Depois de tom mais duro do BC, para onde vai a Selic e quais as melhores opções para investir
Confira as opiniões de especialistas de XP, BTG Pactual e Genial Investimentos
Não foi surpresa para ninguém e, ao mesmo tempo, pegou quase todos desprevenidos. A decisão, do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que manteve a Selic a 13,75% ao ano, veio em linha com as expectativas do mercado.
Ninguém imaginou que haveria qualquer alteração no patamar que a taxa básica de juros se encontra, mas o tom do comunicado foi diferente do imaginado, não só porque não sinalizou queda como abriu possibilidade de nova alta.
Há semanas, o consenso do mercado é que a revelação da reunião efetivamente seria o comunicado, uma vez que a queda de juros tem sido bandeira levantada por muitos setores, em especial no Governo Federal.
Ainda, com o novo projeto de arcabouço fiscal já finalizado para apresentação em abril, havia esperança de que o Copom sinalizasse a possibilidade de quedas na Selic. Não foi o que ocorreu.
Comunicado mais duro
Em tom mais duro, o comunicado apresentava preocupações com as contas públicas, trazendo inclusive a dívida pública brasileira entre os elementos que causam a desancoragem de expectativas para a inflação. Se havia apostas de que pressões junto ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, surtiriam efeito na Selic, o teor da comunicação também as enterrou.
“A ilusão que eu tive foi enterrada”, diz Roberto Motta, estrategista macro da Genial Investimentos em live da corretora, comentando que chegou a ter expectativa mais otimista. Embora tenha considerado, em primeira análise, o comunicado mais duro, ele entende que no momento o Copom foi realista. “A princípio, nosso Banco Central pintou o rosto para guerra com pode vir PT, pode vir todo mundo que eu vou rebater vocês com argumento técnico”, destaca ele.
“Havia expectativas no mercado de que o comitê poderia retirar do comunicado algumas menções, como o do cenário alternativo de Selic estável até o ano que vem e houve manutenção dessa parte”, comenta Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, na live organizada pelo Research da XP. Além disso, Rodolfo destaca também que surpreendeu a presença de trecho mencionando a possibilidade de retomada do ciclo de ajustes.
Para Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, o comunicado foi sóbrio e duro. ”Na minha visão, o comitê foi na contramão das expectativas de agentes de mercado mais otimistas que esperavam um tom mais leve e até mesmo uma eventual antecipação de corte de juros para o curto prazo. O inverno continua e, segundo o Banco Central, vai ser longo", comenta.
A surpresa não atingiu Álvaro Frasson, economista do BTG Pactual. “O comunicado de hoje foi muito em linha com o que nós já vínhamos falando”, comentou em live do banco. Ele entende que a comunicação do Banco Central foi muito similar à anterior, com algumas mudanças referentes ao cenário de referência e projeções deterioradas. Em sua visão, contudo, havia menções mais positivas sobre a parte fiscal, em especial considerando esforços do governo na reoneração dos combustíveis.
Desancoragem de expectativas
A grande marca do comunicado foi a menção à desancoragem de expectativas. Como justificativa, o BC expôs a dúvida em relação à trajetória da dívida pública brasileira e a falta do arcabouço fiscal. “Acho que grande parte desse movimento de elevação das expectativas de inflação tem a ver com as incertezas sobre a trajetória das contas públicas no Brasil”, explica Margato.
“A depender do arcabouço, isso pode diminuir prêmio de risco e pode inverter a trajetória de alta das expectativas de inflação e levar a um cenário de afrouxamento monetário, ou seja, corte de juros antes do esperado”, resume o economista.
Para José Marcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos, a surpresa também veio com a inclusão das expectativas em relação ao comportamento da dívida pública. A questão foi abordada pela primeira vez em um comunicado do Copom, segundo Camargo.
O economista também menciona que os riscos do cenário internacional figuraram no comunicado, especialmente em relação ao comportamento do crédito. As preocupações com o crédito também se apresentaram em âmbito nacional, de acordo com Camargo.
“Eu acho que o comunicado foi muito na mesma linha do comunicado da reunião passada, que foi considerado duro. Agora, não dá mais para falar que foi tão duro quanto”
A diferença, de acordo com o economista, foi a presença de um cenário alternativo no comunicado anterior, que previa que a meta de inflação seria alcançada apenas em 2024.
