precatórios, o preço dos combustíveis e outros temas do País, com o aumento da inflação, do câmbio e do desemprego. "A presidência do Senado tem muitas coisas a contribuir para o Brasil nessas vertentes, a CPI tem um papel dela autonomamente."

NY e o mundo

Lá fora, o clima é um pouco mais ameno do que no Brasil, com os futuros operando estáveis em Nova York, após a divulgação de um relatório que aponta uma redução nos riscos de default da Evergrande, o que está servindo para aliviar um pouco as tensões globais.

Ações de grandes empresas de tecnologia apoiaram parte dos índices no fechamento do dia anterior, incluindo o S&P 500, que terminou a véspera no seu maior nível histórico de fechamento.

O índice Dow Jones recuou 0,02%, aos 35.603,08 pontos, o S&P 500 teve alta de 0,30%, aos 4.549,78 pontos, e o Nasdaq avançou 0,62%, aos 15.215,70 pontos.

Os estoques globais se encaminham para um terceiro avanço semanal, ajudados pela recuperação global e a diminuição dos riscos impostos pela pandemia.

A alta está sendo contida pela perspectiva de um aperto mais rápido do que o esperado da política monetária para conter a inflação, que está sendo alimentada pela crise energética e pelo desabastecimento em importantes cadeias de suprimentos.

Os investidores seguem acompanhando a temporada de balanços nos Estados Unidos, bem como os comentários de dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) sobre a política monetária.

Ao mesmo tempo em que a temporada de balanços alimenta o apetite por risco de investidores, preocupações quanto ao atual nível de inflação nos EUA e em outras economias desenvolvidas aumentam, junto com a possibilidade dos bancos centrais elevarem suas taxas de juros antes do esperado.

Diretor do Fed, Christopher Waller disse que os próximos meses serão cruciais para decidir se a inflação nos EUA tem, ou não, caráter transitório, e definir se a entidade monetária precisará responder de forma mais agressiva ao alto nível dos preços. Ele, de qualquer forma, considera que as expectativas inflacionárias de longo prazo estão ancoradas.

Presidente da distrital de Atlanta do Fed, Raphael Bostic estima uma elevação nos juros entre o fim do terceiro trimestre e o começo do quarto trimestre de 2022. "Muita coisa vai acontecer até meados do ano que vem. Veremos se vamos precisar subir os juros mais rapidamente ou lentamente", advertiu.

Bostic também comentou a decisão do Fed de proibir seus integrantes de comprar ações individuais no mercado, após a revelação de os ex-presidente do Fed de Dallas, Robert Kaplan, e de Boston, Eric Rosengren, negociaram ativos em meio às mudanças na política monetária dos EUA em 2020. Segundo Bostic, a decisão foi importante pois ajuda a manter a confiança da população no Fed.

Do outro lado do mundo, as bolsas na Ásia fecharam sem direção única nesta sexta-feira, com algumas delas sustentadas por relatos de que a Evergrande, a endividada gigante do setor imobiliário chinês, vai conseguir honrar o pagamento de dívida que vence neste fim de semana.

Em Hong Kong, o Hang Seng avançou 0,42%, aos 26.126,93 pontos. A ação local da Evergrande saltou 4,26%, após notícia de que a empresa transferiu recursos para pagar juros sobre bônus neste sábado, 23, evitando a formalização de um calote.

Em outras partes da Ásia, o japonês Nikkei subiu 0,34% em Tóquio hoje, aos 28.804,85 pontos, enquanto o sul-coreano Kospi teve baixa marginal de 0,04% em Seul, aos 3.006,16 pontos, e o Taiex ficou estável em Taiwan, aos 16.888,74 pontos.

Na China continental, o dia foi de baixas modestas, lideradas por ações de mineradoras de carvão. O Xangai Composto recuou 0,34%, aos 3.582,60 pontos, e o menos abrangente Shenzhen Composto caiu 0,15%, aos 2.412,67 pontos.

Na Oceania, a bolsa australiana fechou estável, depois de oscilar entre pequenos ganhos e perdas. O S&P/ASX 200 terminou o pregão em Sydney aos 7.415,50 pontos. / com Júlia Zillig e Agência Estado

Sobre o autor
Tom Morooka
Colaborador do Portal Mais Retorno.