Na semana, Bolsa cai 3,10% e dólar sobe 2,84%, com a PEC dos Precatórios no centro das preocupações
Cenário fiscal segue no radar dos investidores e afetando os mercados
Puxadas pela valorização do minério de ferro nos mercados internacionais, as ações da Vale e siderúrgicas tiveram um dia de forte alta, empurrando para cima a Bolsa de Valores, que fechou em alta de 0,59%, aos 103.035 pontos nesta sexta-feira, 19. No entanto, mesmo com o avanço registrado neste pregão, o Ibovespa derreteu ao longo da semana, com queda de 3,10%, chegando aos menores patamares registrados não só em 2021, mas desde o dia 6 de novembro.
Como pano de fundo para este recuo, estão as dificuldades para a PEC dos Precatórios, proposta do governo federal para liberar espaço para gastos no Orçamento de 2022, em avançar no Senado. Além disso, a piora nas projeções macroeconômicas do País, a queda no preço das commodities, o avanço da Covid-19 pela Europa e as expectativas quanto às decisões de política monetária nos Estados Unidos também estiveram no radar dos investidores, afetando os mercados.
Pelos mesmos motivos, que geram incertezas no mercado e levam o investidor a buscar ativos mais seguros para proteger seu patrimônio, o dólar viveu mais um pregão de alta e subiu 1,01%, cotado a R$ 5,61. Na semana, a valorização da moeda americana foi ainda mais expressiva: um avanço de 2,84% em comparação à última sexta-feira.
Cenário fiscal: "fatiando" a PEC
Em mais um capítulo da novela da PEC dos Precatórios, o relator da proposta no Senado, Fernando Bezerra, sugeriu que o texto seja "fatiado". Ou seja, que uma parte dele seja aprovada mais brevemente, a fim de haver tempo útil para o pagamento da parcela de R$ 400 do Auxílio Brasil ainda em dezembro, para, posteriormente, seja analisada uma "PEC paralela", que incorpore novas sugestões dos senadores, tanto na como no Senado, com o compromisso de uma votação rápida.
Entre as principais propostas dos parlamentares estão um "carimbo" que destina recursos da PEC para o Auxílio Brasil e a tentativa de evitar um descontrole de despesas em ano eleitoral, além de tornar permanente o programa de transferência de renda.
De acordo com Rafael Panonko, analista-chefe da Toro Investimentos, essa ideia de "fatiar" a proposta traz certo alívio ao mercado - já que sinaliza pelo menos um avanço da PEC no Senado -, em um ambiente fiscal que vem se deteriorando cada vez mais. Especialistas explicam que a aprovação da proposta é o cenário "menos pior", porque garante uma maior previsibilidade para os rumos fiscais do País.
Fernando Bezerra não descarta, porém, que o texto volte integralmente ao plenário da Câmara, para votar as alterações sugeridas pelos parlamentares.
A aprovação da proposta no Senado ainda parece ser muito incerta para o governo. Entre senadores governistas, circula uma tabela que indica 40 votos favoráveis e 13 possíveis – um cenário indefinido, diante da necessidade de apoio de, no mínimo, 49 congressistas.
O dia na Bolsa
Depois de uma derrocada ao longo da semana, chegando aos menores patamares desde novembro de 2020, o minério de ferro voltou a subir nesta sexta-feira, refletindo notícias positivas do setor imobiliário da China. Vale lembrar que o setor é um dos principais demandantes da commodity no mundo.
O analista da Clear Corretora, Rafael Ribeiro, comenta que o otimismo veio após o anúncio de que a Evergrande - gigante chinesa do setor imobiliário que enfrenta em uma crise financeira bilionária - retomou a construção de 63 projetos. Simultaneamente, "várias cidades chinesas, com Shangai e Nanjing, anunciaram detalhes de planos de vendas de terras em dezembro, revelando um aquecimento inesperado do setor", explica ele.
Nesse contexto, as empresas exportadoras de minério de ferro registraram um movimento de correção no pregão, após fortes quedas consecutivas. A Vale, que tem um peso de cerca de 14% na composição do Ibovespa, subiu 2,73%. Já a siderúrgica CSN disparou 7,98%, a maior alta da Bolsa no dia, enquanto Usiminas e Gerdau subiram 1,41% e 2,10%, na sequência.
Ainda no campo das commodities, a Petrobras fechou no vermelho por mais um dia, acompanhando a desvalorização do petróleo dos mercados internacionais. A estatal recuou 1,66% no pregão da Bolsa nesta sexta-feira.
A queda do petróleo, segundo especialistas, está relacionada a uma expectativa de redução na demanda, em decorrência da nova onda de Covid-19 na Europa. Alguns países, como a Áustria e a Alemanha, voltaram a adotar algumas medidas restritivas para evitar o avanço da doença, o que leva a uma redução das expectativas de crescimento econômico no continente.
Em contrapartida, outras empresas que também reportaram baixas na semana inverteram o movimento e fecharam no azul nesta sexta. É que os investidores aproveitam essas quedas acentuadas para comprar as ações a preços mais atrativos. Esse foi o caso com o Magazine Luiza, Grupo Soma e Banco Inter, por exemplo, que avançaram 3,11%, 4,95% e 4,78% no pregão da Bolsa, respectivamente.
Os papéis dessas companhias que estão bastante relacionadas ao consumo doméstico sentiram o impacto das sinalizações de deterioração do cenário econômico brasileiro. No começo da semana, o Ministério da Economia revisou suas projeções, elevando a inflação e a Selic e reduzindo as expectativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do País.
Novos passos do Federal Reserve
No cenário externo, os olhos dos investidores estão voltados aos próximos passos do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Mais cedo, falas de dirigentes regionais da instituição sinalizaram que os estímulos econômicos podem ser retirados de uma forma mais rápida do que o esperado pelo mercado, na tentativa, principalmente, de controlar a inflação.
Riberio explica que caso haja uma aceleração no programa de redução de estímulos seja acelerado, isso pode antecipar o ritmo de aumento de juros nos Estados Unidos - uma premissa já citada por Jerome Powell, presidente do Fed.
"O vice-presidente do banco central dos EUA, Richard Clarida, disse que 'pode muito bem ser apropriado' discutir a aceleração da redução das compras de ativos na reunião de dezembro, enquanto o diretor do Fed, Christopher Waller, recomendou dobar o ritmo de redução já na reunião de janeiro e encerrar o programa em abril", destaca o analista da Clear.
Somadas à cautela global crescente com o avanço da Covid-19 no continente europeu, as sinalizações feitas pelos membros do Fed aumentam a aversão à risco por parte dos investidores. Caso as taxas de juros americanas subam antes do esperado, os retornos oferecidos pelos títulos da dívida pública dos EUA também avançam, levando a uma saída dos investidores de investimentos menos seguros, como é o caso do mercado de ações.
Assim, as principais bolsas americanas fecharam majoritariamente em baixa nesta sexta-feira. Os índices S&P 500 e Dow Jones recuaram 0,14% e 0,75%, respectivamente. O Nasdaq 100 foi o único a apresentar alta, com variação positiva de 0,55%.