Fala de Powell de aceleração dos juros fez bolsas americanas caírem, mas não deve retirar investidor da B3, dizem especialistas
Juros americanos poderão subir 50 pontos-base na reunião do Fed em maio
O presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), Jerome Powell, em painel do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Washington, nesta quinta-feira, disse que é apropriado que o Fed aja em ritmo "um pouco mais rápido" e reiterou que um aumento de juros de 50 pontos-base será uma opção na reunião de política monetária do BC americano em maio.
A verbalização do que o mercado já vinha precificando fez as bolsas americanas fecharem em queda superior a 1% o pregão de ontem, Nasdaq caiu 2,07%. Embora possa afetar a Bolsa de Valores doméstica, no curto prazo, especialistas não acreditam que a elevação dos juros americanos não deve provocar uma fuga de capital da B3.
Powell afirmou que a economia americana é menos vulnerável e está mais distante dos efeitos imediatos da guerra na Ucrânia do que a Europa, mas ressaltou que o conflito seguirá pressionando a inflação. Disse também que é absolutamente fundamental reconquistar a estabilidade dos preços e que seu objetivo é reduzir a inflação para a meta de 2% do Fed sem causar uma recessão.
O presidente do Fed tinha a expectativa de que a inflação atingiria o pico mais ou menos no momento atual, o que acabou não se concretizando em meio aos efeitos da guerra na Ucrânia. Mas ressaltou que está aguardando que a inflação mostre "progresso de verdade" no sentido de desacelerar.
Concorrência para a B3
Após vários meses de entrada de recursos internacionais, já são sete pregões com saída. Ainda que em milhões de reais, e não bilhões, as retiradas acendem uma luz amarela. Por ora, contudo, os analistas acreditam em redução moderada destes aportes.
"O Fed não deve atrapalhar o capital externo. Não deve ser um grande problema, só se a economia americana entrar em colapso, o que não está no cenário curto prazo, pelo menos. O Ibovespa pode ir a 130 mil pontos, dependendo do fluxo e das commodities", diz Joaquim Sampaio, portfólio manager e sócio da RPS Capital. "Se os preços das commodities caírem e o gringo parar, o fluxo pode morrer", pondera.
"Desde a comunicação do Fed mais dura, o mercado está num ritmo de realização. A tendência com relação ao câmbio ficou mais leve e o Ibovespa retraiu", afirma Eduardo Carlier, gestor responsável pela estratégia de renda variável da AZ Quest. "Tende a ter uma pausa ingresso de capital externo. Talvez vejamos uma atuação um pouco diferente de um fluxo generalizado para papéis de primeira linha como commodities e bancos, que se viu inicialmente", emenda.
Com perspectiva de enxugamento do balanço patrimonial pelo Fed, é "natural" que ocorra um enxugamento da liquidez, observa o economista Silvio Campos Neto, sócio da Tendências Consultoria. "Claro que aqui tem uma taxa atrativa, mas o risco vai nessa direção. Um nível de 12,75%, expectativa de que a Selic suba 1 ponto em maio, já é bastante atrativa e o Banco Central terá de olhar o outro lado, como a atividade fraca, e não só inflação elevada", diz.
Hoje, devido à persistência inflacionária, já há projeções da Selic na casa de 14% no fim do ciclo de aperto monetário. Ainda, sem previsão de um fim da guerra na Ucrânia, a perspectiva é que os preços das commodities ainda sigam em níveis elevados.
Em termos relativos, o Ibovespa aparece como opção de investimento interessante. "E isso foi o que fez com que o estrangeiro viesse para cá. Tem a percepção de Bolsa barata, mas ele também ganha na valorização do real", diz o gestor da AZ Quest, pontuando que novas altas da Selic podem reforçar o chamado carry trade.
Luiz Roberto Monteiro, operador da mesa institucional da Renascença, acredita que o ingresso de investimento externo continuará, a despeito do aperto monetário esperado não só nos EUA, mas em outras partes do globo, como Europa. "Pode ter a famosa arbitragem, com investidores se beneficiando de Selic a 13% previsão. Por isso, o dólar tem cedido, em meio à atratividade de operações de carry trade."
Recentemente, o Bank of America (BofA) elevou sua projeção para o Índice Bovespa de 125 mil pontos para 135 mil pontos, tendo como principal argumento otimismo com os preços de commodities como petróleo, minério de ferro e celulose.
Um pouco antes, a Guide já havia aumentado a expectativa de 120 mil pontos para 130 mil pontos no término de 2022. Já o Goldman Sachs não descarta que o principal indicador da B3 atinja 131 mil pontos no final do ano, mas opta por manter o preço-alvo em 118 mil pontos.
Apesar da avaliação de que as commodities sustentarão o índice, o banco americano argumenta que o desempenho do Ibovespa parece mais próximo de um "repique tático" em momento de grande volatilidade mundial.
Cenário de incerteza
O próprio presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse recentemente que o País está bem posicionado para um possível efeito da política monetária americana no fluxo. "Nosso cenário não é de reversão desse movimento de entrada, mas estamos em um cenário de muita incerteza", ponderou.
Dados da B3 mostram que a saída dos estrangeiros começou antes da virada do mês. Em 31 de março, os investidores estrangeiros retiraram R$ 7,150 bilhões, após correção na metodologia de publicação de informações do segmento de renda variável.
Com isso, o montante registrado em 2022 foi reduzido de R$ 91,1 bilhões para R$ 64,1 bilhões. No dia 13 de abril, o investidor externo retirou R$ 322,166 milhões, elevando para sete o número de pregões de retirada, com o montante deste mês ficando deficitário em R$ 1,754 bilhão.
Contudo, em seguida, (dias 14 e 18), houve ingresso. Ainda assim, em abril, R$ 101,908 milhões deixaram a B3. No acumulado de 2022, porém, o saldo está positivo em R$ 65,226 bilhões. / com Agência Estado