Saiba por que os fundos de ações globais estão caindo em 2022 e quais as perspectivas para o setor
Ativos refletiram as fortes quedas dos principais índices americanos, como S&P 500, Dow Jones e Nasdaq
O cenário econômico mundial, deteriorado cada vez mais por inflação recorde em 40 anos, juros em alta e ameaças de recessão, está prejudicando o desempenho dos fundos de ações globais.
De acordo com um relatório do Bank of America (BofA), esses ativos registraram saídas de US$ 5,2 bilhões no ano até o dia 18 de maio do mercado americano.
Os ativos refletiram uma forte desaceleração dos principais índices das bolsas americanas, com o avanço da inflação – que em junho subiu 1,3% e contabilizou um salto de 9,1% na comparação anual, considerado o maior pico desde 1982 – e, por consequência, sugere uma postura ainda mais dura a ser adotada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) para tentar frear o indicador.
Queda de US$ 12 trilhões
Após um pico atingido em março, o mercado de ações globais despencou quase US$ 12 trilhões, com os BCs mundiais seguindo a mesma toada do Fed.
Fazendo um raio-x de sua extensão, o maior mercado para operações com esses ativos está concentrado nos Estados Unidos, com mais de 60% das ações globais, seguido pelo Japão, que compõe 5,4% e pelo Reino Unido, com 3,7%. O Brasil, por sua vez, representa menos de 1% de todas as ações globais negociadas pelo mundo, segundo a XP.
Para ilustrar esse cenário, os números são bons aliados. Nos seis primeiros meses de 2022, o S&P 500, que reúne as 500 maiores empresas dos Estados Unidos, despencou 20,6%, contabilizando o pior semestre em mais de 50 anos. Isso significou perdas na ordem de US$ 8,2 trilhões.
Já o índice Dow Jones reportou baixa de 15,3% no período, obtendo a maior desaceleração desde 1962, quando contabilizou desvalorização de 23,2%.
No Nasdaq, o tombo foi ainda mais acentuado: 29,51%, a maior queda porcentual de todos os tempos.
De acordo com um relatório da XP sobre o assunto, a retração veio após um período de bonança para as bolsas americanas.
"Antes da pandemia, os EUA tiveram uma das melhores décadas de retornos de sua história. Entre 2009 e 2019, o S&P 500 acumulou um retorno total de impressionantes +257% em dólares e quase
3x o retorno dos mercados globais medido pelo MSCI ACWI. Nem a pandemia parou o mercado
americano, que continuou a se favorecer com o crescimento impressionante das big techs", aponta o documento.
Bear market
No início de janeiro, logo nos primeiros dias do ano, as perspectivas eram positivas para o mercado de renda variável global, que trouxe o otimismo no bolso dos últimos dias de 2021. No entanto, o mercado foi afetado pelo bear market e o quadro mudou.
O bear market (mercado urso, na tradução em inglês) é o termo utilizado no mercado financeiro para definir um período de intenso pessimismo e desvalorização nas bolsas de valores.
E há um temor de que esse período seja maior do que o esperado, com a possibilidade de que uma recessão global esteja em curso.
De acordo com um levantamento feito pelo Wells Fargo, o viés de baixa nas bolsas, quando acompanhado de uma forte desaceleração econômica, pode durar, em média, 20 meses, o que é uma má notícia para o mercado de renda variável, incluindo os fundos de ações globais.
Setores mais afetados e movimentações
De acordo com Rodrigo Sgavioli, head de alocação e fundos do research da XP, entre os setores mais penalizados na renda variável global estão as ações ligadas a empresas de crescimento – e, por consequência, os fundos atrelados a essas companhias.
“São fundos focados em empresas que se encaixam na categoria de crescimento, que jogam para frente as projeções de geração de receita e lucro”, explica.
O especialista destaca que a queda foi mais acentuada em fundos com maior exposição ao setor de tecnologia, que incluem as big techs e empresas menores.
“Quase todos tiveram quedas no período, porque são empresas sensíveis aos juros, que estão em trajetória de alta em 2022”.
Rodrigo Sgavioli, da XP
Outros fundos globais bastante afetados com esse cenário econômico instável – que ainda inclui a guerra na Ucrânia e os bloqueios na China por conta do avanço da covid-19 – são ligados a companhias focadas no consumo discricionário (bens e serviços não essenciais).
Nos Estados Unidos, as ações das empresas do setor que integram as bolsas por lá registraram queda de 34,2% no primeiro semestre deste ano.
“A baixa não foi tão expressiva quanto a registrada pelas ações de empresas do setor de crescimento, mas sofreram significativamente por conta das perspectivas de uma economia mais desaquecida lá fora. O mercado antecipa essas expectativas”, ressalta.
Sgavioli, da XP
A queda das ações das companhias que se encaixam na categoria de crescimento se deu também por conta de uma grande fuga de investidores desses ativos para realocar seus recursos em empresas “high quality growth” (ou alto crescimento com qualidade, na tradução em português).
“Eu estive no exterior e conversei com vários gestores que fizeram esse movimento, buscando posições em empresas de crescimento, mas que tivessem alguns pontos relevantes em destaque, como margem de lucro e lucro expressivos, cadeias de fornecedores consolidada e projetos de melhoria operacional”, enfatiza Sgavioli.
Para o especialista da XP, muitos gestores olham esse cenário com uma ótica positiva, em busca de oportunidades.
Diversificação
O movimento é relativo, segundo a casa, mas o universo de fundos globais disponíveis para investimento pelo Brasil vem crescendo substancialmente nos últimos cinco anos.
" Isso traz um rico leque de opções interessantes e aproxima, finalmente, o brasileiro de ser um investidor
global, com exposição a países, mercados e setores da economia mundial que não existem ou ainda
estão engatinhando por aqui sem a necessidade de realizar a escolha de ativos individualmente", ressalta a XP em relatório sobre o assunto.
Uma das recomendações que o especialista da casa de análises faz para os investidores é que, nesse momento, o melhor caminho é adotar a diversificação. “É interessante ter uma exposição variada e aproveitar as teses que não estão disponíveis no Brasil. É uma forma de ter acesso a mercados mais sofisticados e reduzir o risco local”.
A XP destaca ainda que os fundos globais "é uma forma extremamente profissional de acessar os melhores gestores do mundo, que, por sua vez, investem nos ativos mais líquidos do mundo, nas melhores empresas, muitas vezes líderes seculares de mercados globais".
"Ou outras que são motores da transformação digital em curso ou até mesmo responsáveis por desenvolver pesquisas, remédios e vacinas na área de saúde, entre outros exemplos", complementa.
As recomendações ganham relevância à medida que o número de investidores que alocam recursos no exterior cresce a cada mês, mesmo que o volume ainda seja inexpressivo. Um estudo feito pela fintech Gorila aponta que ainda são poucos os investidores que recorrem a ativos no exterior - apenas 3,81% de sua base.
"Contudo, é interessante notar que o número de usuários com esses ativos na carteira sobe consistentemente, apesar da alta robusta na taxa de juros", aponta Guilherme Assis, diretor presidente da empresa.