Mercado tende a continuar em recuperação, mas último dia do mês é de maior volatilidade
Após fortes perdas na última terça-feira, mercado está em trajetória de correção dos preços dos ativos
O mercado financeiro pode continuar a trilhar nesta quinta-feira, 30, o caminho de recuperação das fortes perdas da terça-feira, 29, quando a piora de expectativas no cenário internacional fez a Bolsa de Valores despencar e deu impulso ao dólar.
A trégua com a melhora das condições externas propiciou uma reação positiva dos mercados no dia anterior, movimento que pode persistir neste último dia de setembro.
A menos que algum fato ou expectativa negativa de última hora mude o humor dos investidores. De todo modo, o último dia do mês, lembram analistas e especialistas, costuma ser marcado por maior volatilidade nos mercados, já que há um acirramento de disputa entre os investidores em busca de fechamento mais positivo para o mês.
Para esta quinta-feira, o mercado aguarda a divulgação do relatório trimestral da inflação, que será divulgado pelo Banco Central, que deve trazer uma radiografia do comportamento do indicador, cujas projeções vem subindo a cada semana, para este ano e em 2022.
Segundo o último boletim Focus, a previsão é de um IPCA de 8,35% para 2021 e de 4,10% para o ano seguinte.
Um dado que surpreendeu positivamente na véspera foi o IGP-M, que desacelerou e teve variação negativa de 0,64% em setembro. A queda, contudo, não trouxe alento em relação aos demais índices de inflação, especialmente com a trajetória do IPCA, que mede a inflação oficial.
O recuo do IGP-M, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), refletiu a forte queda nos preços do minério de ferro no período. Sem o benefício desse efeito sazonal, o IGP-M, de acordo com especialistas em preços, teria registrado uma alta de 2,37% em agosto e de 1,21% em setembro.
Evergrande continua no radar
No front externo, contribuiu para a melhora do humor dos investidores os novos lances na crise financeira da incorporadora Evergrande que apontam para a perspectiva de que a construtora chinesa venha a vender parcela de seus ativos.
Seria mais uma tentativa de solucionar parte de sua dívida com juros e suavizar o temor de uma perspectiva de calote que tem criado instabilidade nos mercados globais, embora o mercado torça mesmo é por uma ajuda do governo chinês à incorporadora.
A queda do rendimento dos treasuries, os títulos de dez anos do Tesouro americano, também foi bem recebida pelos mercados, que temem uma redução na recompra de títulos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano).
Uma inciativa no âmbito de mudanças no pacote de estímulos monetários dos EUA que, se materializada, poderá reduzir a oferta de dinheiro no sistema financeiro e pressionar os juros, movimento que costuma gerar efeitos negativos na bolsa e pressionar o dólar.
Precatórios e auxílios
Na cena interna, impasses fiscais seguem à mesa. Um dos principais, é a questão dos precatórios, no qual o governo pretende usar como base para colocar em pé o Auxílio Brasil em 2022.
Na véspera, o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, defendeu a PEC que trata do pagamento dessa dívida e afirmou que ela é compatível.
"O crescimento dos precatórios não está compatibilizado com o do orçamento, que segue o teto de gastos. Os precatórios saíram muito da normalidade. Não era previsível, saiu do padrão", afirmou.
Na mesma linha, o deputado Hugo Motta, relator da PEC dos Precatórios, disse hoje que "não é razoável" sair de um gasto de aproximadamente R$ 30 bilhões para uma fatura próxima a R$ 90 bilhões, como previsto para 2022.
Mas se o futuro traz imprevisibilidade, dados fiscais de curto prazo animaram o sentimento de risco. Os resultados do Governo Central e do Setor Público Consolidado surpreenderam, o primeiro com um déficit menor do que esperado e o segundo, com superávit calcado na arrecadação forte de Estados e municípios.
"Os números fiscais de curto prazo seguem positivos", pontua a estrategista-chefe da MAG Investimentos, Patricia Pereira. "Mas a incerteza da manutenção do teto, precatório, risco de renovação de auxílio, acabam pesando mais", pondera.
Além do Auxílio Brasil e precatórios, o mercado também monitora os rumores de extensão do auxílio emergencial, cuja fonte de receita fica fora do teto de gastos.
Lei de Improbidade Administrativa
Com aval de aliados do governo Bolsonaro, o Senado aprovou, na noite anterior, o projeto que afrouxa a Lei de Improbidade Administrativa e dificulta a punição de políticos. Agora, um prefeito, por exemplo, só será punido pela lei se ficar comprovado que ele teve a intenção de lesar a administração pública - não basta apenas ele ter lesado.
O ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Herman Benjamin, disse que a medida "é um enfraquecimento sem precedentes da legislação de combate a administradores e empresas corruptos.
"Seremos cobrados, inclusive internacionalmente", enfatizou Benjamin. A posição é corroborada por integrantes do Ministério Público e especialistas, que veem brecha para a impunidade.
Por outro lado, parlamentares argumentam que era preciso atualizar a legislação que permite punir, por exemplo, atraso na apresentação de uma prestação de contas.
Nova York e o mundo
Nos Estados Unidos, a suspensão do teto da dívida do país segue preocupando os investidores, pois o tema ainda se mantém pendente no Senado.
Soma-se a isso as perspectivas para a redução de estímulos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), com uma série de declarações públicas feitas por dirigentes da autoridade. Por lá, os futuros operam em alta.
Sobre o teto da dívida, o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO, na sigla em inglês) dos EUA calculou que o governo americano ficará "sem caixa" para pagar suas obrigações entre o final de outubro e o começo de novembro se não houver uma suspensão.
Já a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, afirmou que a aprovação precisa passar pelo Congresso, e que não há um plano B no tema. Além disso, reforçou que a administração quer um evitar um shutdown, que são "custosos e danosos", sendo este o principal objetivo, mas indicou que o governo tentará "minimizá-lo se ocorrer".
Quanto ao Fed, o presidente da autoridade, Jerome Powell, reiterou que a instituição está perto de atingir o "progresso substancial" necessário para o começo do tapering, o processo de redução gradual das compras de ativos.
Para a Capital Economics, um tapering no próximo ano ou depois não deverá pesar muito no mercado de ações dos EUA, que deverá ter pequenos ganhos nos próximos dois anos.
Powell e seus colegas no Japão, Europa e Reino Unido expressaram um “otimismo cauteloso” de que as interrupções na cadeia de suprimentos que elevaram as taxas de inflação em todo o mundo devem se revelar como fenômenos temporários.
O dirigente apontou que a inflação nos EUA deve ficar "bem acima da meta nos próximos meses", mas perderá fôlego adiante, prevendo perspectiva positiva no médio prazo, mas com elevada incerteza.
"O risco é a inflação alta nos Estados Unidos persistir por mais tempo. A discussão passa a ser o ritmo de redução da liquidez via títulos que será adotado e o timing da primeira alta dos juros", comentou, em relatório, o sócio e economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho.
Os investidores estão terminando o terceiro trimestre preocupados, além das pressões inflacionárias, com uma iminente crise de energia, os gargalos na cadeia de suprimentos e os riscos regulatórios provenientes da China.
No continente asiático, as bolsas por lá fecharam majoritariamente em alta nesta quinta-feira.Na China continental, os mercados asseguraram ganhos antes de um feriado nacional de uma semana, que terá início nesta sexta-feira, 1, e se estenderá até quarta-feira, 6.
O Xangai Composto subiu 0,90%, aos 3.568,17 pontos, e o menos abrangente Shenzhen Composto avançou 2,04%, aos 2.395,05 pontos.
O índice de gerentes de compras (PMI) oficial do setor industrial chinês caiu de 50,1 em agosto para 49,6 em setembro, com a leitura abaixo de 50 sugerindo contração da manufatura.
Por outro lado, o PMI industrial chinês medido pela IHS Markit/Caixin Media subiu de 49,2 para 50 no mesmo período, indicando que a atividade manufatureira se estabilizou. As pesquisas oficial e privada usam amostragens diferentes.
Ficaram no azul os índices sul-coreano Kospi, com alta de 0,28% em Seul, aos 3.068,82 pontos, e o Taiex, que se valorizou 0,47% em Taiwan, aos 16.934,77 pontos.
Já o Nikkei caiu 0,31% em Tóquio, aos 29.452,66 pontos, com investidores atentos a desdobramentos políticos após Fumio Kishida ter sido eleito novo líder do Partido Liberal Democrático (PLD) do Japão, o que na prática o levará a assumir como próximo primeiro-ministro do país.
Em Hong Kong, o Hang Seng recuou 0,36%, aos 24.575,64 pontos, à medida que a ação da Evergrande sofreu uma queda de 3,91%, após relatos de que a endividada gigante do setor imobiliário chinês deixou de pagar juros sobre outra emissão externa de bônus.
Na Oceania, a bolsa australiana teve hoje seu melhor desempenho diário em dez meses, com ganhos em todos os setores. O S&P/ASX 200 avançou 1,88% em Sydney, aos 7.332,20 pontos. / com Júlia Zillig e Agência Estado