Oriente Médio: petróleo, geopolítica e impactos econômicos
O petróleo, ao longo da história, sempre esteve diretamente relacionado ao crescimento econômico.
Usado para formar reservas, diversificar a economia, comprar influência e até mesmo jogadores de futebol, seu preço é o melhor indicador de risco geopolítico e, no caso do Oriente Médio, isso não poderia ser diferente.
Com o ataque do Hamas no dia 7 de outubro, os mercados de commodities energéticas abriram na segunda-feira seguinte com uma oscilação positiva bastante representativa. Não que Israel ou a Faixa de Gaza sejam grandes produtores de petróleo, mas pelo medo do conflito se espalhar pela região.
Afinal, foi há exatamente 50 anos atrás que houve o primeiro choque do petróleo da década de 70.
Embargo
Em 1973, Egito e Síria coordenaram um ataque surpresa à Israel, que então comemorava a data mais importante do calendário judaico, o Yom Kippur. Tal como agora, os EUA decidiram por apoiar Israel.
Naquela época, a economia mundial era altamente dependente do petróleo, sendo que os norte-americanos mal conseguiam suprir internamente a sua demanda (83% de suas importações vinham da região). Os países árabes, em represália, impuseram um embargo.
Em um período de um ano, os preços do petróleo subiram mais de 300%, com impactos negativos em todo o mundo. No caso dos EUA especificamente, o embargo aconteceu quando o país já enfrentava um cenário inflacionário, semelhante ao atual, o que agravou o problema e gerou uma recessão.
Motivações econômicas
Voltando aos eventos da última semana e, olhando pelo lado estritamente macroeconômico, não se espera por outro embargo, mesmo porque hoje os EUA produzem mais do que consomem, em um contexto onde se usa energia de forma mais eficiente.
Por conta dessa lógica, os norte-americanos não veem mais a necessidade de “policiar” o Oriente Médio. Com a desastrada saída do Afeganistão, aprenderam que é muito fácil entrar em uma guerra, mas extremamente difícil sair dela.
Assim, se convenceram de que a melhor estratégia é aquela onde a paz é do interesse de todos.
Acordos de Abraão
Nos últimos anos, Emirados Árabes Unidos e Bahrein assinaram acordos com Israel. Chamados de “Acordos de Abraão”, eles não dizem respeito só à manutenção da paz. Entre os seus objetivos, a promoção do comércio regional.
A escolha não foi por acaso. Os países do Golfo (Arábia Saudita, Catar, Bahrein, Kuwait e Omã) representam 60% do PIB do Oriente Médio e equivalem a US$ 3 trilhões em reservas depositadas junto aos seus fundos soberanos.
Mais recentemente, a Arábia Saudita, considerada a “joia da coroa”, estava em vias de assinar o seu acordo com Israel mas, diante dos últimos acontecimentos, o processo parou. Não é segredo que os sauditas são defensores da causa palestina, historicamente não reconhecendo o Estado de Israel.
A causa palestina
No início do século passado, predominava o poder do império britânico. Em 1917, seu secretário de relações internacionais redige uma breve carta a favor da criação de um Estado para o povo judeu na Palestina.
Após a Primeira Guerra Mundial, a Grã Bretanha recebe o mandato da Liga das Nações para governar o país árabe. Inicia-se então o movimento de resistência palestina, culminando na revolta de 1936.
Os ingleses mudam os planos, gerando a resistência dos judeus.
Divisão pela ONU
Em 1947, a Organização das Nações Unidas (ONU) divide a Palestina, a contragosto dos árabes. Com a saída dos últimos soldados ingleses do território no ano seguinte, os judeus criam o Estado de Israel. Os países árabes vizinhos invadem.
Com o armistício de 1949, o território é dividido entre Israel e alguns de seus vizinhos. O Egito passa a controlar a Faixa de Gaza enquanto a Jordânia ficou responsável pela Cisjordânia. Setecentos mil palestinos saíram, naquilo que ficou conhecido como “nakba” (catástrofe, no idioma árabe).
A partir da guerra de 1967, a Cisjordânia é ocupada por Israel e, deste então, a história é pontuada por guerras, ataques, revoltas e muitas negociações diplomáticas, mas sem a criação de um estado palestino.
Conclusão
Dado o passado explosivo da região, a guerra na Ucrânia, a inflação ainda alta e as perspectivas de baixo crescimento mundial, o mundo precisa se apegar a um mínimo de sensatez, algo extremamente difícil em uma situação de conflito.
Olhando o xadrez geopolítico, o destino da Faixa de Gaza pode trazer novos desdobramentos, o que explica o tour do Secretário de Estado dos EUA pelo Oriente Médio. Antes mesmo do ataque do Hamas, já haviam divisões internas em Israel, algo impensável nos seus 75 anos de existência.
Na questão militar, existe a possibilidade de o país ter que se defender tanto no sul como no norte, na fronteira com o Líbano, onde está posicionado o Hezbollah.
Foi exatamente isso o que aconteceu em 2006, em outra operação terrestre de Israel em Gaza.
Exército próprio
Na época, a milícia financiada pelo Irã surpreendeu as forças militares israelenses pelo seu grau de sofisticação, inclusive em termos de infraestrutura bélica. Hoje, se parece mais com um exército próprio, forjado pela sua participação nas guerras do Iêmen, Síria e Iraque.
Entretanto, o Hezbollah tem levado outros fatores em consideração.
Como integrante da liderança libanesa, composta por grupos que representam um rico mosaico de religiões distintas, avalia os custos econômicos de envolver um país abalado por uma grave crise bancária em 2019 e que teve o seu porto, localizado dentro da capital, destruído em uma explosão um ano depois.
Alívio da dívida externa
Outra alternativa, menos sangrenta, seria uma negociação com o Egito, afetado pelo alto custo da importação de commodities agrícolas como o trigo desde o início da guerra na Ucrânia e que poderia ter a sua dívida externa renegociada.
Precedentes para tal medida existem. Em 1991, os EUA e outros credores internacionais perdoaram 25% da dívida externa egípcia em troca de apoio militar na guerra do Iraque.
Com o Fundo Monetário Internacional (FMI) se recusando a liberar novas tranches de um empréstimo firmado recentemente, por conta de uma situação parecida com a da Argentina (o banco central emite dinheiro para bancar os gastos do governo), acredita-se que o Egito poderia estar disposto a conversar e, eventualmente, acolher os refugiados.
Mas, atualmente, mais da metade da dívida externa do Egito está nas mãos dos árabes (Emirados Árabes Unidos, Catar e Arábia Saudita), que agora observam o resultado desastroso da política do atual governo israelense em relação aos palestinos.
Com tantas variáveis em jogo, os olhos se voltam para as cotações do petróleo, mais uma vez.