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mudanças climáticas
Economia

O poder desestabilizador das mudanças climáticas na economia

Haveria mais um choque de oferta capaz de desestabilizar economias?

Data de publicação:31/05/2022 às 00:30 -
Atualizado 2 anos atrás
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Desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, já se falava em uma guerra alimentar, onde cada país tentaria assegurar estoques para alimentar a sua população. Até então, o impacto das mudanças climáticas, que todos sentiram literalmente na pele na semana passada, não tinha entrado na conta.

Estaríamos agora diante de mais um choque de oferta, com potencial de desestabilizar economias mundo afora?

mudanças climáticas
Foto: Envato

Prato vazio

As mudanças climáticas não se concentram em uma única região, como é o caso de um conflito armado. 

Considerando outros países que também são grandes produtores de commodities agrícolas, a China atrasou o plantio de trigo no ano passado, dada a enxurrada resultante de um atípico regime de chuvas, o que comprometeu a safra. 

A Índia, por sua vez, enfrentou recentemente uma onda de calor enquanto parte da África lida com a estiagem mais severa em 40 anos. O que esses incidentes aparentemente isolados mostram é que esses cenários extremos podem se repetir, inclusive simultaneamente, diminuindo drasticamente a produtividade no campo.

Ainda que cada país possa contar com as suas relações de comércio para comprar parte do que não consegue suprir localmente, trata-se de um contexto bastante adverso, visto que a importação de energia (petróleo e gás natural) também ficou mais cara.

Desequilíbrio fiscal

Para manter o seu poder de compra no mercado internacional, boa parte das economias inevitavelmente apela para algumas medidas como elevar as suas taxas de juros, atraindo capitais do exterior, ou defender a sua moeda, utilizando-se de parte de suas reservas internacionais.

O problema é o custo, em termos de endividamento público, que cada uma delas paga quanto maior e mais prolongado for o choque de oferta, algo difícil de ser mensurar de antemão quando se trata de forças da natureza.

Menos biocombustíveis

Combustíveis alternativos, como é o caso do álcool no Brasil, sempre foram vistos como um trunfo contra choques de energia. 

Com quebras de safra se tornando mais recorrentes, seria o caso de se forçar a redução da produção de biocombustíveis por parte de empresas do setor, muitas das quais de capital aberto, para que as pessoas possam comer? 

A questão não é tão simples: mesmo que não haja problemas de fornecimento no mercado interno, os preços de outras commodities também sobem pelo efeito substituição. Na impossibilidade de se consumir trigo, por exemplo, opta-se pelo arroz.

Isso traz um outro dilema, igualmente importante: reduzir o que é destinado à ração animal, na tentativa de se formar estoques de segurança. O caso da Europa é ilustrativo: 40% do trigo plantado no continente são usados para alimentar vacas, que também produzem leite.

Ganância corporativa?

Prateleiras vazias acenderam o alerta junto às autoridades dos EUA. A escassez de leite em pó usado para alimentar bebês se devia inicialmente à paralisação de uma fábrica para que se averiguasse algumas denúncias de infecções.

Entre os fatores identificados na linha de produção, a falta de embalagens, a demora no recebimento de insumos importados e o quadro reduzido de funcionários. 

Desconsiderando os efeitos da covid-19, no mercado norte-americano especificamente, são poucas as empresas que atuam nesse mercado, parte por conta das exigências da Food and Drug Administration (FDA), parte por conta de como são regulamentados os programas sociais para famílias carentes.

Ainda assim, isso não impediu que a classe política explorasse a ganância corporativa como pretexto para a alta inflação (superior a 8%, em dólar). Como pode-se perceber, não existe o real interesse de se manter um mínimo de racionalidade no país que possui o maior mercado acionário do mundo.

Compensação

O mesmo ocorre com os mecanismos criados para a compensação do carbono lançado na atmosfera.  Apesar de promoverem projetos de energia renovável ou de reflorestamento, nem sempre seguem uma lógica econômica.

O mercado de carbono se baseia em dois modelos: regulado e voluntário. No mercado regulado, conhecido como “cap and trade”, as empresas podem poluir até um certo limite (cap), sendo possível ainda a negociação de suas permissões (trade).

O mercado baseado em compensações, por sua vez, é voluntário (não obrigatório). Iniciada a guerra na Ucrânia, a imagem corporativa ficou muito atrelada à presença física das companhias no território russo, jogando para escanteio a agenda verde (e qualquer valorização daquele ETF “fofinho” que promete salvar o planeta).   

Incentivos

Com o aumento do valor das commodities agrícolas, passou a ser mais vantajoso desmatar para o plantio do que manter a floresta. 

Ainda assim, quando os preços de insumos como fertilizante e combustível aumentam, os produtores elevam a demanda só até um certo ponto, dada a volatilidade que essas commodities podem enfrentar em situações climáticas atípicas, vis-à-vis o custo do financiamento, já mais alto, para se plantar.

Tal como ocorre no Brasil, via os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), muitas vezes esses recursos são captados junto a investidores, que não necessariamente estão cientes dos riscos.

Conclusão

A escassez decorrente da guerra na Ucrânia, seja por conta dos estoques que apodrecerão por falta de rotas logísticas viáveis, seja por conta da safra que deixará de ser plantada, mostra apenas um dos lados da fome no mundo.

Um total de 23 países já restringiu as suas exportações de alimentos, sendo que 80% da população mundial depende do comércio internacional para atender suas necessidades nutricionais mais básicas.

Isso torna mais difícil qualquer esforço de coordenação internacional no que diz respeito a alternativas para se escoar a produção da região da Ucrânia ou de formas de financiamento supranacionais para que países mantenham as suas importações.

A verdade é que qualquer plano mundial mais ambicioso só endereçará o problema no curto prazo. Um caminhão de dinheiro talvez não seja suficiente quando pouco se sabe sobre como lidar com as mudanças climáticas, com a natureza, cada vez mais perversa.

Isso explica porque tantos gestores têm optado por deixar recursos em caixa. Não há nada de errado em não se posicionar enquanto se assimila os impactos das mudanças climáticas. Entender essa dinâmica é o que diferencia os profissionais dos amadores.

Sobre o autor
Nohad Harati
Possui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.

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