O que esperar do dólar no 2º semestre, após alta superior a 10% em junho e chegar aos R$ 5,33?
Risco fiscal com gastos em ano de eleição é pressão de alta para a moeda
Depois de acumular uma valorização de 10,13% em junho, quando foi a aplicação mais rentável, o dólar começou julho com renovado vigor. Subiu mais 1,68%, na sexta-feira, 1º, e mais 0,09% nesta segunda-feira, 4, chegando aos R$ 5,33. Parece haver muito mais pressão de alta do que de baixa no curto prazo. .
A recente arrancada não foi suficiente, contudo, para anular a queda no ano. O dólar acumula ainda uma desvalorização de 4,31% em 2022.
Especialistas acreditam que, no compasso do embalo recente, o dólar não levará muito tempo para neutralizar o saldo negativo residual do ano. Não faltariam, apontam, pressões que podem manter a moeda em alta. Tanto no cenário internacional como no doméstico.
Pressões externas de alta
Pelo lado externo, o dólar é impulsionado pelo temor do risco de uma recessão global, na esteira da alta dos juros pelos bancos centrais das principais economias para tentar controlar a inflação. Sobretudo dos Estados Unidos
A alta dos juros no exterior liderada pelos EUA, por si só, fortalece o dólar, avaliam os especialistas. Uma remuneração mais atraente nos títulos americanos leva à migração de capitais para o mercado dos EUA.
Fora a atratividade reforçada pela elevação dos juros, os títulos de dez anos do Tesouro americano, o T-Bonds, são considerados os mais seguros do mundo. Um apelo adicional em um cenário de preocupação com a perspectiva de uma recessão global.
“O dólar está em valorização no exterior, em relação às demais moedas, com o aumento da aversão ao risco global”, comenta Gustavo Bertotti, economista-chefe da Messem Investimentos.
A aversão ao risco global assume maior proporção no ambiente local, com as questões internas ligadas ao risco fiscal, analisa Fernanda Consorte, economista-chefe do banco Ourinvest.
Cenário local também pressiona o dólar
A preocupação do mercado com a perspectiva de furo do teto de gastos é apontada por especialistas como a principal fonte de pressão, no cenário doméstico, sobre o dólar.
“Os investidores estão vendo que o que o governo está propondo, via PEC, são medidas para tentar ganhar voto nas próximas eleições”, avalia Fernanda. “Isso tem causado uma aversão ao risco adicional ao Brasil.”
O temor do mercado é que as propostas que turbinam os benefícios sociais, incluídas no pacote de bondades, estoure o teto de despesas, regra criada em 2016 para limitar o aumento de gastos públicos.
É o possível furo desse teto em ano eleitoral que piora o cenário, aponta a economista, e “é isso que tem movimentado o mercado e gerado uma volatilidade com tendência à depreciação cambial”.
Especialistas acreditam que o momento internacional de temor à recessão combinado com o doméstico de risco fiscal sustente o dólar em patamar mais elevado. Bertotti, da Messem Investimentos, afirma que “quem precisa de dólar deve fazer uma posição aos poucos, com compras periódicas, analisando o cenário macroeconômico”, local e internacional.
A movimentação do dólar também tem incentivado estratégias de fundos multimercado em que gestores assumem posições long & short, em busca de ganhos de arbitragem, e também direcionais, em que aposta em uma tendência de preços. A estratégia gera retorno ao cotista quando o gestor acerta a mão, seja em aposta na baixa, na alta ou em arbitragem.
O peso do risco fiscal
Como o mercado financeiro pode torcer o nariz a um pacote com um punhado de bondades que favorecem pessoas e famílias mais necessitadas? Benefícios como o aumento do valor do Auxílio Brasil, a ampliação do vale-gás, a criação de uma bolsa para caminhoneiros e taxistas, o subsídio da gratuidade para maiores de 65 anos, para o etanol. E muito mais. Tudo com impacto no orçamento.
São medidas governamentais de alívio para quem precisa, mas que causam inflação, alta dos juros e freio na economia. Gastos sem previsão de receita geram dívida e mais déficit público. Para pagar a conta, ou o governo emite dinheiro ou se financia no mercado, com a colocação de títulos, à custa de juros mais elevados.
Os juros que o governo paga, referenciados na Selic (em ciclo de alta), se espraiam por toda a economia. E isso costuma frear a atividade, ao tornar o crédito mais caro. Uma política de contenção que, pelos efeitos colaterais, gera o risco ou a incerteza fiscal, uma das causas da inflação.
Efeitos em cadeia que levam todos, do produtor ao consumidor, a pisar no freio. E à adoção de cautela redobrada no mercado financeiro. Um sentimento que se reflete em saída do investidor da bolsa de valores, migração para a renda fixa de juros altos ou busca de proteção no dólar.
Pior de tudo é que a deterioração da economia por conta desses gastos tendem a castigar novamente quem mais precisa dos auxílios.
Performance do dólar em 12 meses
No gráfico estão o comportamento do dólar, o Ibovespa e da Inflação nos últimos 12 meses. Nem a moeda nem a evolução das ações conseguiram superar a inflação do mesmo período, medida pelo IPCA, de 12,04%.
O dólar ainda apresenta variação positiva, de 4,64%, mas o Índice da B3 mergulha no vermelho em 21,58%.
O gráfico foi elaborado pelo 'Comparador de Ativos' da Mais Retorno.