Fundo com ‘seguro’ contra dólar tem retorno no ano 31,02% acima de produto similar, mas sem proteção cambial
Com a queda da moeda, fundos sem exposição cambial são os mais indicados
Dois fundos internacionais, que investem nos mesmos ativos e são geridos pela mesmas casa entregaram resultados distintos ao investidor nos últimos 12 meses. O Trend Bolsa Americana Dólar, da XP, tem hoje um rendimento negativo de 8,12% em um ano. Já o Trend Bolsa Americana FIA, com carteira idêntica, e da mesma gestora, acumula rentabilidade de 20,38% em igual período, uma diferença de 31,02% entre eles. Como isso é possível?
A explicação está em um detalhe que as vezes passa despercebido pelo investidor. O primeiro fundo, com ações de companhias que integram o S&P 500, vem sofrendo com a valorização do real frente ao dólar nos últimos tempos. Enquanto ações da Apple, Microsoft, Amazon e Meta sobem, a moeda americana cai 15,45% desde o início do ano.
O segundo, com as mesmas ações, paga uma espécie de seguro para 'driblar' as oscilações cambiais, o que no mercado é chamado de fundo com hedge (barreira, em português) cambial.
Neste caso, o investidor não perde com a valorização ou desvalorização do dólar ou do real, ele só coloca no bolso, ou contabiliza o prejuízo, das ações das Big Techs americanas, entre outras que compõe o índice.
Fundo internacional: proteger ou não proteger
Os fundos brasileiros que investem em ativos do exterior, principalmente dos Estados Unidos, viveram uma explosão de lançamentos e foram largamento comercializados pelas distribuídoras nos últimos anos.
Segundo Cesar Pallone, especialista da SVN Investimentos, o movimento faz parte da sofisticação do investidor brasileiro que, pouco a pouco, tem acesso a novos produtos.
Principalmente desde o início da pandemia de covid-19, em 2020, quem aportava recursos nesses produtos dizia que ganhava pelos dois lados: o do bom momento das empresas norte-americanas e o da diferença cambial, já que o dólar chegou a bater próximo de R$ 6 nos momentos mais pesados da crise.
Hoje, contudo, a situação se inverteu, ao menos no câmbio. Nesta semana, o dólar chegou a atingir R$ 4,54, movimento de baixo puxado principalmente pelo ingresso de capital estrangeiro no País.
Com isso, os fundos cambiais e também os fundos internacionais sem hedge cambial, vem sofrendo impacto.
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“Quem está aplicado em um fundo no exterior sem exposição cambial recebeu esses pouco mais de 3% de valorização da bolsa de Nova York no mês passado”, afirma Guterman. "Já quem está em um fundo com exposição cambial teve rendimento negativo", diz.
“Com a queda do dólar (7,70%), em relação ao real, em vez de ganhar, esse investidor perdeu quase 5%”, aponta Guterman.
Para o 'bem' e para o 'mal'
O hedge pode funcionar para o bem ou para o mal, diz o especialista da Western Asset, lembrando que a trajetória em 2022 tem sido, até o momento, o inverso do que foi verificado em 2021. No ano passado, o dólar subiu 7,47% e as bolsas americanas dispararam – o índice Dow Jones subiu 18,73% e o Nasdaq, perto de 21%.
“Uma combinação que, em 2021, favoreceu duplamente quem estava em fundo com exposição cambial, que ganhou com a valorização do dólar aqui e das ações nos EUA.” E neutra para quem estava ancorado em fundo sem exposição, que embolsou apenas o ganho com ações.
Travar ou não travar o câmbio de um fundo
Isso leva à pergunta: vale a pena investir em fundos em que o câmbio flutuam livremente ao sabor do mercado ou não, é melhor travar o câmbio por meio de hedge e se concentrar apenas em um tipo de variável, o sobe e desce dos ativos internacionais?
Para Ian Cao, CIO da Gama Investimentos, apesar das oscilações, é sempre bom manter uma parte do portfólio exposta a moedas internacionais, sobretudo as moedas mais fortes.
“Temos inúmeros exemplos pelo mundo, entre nossos vizinhos, na Rússia agora, na Turquia, que mostram como a desvalorização cambial destrói o patrimônio", diz. "A diversificação de investimentos em moeda estrangeira, principalmente em moeda forte e no longo prazo, vai ser positivo", afirma.
