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Economia

Crescimento econômico: tentativa e erro no pós-pandemia

Data de publicação:09/01/2024 às 03:00 -
Atualizado 10 meses atrás
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Há um ano atrás, havia uma expectativa de alto crescimento para a China, dado que estava finalmente se desfazendo de suas drásticas medidas para o controle da Covid-19.

Passados 1.016 dias e inúmeros lockdowns, esperava-se que a China impulsionasse a economia mundial, inclusive trazendo preocupações de que isso geraria novas pressões inflacionárias no resto do mundo, algo que demandaria juros ainda mais altos. 

Entretanto, depois de alguns meses, constatou-se que alguma coisa estava errada.  

Desaceleração econômica

Os indicadores não eram nada animadores.  Mesmo com a abertura da economia, o setor de serviços desapontou.  Também não se observou qualquer dinamismo no mercado imobiliário chinês ou pelas autoridades locais, sempre dispostas a ranquear bem junto à elite política.  

Para todos, ficou óbvio que o modelo de crescimento chinês funcionou em um mundo que já não existe mais.  Sai de cena uma nação que crescia em média 9% ao ano e que era responsável por aproximadamente um terço do crescimento global.  

Em 2023, a segunda maior economia do mundo definiu para si uma meta de 5%, a menor em mais de 30 anos.  

BRICS+

Excluindo-se peculiaridades locais, se Jim O’Neill, o economista do Goldman Sachs que em 2001 identificou o grupo dos BRICS como a mola propulsora do crescimento mundial, fosse fazer o mesmo trabalho hoje, por onde ele começaria?

Talvez pela Índia, que executa o seu plano de desenvolvimento mesmo em condições bastante adversas?  

Afinal, o mundo ficou mais complexo e não há qualquer indício de que a sua “cria”, que se transformou no BRICS+ (pela ausência da escolha de um novo nome) com a adesão de Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã e Etiópia a partir de 2024, consiga muito no curto prazo, haja vista as discrepâncias entre os seus membros e as limitações atuais da China.

O Consenso de Washington

Na década de 80, o chamado “Consenso de Washington” tinha por objetivo apresentar um manual de boas práticas para a administração de um país.  Entre as medidas sugeridas, reformas, gastos públicos sob controle e um câmbio estável.

Com o passar do tempo, surgiram alguns aprimoramentos, como o estímulo à competição e a privatização de empresas estatais.  Ainda assim, não houve nada que pudesse ser comparado ao “ritmo chinês” de crescimento.

Percebeu-se então que algumas restrições limitavam o desenvolvimento econômico e, mesmo quando eram eliminadas, não surtiam o efeito na intensidade necessária.  Estudos apontavam que, entre os 52 países que adotaram em algum grau as medidas sugeridas, o PIB não avançava além de 2% ao ano (1980 a 1998).

Consenso de Pequim

Os países asiáticos, por sua vez, alcançaram desempenho superior durante o mesmo período, o que trouxe algumas pistas de como ultrapassar a barreira dos 2%: uma força de trabalho grande e barata, que podia ser treinada para produzir o que o mundo demandava.

Bastava que as empresas estrangeiras viessem com o seu conhecimento e tecnologia para elevar os padrões de produtividade.  Assim, ter escala para produzir localmente, mas vender mundialmente se transformou no “Consenso de Pequim”, fazendo um trocadilho com a capital da China.

Seria esse modelo, com algumas adaptações, ainda viável nos dias de hoje?  Apesar do amplo debate entre os economistas e os formuladores de políticas públicas, uma verdade é incontestável: produzir atualmente exige menos pessoas do que na década de 80.

Buscando um atalho

Para atrair indústrias de ponta, entram os subsídios, um atalho para avançar mais rapidamente na corrida global.  Nesse jogo, vale tudo, até mesmo oferecer instalações ultramodernas “de graça” (às custas do contribuinte).

Mas aí entra o caso da China novamente.  

Da mesma forma que muitas empresas desejam se desvencilhar dela (produzindo em locais alternativos, o que ensejou a criação do termo “China mais um país”), recusam outros destinos pela falta de uma “infraestrutura física e intelectual” igual à fornecida pelos chineses, que passaram décadas investindo só nisso.

Autossuficiência competitiva

Atualmente, busca-se a autossuficiência para se blindar dos riscos geopolíticos.  Entretanto, seria ela capaz de também prover as condições para competir internacionalmente?  Talvez a resposta esteja um pouco antes de se ultrapassar a porta da fábrica, mais exatamente no processo de exploração.

Com a transição energética, muitos estão empenhados em trazer indústrias que possam fazer o melhor uso dos recursos minerais encontrados no solo, ao invés de simplesmente exportar a riqueza.  Nesse caso, o intuito seria criar cadeias locais de valor (no lugar das cadeias globais de valor, onde cada país ganha escala em apenas uma etapa do processo produtivo).

Isso seria totalmente diferente do padrão atual, observado no mercado de commodities energéticas, onde mais de 40% das refinarias se concentram em apenas 4 nações (EUA, China, Índia e Japão).

Quando a festa acaba

Mas, como tudo na vida, nada é garantido, até mesmo para quem em tese possui recursos ilimitados.  Ao se tentar fazer de tudo, corre-se o risco de não ter para quem vender ou até mesmo não obter o resultado almejado.  

Ao se apostar em várias atividades simultaneamente, em uma versão “turbinada” da diversificação, torna-se extremamente difícil acompanhar o que está funcionando e fazer os devidos ajustes pois não há incentivo que dure para sempre.  

Ao se secar a fonte, conseguirá determinado setor crescer sozinho? 

Conclusão

De um modo geral, todo modelo de desenvolvimento se ampara no mercado externo para crescer, tanto pela questão da competitividade como pela escala que é alcançada.

Na tentativa de se ganhar alguma vantagem na largada, hoje contempla-se basicamente três estratégias: seduzir empresas de alta tecnologia, direcionar a riqueza nacional para a transição energética ou ser a grande trading do mundo, com a promessa de intermediar negócios globais sem os transtornos geopolíticos.

Cada uma se moldará à realidade de cada país, ainda que os fundamentos econômicos predominem. 

No que diz respeito aos gastos públicos, quão eficiente é o Estado em organizar os recursos e prover subsídios, haja vista o objetivo de alto crescimento e os custos exigidos em infraestrutura e pesquisa, considerando um mundo envelhecido e endividado que busca endereçar o aquecimento global?

No final das contas, haverá muitas tentativas e erros até que se chegue a um novo consenso, em uma capital ainda a ser definida.

Sobre o autor
Nohad Harati
Possui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.