Mercado Financeiro

Ibovespa cai aos 113 mil pontos e dólar dispara a R$ 5,326, com risco político no radar dos investidores

Temor com crise institucional também eleva dólar a R$ 5,30, impulsiona juros e CDS de cinco anos, termômetro para o risco-país.

Data de publicação:08/09/2021 às 10:46 - Atualizado 3 anos atrás
Compartilhe:

O dia seguinte dos atos convocados pelo presidente Jair Bolsonaro, durante o feriado do Dia da Independência, foi marcado por nervosismo no mercado financeiro e depreciação dos ativos domésticos. O Ibovespa fechou com queda acentuada de 3,78%, aos 113.412,84 pontos, enquanto o dólar avançou 2,92%, cotado a R$ 5,32. Os contratos de DI para janeiro de 2023 fecharam em 8,80%, mas chegaram a 8,82%, na máxima do dia, em comparação aos 8,64% da última segunda-feira.

A queda na Bolsa se acentuou após o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, afirmar na abertura da sessão da corte nesta quarta-feira, 8, que o descumprimento às decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes será considerado “crime de responsabilidade”.

Antes disso, a situação havia se assentado um pouco com a fala do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que deu declaração no começo da tarde em tom apaziguador. O deputado voltou a defender o diálogo entre os poderes. "Não vejo mais espaço para radicalismos e excessos", disse.

Sede da B3 em São Paulo - Foto: B3/Divulgação

O Credit defaut Swap (CDS) do Brasil, derivativo que protege contra calotes e serve como termômetro de risco-país fechou em alta nesta quarta, no mercado internacional. Os contratos de CDS com vencimento de cinco anos tiveram valorização de 177,63 pontos, ante fechamento de 176,31 da véspera, de acordo com cotações do IHS Markit.

Sobe e desce da B3

Os bancões viveram um dia de forte baixa em suas ações, reflexo do cenário político, e por serem as ações de maior liquidez nos pregões. O IFNC, índice que mede o desempenho das empresas do mercado financeiro na B3 - incluindo os bancos - despencou 5,54%.

Repercutindo a queda de 1,94% em seus ADRs na bolsa de Nova York no feriado e a baixa do preço do minério de ferro, a Vale - que responde por cerca de 14% da cesta de ativos do Ibovespa - registrou quedas de 2,08%.

As demais siderúrgicas também seguiram no mesmo caminho de baixa. CSN, Usiminas e Gerdau caíram 2,75%, 5,74% e 2,31%, respectivamente.

Ainda em commodities, os papéis da Petrobras também fecharam no vermelho, o que ajuda a puxar o Ibovespa para baixo. Os ativos da companhia desvalorizavam 5,63%.

A empresa Hypera comunicou ao mercado que irá captar R$ 1 bilhão com debêntures de cinco anos com o intuito de engordar seu caixa. Depois disso, seus papéis obtiveram perdas de 3,36%.

No sentido oposto, o destaque positivo do pregão ficou com as ações da Localiza e da Unidas, após o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) recomendar a fusão entre as duas empresas com a aplicação de "remédios" para evitar o monopólio de locação de veículos, gestão de frota terceirizada e venda de carros usados. Os papéis da Localiza e Unidas dispararam 8,03% e 7,23%, na sequência.

Na véspera do feriado, a Gol divulgou que a demanda para os voos na companhia aumentou 84,7% em agosto ante julho e a oferta cresceu 83%. Com esses dados, as ações da companhia aérea avançaram na parte da manhã, mas perderam força ao longo do dia, e no fechamento caíram 2,77%.

A Ambipar comprou 100% da empresa Emerge Hydrovac por meio da Ambipar Holding Canadá. Os papéis da empresa reportaram queda de 4,48%.

Cenário político: reação do mercado

A percepção do mercado, de acordo com os analistas, é de um claro agravamento da tensão institucional com as manifestações da véspera, o que coloca os holofotes nas próximas ações do governo federal e dos poderes Judiciário e Legislativo.

Segundo eles, pesa especificamente o fato de o presidente Jair Bolsonaro ter dito claramente durante as manifestações que não cumprirá mais decisões tomadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

A declaração traz à tona o artigo 85 da Constituição, que define como crime de responsabilidade os atos do presidente que atentem contra o livre exercício do Poder Judiciário e o cumprimento das leis.

Assim, as atenções se voltam nesta semana para o presidente da Câmara, Arthur Lira, que deve receber novos pedidos de afastamento de Bolsonaro.

"Entendemos que os discursos de Bolsonaro realizados ontem devem tensionar ainda mais a relação entre os Poderes, penalizando os mercados", diz o departamento econômico da corretora Renascença, em nota enviada a clientes durante a manhã.

"Politicamente em nada favorece a Bolsonaro a volta das críticas ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas, principalmente no que tange ao relacionamento dele com Arthur Lira, que semanas atrás pautou o tema do voto impresso no plenário sob a promessa de encerramento desse assunto, o que evidentemente não ocorreu", prossegue a nota.