Já para Pedro Tiezzi, responsável pela alocação na gestora SVN, a preferência é por fundos que protegem o patrimônio da oscilação do câmbio.
Para ele, quem investe em um fundo internacional busca um opção sem correlação com a bolsa brasileira, por exemplo, ou as questões macroeconômicas locais. No entanto, se o fundo não for hedgeado, o investidor passa a ter no mesmo produto além do risco do S&P 500, também o risco macro Brasil, por meio da moeda. “Tem aí uma exposição em que, em vez de se descorrelacionar, volta a se correlacionar com o Brasil via dólar”, diz
O que ele recomenda, para quem pensa em um fundo internacional, é evitar fundos dolarizados, “porque há essa sobreposição de Brasil nas cotas de fundos vinculados à variação do dólar”.
Como funciona a proteção cambial de um fundo
A proteção ou hedge que evita a exposição do resultado do fundo ao risco cambial é contratada por meio de derivativos, como dólar futuro e swap (troca de ativos ou indexadores). Com custo ao investidor. Como em um seguro de carro, o investidor paga pelo hedge como se paga pelo seguro.
Saiba mais sobre os fundos de investimento no exterior
Western FIC FIA Nível 1 – Fundo com exposição cambial, busca rentabilidade para o investidor no mercado americano de ações. Investe no mínimo 67% da carteira em BDRs (Brazilian Depositary Receipts). BDR é um certificado ou recibo negociado na B3 que representa ações de empresas listadas em bolsas de outros países, principalmente dos EUA.
Western Asset US 500 – Fundo compra contratos futuros do índice S&P 500 na BM&F Bovespa e aloca parte dos recursos também em ativos indexados à Selic, a taxa básica de juros. O índice S&P 500 é uma carteira formada pelas ações das 500 empresas americanas mais representativas pelo valor de mercado, liquidez e setor. Tem exposição cambial.
Pimco Income FIC FIM IE – Fundo multimercado internacional, aloca o portfólio em uma carteira pulverizada de crédito de emissores espalhados pelo mundo, mas com maior peso para emissões dos EUA.
Embora invista fora do Brasil, o fundo foi estruturado de modo a não ser afetado pelas oscilações da cotação do dólar, euro ou qualquer outra moeda. Sem exposição cambial.
Verde AM Mundi Ações Globais IE FIC FIA – Investe em cotas do fundo Verde AM Mundi Ações Globais Master FIA IE, que tem como estratégia alocar recursos em fundo de ações globais com viés mais amplo nos EUA. A carteira do fundo concentra-se em cerca de 10 a 15 papeis e busca superar o retorno do MSCI All Country World Index. O universo de ações acompanhadas é de 100 empresas. Com exposição à variação cambial.
Verde AM Mundi Ações BRL – Fundo de ações globais com foco maior no mercado americano de ações. Concentrado em cerca de 10 a 15 papeis, essa versão do fundo anterior tem por objetivo também superar o retorno do MSCI All Country World Index. Diferença: sem exposição cambial.
Kapitalo Alpha Global FIC FIM – Fundo focado em mercados internacionais, oferecido em reais e benchmark em CDI, mas sem risco cambial. O capital é alocado em diversas estratégias de gestão que investem primariamente em ativos globais. Sem exposição cambial.
Itaú Index Multimercado Estratégia S&P 500 USD FIC FI – Fundo investe preponderantemente em cotas de outros fundos. Valor mínimo de aplicação: R$ 1, cobra taxa de administração de 0,80% ao ano, sem performance. Com exposição cambial. Rentabilidade negativa em 12 meses: - 8,59%.
ITAÚ Index Ações Estratégia S&P 500 USD FIC FI – Fundo com hedge cambial, acumula rentabilidade de 19% em 12 meses. Aplica preponderantemente em cotas de outros fundos. Valor mínimo de aplicação: R$ 1. Taxa de administração: 0,80% ao ano, sem taxa de performance.
O comportamento do fundo internacional em gráficos
Acompanhe a evolução desses fundos de investimento no exterior desde o início de 2021 em relação à inflação (linha lilás). Os gráficos foram obtidos pelo 'Comparador de Ativos', ferramenta lançada pela Mais Retorno./ COM RENATO JAKITAS