“Eles estão fazendo tudo como deveria ser feito, dado o que está na teoria”, destaca.
Expectativas para novos cortes
Na avaliação do economista do BTG, não há mais expectativa de cortes na reunião de maio e houve a forte redução da precificação de cortes em junho também. Ele ressalta que é possível que diversos setores da sociedade não ficarão contentes, mas, em sua visão, houve acerto na comunicação mais dura.
“Ficou bastante claro que os juros vão cair, mas não agora" entende Álvaro.
“A nossa leitura e expectativa é que o mercado diminua a probabilidade de corte de juros no curto prazo, especialmente no primeiro semestre deste ano.
Segundo Gabriel, a expectativa do BTG Pactual é que a taxa de juros termine 2023 em outro patamar, diferente do atual.
“A gente não vê esse cenário de elevação, por mais que haja essa abertura até para passar o recado para o mercado” ressalta o analista da Mesa de Renda Fixa.
Margato, da XP, apresenta a mesma visão: o mercado deve reduzir suas expectativas. No cenário básico do time de economia da XP, a Selic deve encerrar 2023 ainda em 13,75% a.a.. Rodolfo, contudo, não descarta cortes antecipados, em especial no segundo semestre, mas rechaça reduções nas próximas decisões.
A visão para a Renda Fixa
No entendimento de Camilla Dolle, head de renda fixa da XP Investimentos: “Depois das decisões de hoje, basicamente a gente tinha uma expectativa diferente em relação ao comunicado. Então, dado esse tom mais duro do Banco Central, a gente espera que amanhã a curva reaja a isso subindo na ponta curta. Isso quer dizer que as expectativas de juros no curto prazo devem subir para acomodar esse tom mais duro”.
Sobre as preocupações atuais, ela destaca a pressão ainda presente no mercado de crédito, em especial considerando o cenário atual e de episódios envolvendo os bancos lá fora.
“Os spreads de crédito sobem, ou seja, os prêmios de risco de crédito ficam mais altos, é isso mais que a gente tem que acompanhar nesses títulos", comenta a analista.
Ela complementa também que o principal impacto deverá ser a perda de inclinação da curva de juros, com diferença menor entre a parte curta da curva e a longa. Mas comenta que há boas opções para investir em Renda Fixa. “Claro que temos oportunidades nesse momento, dadas as taxas tão altas”, ressalta.
Na visão de Gabriel, pelo Brasil ter iniciado o ciclo de ajustes antes de todo o mundo o coloca em vantagem no controle da inflação. Para investir, “a gente ainda está em um cenário muito bom no mercado de renda fixa”, comenta.
Como investir?
Seria então o momento de investir em títulos prefixados?
“Com essa sinalização do BC mais dura, que até pode ter um novo aumento no cenário, eu diria que não", explica Camilla Dolle.
“Quem se machuca mais nesses momentos de elevação da curva são justamente os títulos prefixados” afirma Camilla, ressaltando que a manutenção dos títulos até o vencimento garante a entrega do valor previsto.
Entre as menções da head de renda fixa da XP, estão os títulos em IPCA, por estarmos em um cenário inflacionário e pela garantia de proteção aos investidores oferecida por esses títulos.
Já nos cuidados necessários, Camilla destaca: “Tanto lá fora quanto aqui vale a gente se atentar ao risco do emissor, ter cautela nesse sentido também na renda fixa ao escolher o crédito privado, bond, principalmente, e preferir os emissores de título de risco mais baixo”.
Na visão de Gabriel: “Uma vez que a gente tende a ter uma Selic em um patamar mais estabilizado por mais tempo, os ativos atrelados à Selic, via CDI, são ainda uma excelente opção, especialmente para quem quer ficar um pouco mais líquido.”
“O recado de alocação agora fica muito claro”, complementa Álvaro. Ele ressalta que uma carteira líquida e pós-fixada segue sendo importante, mas deve-se considerar que as pressões por redução da taxa de juros são significativas.
“É o momento de você alongar um pouco mais a duration, tanto de inflação quanto de ativos prefixados, aproveitando esse discurso por enquanto duro, mas que por algum momento pode provocar uma queda de juros, sendo no terceiro ou no quarto trimestre de 2023” conclui o economista do BTG Pactual.