Fundos de Investimentos

Como fica o fundo com patrimônio líquido negativo; conheça 3 deles

O saldo devedor pode ser decorrente tanto de operações arriscadas, em derivativos, como de questões contábeis

Data de publicação:09/02/2023 às 08:00 - Atualizado 2 anos atrás
Compartilhe:

Um fundo com patrimônio líquido (P/L) negativo indica que suas dívidas e obrigações superam os seus ativos, indica que ele está devedor. Em princípio, pode ser uma situação grave, decorrente de uma gestão arriscada, com atuação alavancada em mercados derivativos, ou desvalorização acentuada dos ativos. São casos raros, nem sempre vinculados a esses motivos, e às vezes explicados por outros tipos de operações.

A Mais Retorno fez um levantamento em sua base de dados e identificou os três fundos que estão com o maior saldo negativo no mercado. São três multimercado: Pedra Dourada FIM CP; Conquest FIM Liquidação; e Eco Hedge FIM CP LP.

Fundo

Patrimônio

em R$ milhões

GestoraCotistas
Pedra Dourada-65,66Reag1
Conquest Liquidação-13,55Veritas Capital18
Eco Hedge -  4,19Genial5
Fundos no vermelho

“Geralmente um fundo fica em cotas negativas quando há perdas decorrentes de alavancagem muito acima do patrimônio total do fundo”, diz Luiz Felippo, sócio e analista de fundos da Nord Research. 

“Essa situação deriva do fundo apostar no mercado mais do que tem”, afirma Rodrigo Knudsen, gestor de fundos da Empiricus Investimentos. “Quando o patrimônio fica negativo, alguém calculou mal, a gestora, administradora, corretora, a CVM”.

No caso do Pedra Dourada, Silvano Gerster, diretor da Reag, esclarece que se trata de uma atualização contábil do ativo do fundo. É que os recursos do fundo foram aplicados em operação estruturada em reforma de um imóvel ainda em andamento e, portanto, sem o laudo que traga o valor corrigido do imóvel. Assim que o ativo for atualizado, com sua valorização, haverá reversão no valor das cotas, explica ele.

Mudança na legislação

Quando um fundo fica com seu patrimônio negativo, os cotistas podem ser chamados a fazer novos aportes. Pelo menos, é isso o que permite o artigo 15 da Instrução n° 555 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que está com os dias contados, porque no dia 3 de abril entra em vigor a Resolução CVM 175 com uma camada maior de proteção ao cotista.

“Na verdade, constatando-se num fundo patrimônio líquido negativo, não haverá mais obrigação do investidor fazer aportes adicionais, regra em vigor no momento”, afirma Edemilson Wirthmann Vicente, sócio do Wirthmann Vicente Advogados, especialista em recuperação judicial. “Com isso, a CVM alinha a norma brasileira com a maior parte das normas internacionais sobre o mesmo tema”.

A nova Resolução da CVM determina que as regras sejam muito claras ao cotista, porque haverá a possibilidade de o fundo ser constituído com responsabilidade limitada ou ilimitada. 

No primeiro tipo, se ficar negativo, o fundo vai recair na situação de insolvência, prevista em lei. No entanto, gestores e administradores do fundo terão de observar as hipóteses em que essa declaração de insolvência poderá ser requerida, e quais as providências que podem ser tomadas antes dessa medida. Nos fundos com responsabilidade ilimitada, os cotistas que aceitarem essa condição podem ficar responsáveis por aportar mais recursos nesses casos.

“A nova edição da instrução CVM 555 coloca que o máximo de perdas seja o total de cotas que o investidor possui em um fundo”, diz Felippo.

O que acontece no fundo devedor

“É importante dizer que, ainda que o P/L fique negativo, existe aí o direito de se buscar garantias, o gestor continua responsável fiduciário de ir atrás dessas garantias e executar o que for possível sobre os direitos sobre esses ativos” ressalta Wirthmann. Os cotistas, por sua vez, devem verificar o que foi fixado de regra para o funcionamento do fundo.

O advogado explica que há uma série de determinações que proíbem o gestor de concentrar a carteira em algum setor ou papel, de operar alavancado, ou de vincular determinado investimento a votos em assembleia, além de incluir cláusulas de diligência definindo providências que o gestor deve tomar para não ser responsabilizado posteriormente por negligência.

“Saber se as regras foram cumpridas será a primeira discussão em casos de P/L negativo”, destaca o especialista. É preciso identificar se a reponsabilidade foi, ou não, do gestor em descumprimento das normas do fundo.

A identificação de valor dos ativos remanescentes, o que sobrou, será o segundo ponto a ser colocado na mesa. “Não é porque tem P/L  está negativo que basta fechar a porta. Você tem um valor remanescente, e o gestor será o responsável por levantar esse direito, esse valor, e monetizar tudo isso para distribuir entre os cotistas", afirma o advogado.

“Já tivemos casos no passado. O mais recente com alavancagem foi o do TT Global Equities, em que o fundo foi próximo de zero”, lembra o sócio da Nord Research. Esse fundo foi encerrado.

Existe a possibilidade, mas muito remota, de os ativos do fundo virarem pó, com perdas totais. “É muito incomum chegar a essa situação, é limítrofe”, considera Wirthmann.

Onde estão os riscos

Embora ‘extremamente raras’, essas situações podem acontecer por dois principais motivos: muitas operações com derivativos num contexto de mercado que vira contra as apostas do fundo, o que faz com que os derivativos aumentem muito as obrigações de pagamento do fundo, de modo a honrar tais derivativos; ou então quando o valor dos ativos cai de forma muito acentuada, com quebra de companhias, por exemplo, deixando as obrigações do fundo sem lastro para pagamento.

Nesse sentido, com os recentes casos de Americanas e Marisa, o advogado considera oportuno uma ampla discussão sobre a obrigatoriedade de registro de operações que resultem em dívidas financeiras da empresa, os financiamentos que ficam fora do balanço. “Ainda que exista algum critério para sigilo da operação, é importante que ela seja informada ao mercado, isso trará mais transparência e segurança principalmente aos Fidcs (fundos de crédito)”.

Procuradas, a e a Genial não retornaram até o fechamento desta reportagem.

Leia mais:

 

Sobre o autor
Regina PitosciaEditora do Portal Mais Retorno.