Cenário fiscal, inflação e exterior indicam um novembro difícil, com mais volatilidade para ações, dólar e juros
Deterioração do cenário fiscal está no centro das preocupações do mercado
O mercado financeiro dá o pontapé a novembro nesta segunda-feira, 1º, em um cenário de persistente instabilidade política e econômica. Para especialistas, um mês que aponta para renovada volatilidade aos negócios nos mercados, de ações ao de juros, passando pelo dólar.
Investidores e gestores de mercado começam o mês com a mesma preocupação, relacionada ao risco fiscal, que permeou os negócios e influenciou negativamente o humor dos mercados em outubro.
PEC dos Precatórios
Os seguidos adiamentos da votação da PEC (Projeto de Emenda Constitucional) dos Precatórios arrastaram o sentimento de incerteza fiscal, agravada pela perspectiva de furo do teto de gastos, para o novo mês. A PEC, que precisa da aprovação de 308 deputados na Câmara, antes de seguir para o Senado, prevê o pagamento parcelado de precatórios.
A quitação em prestações de precatórios, prevista no projeto, é um puxadinho no Orçamento que abre caminho para que o governo pague o Auxílio Brasil sem atropelar a lei fiscal que limita os gastos públicos federais. A manobra fiscal embutida na PEC, contudo, desagradou ao mercado, que viu risco de desmonte da lei que vem assegurando a credibilidade da política fiscal de limite de gastos do governo.
A reação negativa do investidor, diante da percepção de agravamento do risco fiscal, espraiou-se por todos os mercados, com forte queda da bolsa de valores e alta de juros e dólar em outubro. A expectativa negativa gerada no mercado pelo temor de descontrole das contas públicas como efeito do truque fiscal dos precatórios levou o Banco Central a aumentar a dosagem de alta da Selic, de 1 ponto porcentual para 1,50 ponto porcentual, na última reunião do Copom.
A dose reforçada de ajuste não foi suficiente, porém, para colocar a nova Selic, de 7,75% ao ano, acima da inflação – o IPCA-15 acumulado em 12 meses, até outubro, está em 8,30% e o IPCA (inflação oficial) projetado para este ano em 8,96%, pelas estimativas de analistas do mercado financeiro no último boletim Focus.
Inflação e juros
A Selic, contudo, é referência basicamente para a rentabilidade de aplicações mais tradicionais de renda fixa, como caderneta, títulos (CDB) e fundos DI. Fundos de renda fixa também costumam ter o rendimento alinhado com a Selic, mas alguns produtos dessa classe de ativos oferecem desempenho bem mais vistoso, a ponto até de superar a inflação. Veja aqui os fundos que são destaques em rentabilidade.
São os fundos de renda fixa de gestão ousada que mesclam na carteira títulos públicos e papeis vitaminados, como os de crédito privado, os recebíveis, e corporativos, como debêntures incentivadas, entre outros. Títulos que carregam grau de risco pouco maior que o de títulos públicos, mas que turbinam o desempenho da carteira.
À margem da Selic se movimentam também os juros futuros negociados na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3. Espécie de Selic ajustada pelas expectativas de inflação dos agentes econômicos, os juros futuros balizam o rendimento de títulos públicos no mercado secundário.
Papeis prefixados, como a NTN-F (Notas do Tesouro Nacional da série F ou Tesouro Prefixado, na plataforma do Tesouro Direto) e a NTN-B (Nota do Tesouro Nacional da série B ou Tesouro IPCA, no Tesouro Direto, costumam seguir o movimento de juros no mercado futuro. O Tesouro IPCA, que rende juro prefixado mais correção monetária, ofereceu, na sexta-feira, juro de 5,55% mais correção pelo IPCA para vencimento em 2026.
Quando os juros futuros sobem, pressionados por incertezas na economia ou na inflação, como nos últimos dias, esses títulos passam a valer menos que o preço de emissão, porque as taxas de juro também sobem no mercado secundário. O comprador de um título emitido com juro mais baixo que o corrente no mercado vai pedir desconto para ficar com o papel, já que os novos estarão rodando com taxas de juro mais elevadas.
O sobe e desce dos juros no mercado secundário, mais intenso na turbulência, como efeito da atualização do valor do título ao de mercado, afeta apenas quem vende o título no meio do caminho. Quem permanece com o papel até o vencimento recebe, no resgate, o rendimento pela taxa embutida no título no momento da compra.
A percepção de agravamento do risco fiscal, como efeito do drible no teto de gastos públicos, fez disparar os juros futuros e com eles as taxas no Tesouro Direto e no mercado secundário de títulos. Uma dinâmica que abre oportunidade, vista como circunstancial por alguns especialistas, para uma estratégia tática de compra de títulos de prazos curtos por taxas que seriam oferecidas apenas em papeis de vencimentos mais longos.
Oportunidades em ações
Juros futuros em alta, que reforçam a atratividade de alguns títulos de renda fixa, contribuem para deprimir o mercado de ações. Seja pelo efeito negativo sobre os resultados de empresas, seja pela concorrência que esses papeis exercem sobre as ações. Mas o desempenho da bolsa de valores, medida pelo Índice Bovespa (Ibovespa), reflete a variação média das principais ações, as mais negociadas no pregão, e não de todas que são movimentadas no mercado.
Enquanto as principais ações, chamadas blue chips, são destaque e chamam a atenção no dia a dia, o investidor pode garimpar outros papeis de menor visibilidade ou representatividade no índice, mas emitidas por boas empresas. O cenário de instabilidade não significa que as oportunidades desapareceram do mercado de ações, lembram especialistas.
Empresas de menor porte, com bom fluxo de caixa e sólidas, sem endividamento, podem brilhar no ambiente micro, sem ser influenciadas pelo ambiente macroeconômico de turbulência. Com as quedas mais fortes da B3 nos dois últimos meses (desvalorização de 12,86%), as ações dessas empresas com menos visibilidade, mas com bom potencial de alta em melhora de cenário, estão mais convidativas, avaliam os especialistas.
O cenário doméstico tem maior potencial, sobretudo pela incerteza fiscal, de influenciar a trajetória dos mercados em novembro. Mas especialistas lembram que investidores e gestores vão monitorar com atenção também os acontecimentos no exterior. Principalmente os dados econômicos da China, o vaivém das cotações internacionais de commodities, e as perspectivas de mudança na política monetária dos EUA. O foco central é o possível início do tapering, a redução da compra de títulos pelo Fed (Federal Reserve, o banco central americano).