ESG e redifinição: porque o mundo precisa de novas regras
São as empresas mais bem-sucedidas que acolhem o ESG ou é o ESG o responsável pelo sucesso das mesmas?
Polarizações à parte, ainda falhamos no que diz respeito à identificação, mensuração e divulgação dos critérios que deveriam ajudar a todos a cuidar do planeta, da sociedade e das boas práticas empresarias - o tripé das práticas ESG. Apesar das boas intenções, esse é um campo onde a racionalidade deveria prevalecer.
Puxando para o lado macroeconômico, é pensar os custos das externalidades negativas (os efeitos sobre terceiros não diretamente ligados aos negócios) e os incentivos para que os agentes econômicos busquem mitigá-las, eliminando muita da subjetividade encontrada nos parâmetros definidos como sustentáveis.
Integração ESG
No mundo dos investimentos, isso ocorre de algumas formas.
A primeira delas é pela negociação de fundos (sejam eles ETFs ou de gestão ativa) com base em alguns critérios. Indústria com porte semelhante ao mercado de criptoativos, ela ainda é pouco representativa quando comparada com a totalidade da atividade de gestão de recursos de terceiros.
É justamente aí onde reside o problema. O que fazer com os demais fundos? Integração ESG é modo como tentam se adaptar, incorporando aos seus modelos de gestão de risco outras variáveis, sem que ninguém saiba exatamente como conciliá-las.
A questão ficou tão complexa que impede até mesmo que se avalie o óbvio, como os riscos de uma recessão econômica, por exemplo. Nesse ínterim, ETFs temáticos se dão ao luxo de cobrarem taxas maiores.
Bússola quebrada
Na ausência de um padrão, as agências que deveriam oferecer qualquer referência não possuem um norte. Querem ser abrangentes, mas deixam de fora elementos fundamentais como os gases de efeito estufa.
Os modismos não tornam a tarefa mais fácil. Uma empresa que produz armamentos pode entrar em um índice, se a sociedade passar a acreditar que ela tem o propósito de defender a democracia, como é o caso da Ucrânia?
Nesse quesito, ponto para a Europa, onde a regulamentação de União Europeia (UE) é mais rigorosa. No continente, aplica-se uma segmentação maior, de forma a agradar tanto moderados como extremistas:
• Artigo 6: é a categoria “ESG light”;
• Artigo 8: representa a categoria intermediária;
• Artigo 9: o ESG propriamente dito.
Com essa classificação, acredita-se que é mais fácil informar o investidor leigo, capturado mais pelo marketing do que pela convicção.
Adiciona valor?
Nos últimos anos, o bom desempenho dos fundos ESG se deu pelos investimentos em empresas de tecnologia, algo que ficou definitivamente para trás com os vários aumentos de juros mundo afora e a guerra na Ucrânia.
Isso traz ao centro do debate a questão da mensuração dos critérios ESG.
A implementação de determinadas estratégias empresariais pode minar o lucro de um negócio se elas não forem relevantes para o seu setor de atuação. Dito de outra forma, reduzir sua pegada de carbono faz mais sentido para uma geradora de energia do que para uma empresa de software.
Voltando à pergunta acima, nada melhor do que consultar quem domina o assunto. Para Aswath Damodaran, é razoável que determinadas companhias, não tão “ESG friendly”, paguem mais caro para se financiarem. Entretanto, existem poucas evidências apontando que as queridinhas das redes sociais geram mais crescimento.
O ovo e a galinha
No mundo empresarial, vale o mesmo dilema do ovo e da galinha: são as empresas mais bem-sucedidas que acolhem o ESG ou é o ESG o responsável pelo sucesso das mesmas?
Seja qual for a resposta, se um desempenho superior é o desejável, o mais intuitivo é se antecipar, pois qualquer melhoria significativa inevitavelmente se reflete nos preços.
Basta olhar para os inúmeros exemplos de companhias que são compradas, viradas do avesso e vendidas por um preço muito maior.
Medindo corretamente
Tudo indica que esse é um trabalho em andamento. O quanto que uma empresa polui deveria ser o primeiro item “E” a ser medido, mas ele não é o único. Tão importante quanto é o tipo de energia (renovável ou não) que abastece aquele negócio.
Em um mundo ideal, toda a cadeia deveria ser medida, o que traz alguns problemas de ordem prática: ao se dar a partida em um carro, quem seria o responsável pelos danos à atmosfera (o setor de petróleo ou a indústria automobilística)?
O mesmo vale para o carro elétrico: ele pode poluir menos, mas sua bateria depende da atividade de mineração (a extração do lítio). Outra externalidade negativa, que também precisa ser tratada.
Bomba relógio
Em 2002, a Lei Sarbanes-Oxley mudou radicalmente a forma como empresas de capital aberto apresentavam as suas contas ao mercado. Tudo em função de uma série de escândalos contábeis identificados na época, sendo o da Enron o mais conhecido.
Nascia ali o “G” de governança. Tendo se juntando ao “E” (meio-ambiente) e ao “S” (sociedade), mais conhecidos por conta das mudanças climáticas e do aumento da desigualdade, é fato que a junção dessas letras criou uma indústria de rating à parte.
Por mais que tivesse o intuito de promover as empresas com as melhores práticas, ela não foi capaz de produzir um padrão minimamente aceitável, o que causa mais confusão do que benefícios tangíveis.
Enquanto algumas agências de rating avaliam a cultura empresarial, outras medem a quantidade de processos trabalhistas na Justiça. Resumindo, são perceptíveis as diferenças na abrangência, na mensuração e nos pesos das metodologias adotadas.
No que diz respeito à regulamentação mais recente, as autoridades optaram pelo meio ambiente, já pensando na emergência climática e visando uma simplificação. No caso das regras da EU especificamente, citadas anteriormente, a vantagem é que são impostas, sem exceções, a todos os 27 países do bloco.
Conclusão
A pressão regulatória aumentará, o que fará com que o próprio mercado financeiro faça o ajuste da forma como sabe, via preço.
O desafio é achar uma fórmula onde menos é mais: mais objetividade e, consequentemente, mais precisão. Na ânsia de se agradar tantos grupos de interesse, o foco principal do negócio se perde.
Por mais que almejar um mundo melhor seja uma meta das mais nobres, é fato que ninguém quer pagar o preço climático, social e de governança sozinho.