Durante os protestos, Bolsonaro atacou os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, e fez ameaças também para o presidente da Corte, ministro Luiz Fux.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, decidiu suspender todas as sessões de plenário da casa e a tramitação de projetos de interesse do governo.

Daniel Miraglia, economista chefe da Integral Group, ressalta que o mercado já vinha, há algumas semanas, precificando o aumento da tensão política e da crise institucional nos valores da Bolsa e ativos brasileiros. Entretanto, Miraglia considera que "as manifestações foram maiores do que o mercado esperava", o que reforça a cautela dos investidores.

"Há algumas pautas que estão na mesa que o mercado entende como desafiadoras, como a questão dos precatórios, que estava sendo costurada com o STF, e a reforma tributária, que seguiu para o Senado Federal", afirma o economista da Integral Group.

NY: bolsas no vermelho

Nos Estados Unidos, as bolsas de Nova York fecharam em baixa. Segundo Filipe Teixeira, sócio da Wisir Research, a perspectiva de uma reabertura econômica mais lenta e de uma eventual redução do apoio ao estímulo pandêmico do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) estão deixando os investidores mais cautelosos.

Os índices S&P 500, Dow Jones e Nasdaq 100 registraram queda de 0,13%, 0,20% e 0,35%, respectivamente.

Um dos pontos mais importantes, no cenário internacional, que esteve no radar dos investidores ao longo do dia é a divulgação do Livro Bege pelo Fed, que aconteceu hoje, indicando que a economia dos EUA "desacelerou ligeiramente".

Este relatório, que é divulgado sempre duas semanas antes de cada reunião do Fomc (o órgão que decide sobre política monetária no país), apresenta a situação econômica ao longo do território americano e é utilizado para auxiliar as decisões sobre a taxa de juros nos Estados Unidos.

De acordo com Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, na maioria das vezes os dados apresentados pelo documento acabam não sendo precificados nos ativos disponíveis pelos mercados.

Durante um discurso no Simpósio de Jackson Hole, que aconteceu no último 27 de agosto, o presidente do Fed, Jerome Powell, afirmou que a maioria dos dirigentes da instituição concorda que, caso a economia continue a evoluir "em geral conforme antecipado", seria "apropriado começar a reduzir o ritmo das compras de ativos neste ano".

No entanto, a fraca geração de vagas nos EUA em agosto apontada pelo payroll na última sexta-feira, 3, e a decisão de empregadores e adiar a volta dos trabalhos presenciais alimentaram as dúvidas dos investidores obre o impacto da pandemia no processo de recuperação econômica.

"A variante delta está começando a aparecer", disse Brad McMillan, diretor de investimentos da Commonwealth Financial Network. "Os mercados estão reavaliando onde estará o crescimento e o que isso significará para os lucros."

Nas últimas semanas, instituições como Goldman Sachs e Wells Fargo reduziram suas projeções para crescimento da economia americana citando impactos da variante delta.

Após o payroll, bancos e consultorias passaram a ver uma maior probabilidade de o Federal Reserve aguardar mais informações antes de fazer qualquer anúncio sobre o início do processo de retirada de estímulos.

"As pessoas estão vendo a desaceleração da economia e as perspectivas se tornando um pouco mais opacas e, portanto, é compreensível que não queiram investir dinheiro para trabalhar", disse Willem Sels, diretor de investimentos global do HSBC Private Bank. "Existem preocupações válidas sobre a delta, sobre o crescimento chinês e global e a inflação, e é natural que as pessoas queiram mais visibilidade."

Bolsas asiáticas fecham mistas

As bolsas da Ásia e do Pacífico fecharam sem direção única nesta quarta-feira, repetindo o comportamento de Wall Street na véspera, em meio a dúvidas sobre os impactos da pandemia de covid-19 na perspectiva de crescimento global.

Em Tóquio, o Nikkei subiu 0,89%, aos 30.181,21 pontos, atingindo o maior patamar em quase seis meses, após o ganho anualizado do Produto Interno Bruto (PIB) do Japão entre abril e junho ser revisado para cima, a 1,9%.

Na China continental, os mercados ficaram praticamente estáveis nesta quarta. O Xangai Composto teve baixa marginal de 0,04%, aos 3.675,19 pontos. Já o menos abrangente Shenzhen Composto garantiu ligeiro avanço de 0,08%, aos 2.492,59 pontos.

Em outras partes da região asiática, o dia foi de perdas. O Kospi caiu 0,77% em Seul, aos 3.162,99 pontos, diante do avanço em casos de covid-19 na Coreia do Sul, enquanto o Hang Seng recuou 0,12% em Hong Kong, aos 26.320,93 pontos, e o Taiex registrou queda de 0,91% em Taiwan, aos 17.270,49 pontos.

Na Oceania, a bolsa australiana ficou no vermelho, influenciada por ações de mineradoras. O S&P/ASX 200 caiu 0,24% em Sydney, aos 7.512,00 pontos. / com Tom Morooka e Agência Estado

Sobre o autor
Renato JakitasEditor-chefe do Portal Mais Retorno.