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efeito taxa de juros
Economia

Efeito do diferencial de juros e a taxa de câmbio

Quem diria que a nossa taxa de câmbio superaria facilmente os R$/US$ 5,00? Claro, a situação fiscal brasileira não era exatamente a melhor possível, mas estávamos…

Data de publicação:21/04/2020 às 09:00 -
Atualizado 4 anos atrás
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Quem diria que a nossa taxa de câmbio superaria facilmente os R$/US$ 5,00? Claro, a situação fiscal brasileira não era exatamente a melhor possível, mas estávamos caminhando para um cenário melhor, não? 

Um meteoro caiu no nosso ecossistema e balançou as moedas do mundo inteiro, em especial a brasileira. 

Não por acaso, assim como vários outros emergentes, estávamos assistindo uma boa redução do nosso risco-país, mensurado pelo famoso CDS (se não conhece, vale a pena ler nosso artigo sobre o assunto), que atingiu 500 pontos em dezembro de 2015 e chegou a bater 92 pontos em fevereiro deste ano (quanto menor, melhor). 

Bons tempos...

E o dólar no meio disso tudo?

Provavelmente você já percebeu, mas a nossa taxa de câmbio reflete bastante o comportamento dessa leitura de risco, mas não apenas isso. Pense como investidor que pode acessar o mercado de vários países diferentes. 

Para você optar por investir no Brasil e não nos EUA, com toda a volatilidade dos ânimos políticos e econômicos do nosso país, só pagando um prêmio de risco maior, certo? 

Esse prêmio de risco geralmente pode ser sumarizado na diferença entre taxas de juros.

Pois é, agora imagine se esse cenário maluco não mudasse, mas esse prêmio de risco começasse a cair? Ai a coisa fica mais difícil para esse investidor.

Por isso, um dos fatores de maior relevância para a taxa de câmbio nos últimos anos tem sido o diferencial entre a taxa de juros doméstica e externa (aqui vamos tratar especificamente do caso americano). 

De forma resumida, quanto maior a diferença entre o retorno dos títulos brasileiros frente aos títulos americanos, maior tende a ser o fluxo de capitais para o país, resultando em apreciação da moeda. 

Bem, você pode imaginar que quanto menor esse diferencial, temos o efeito contrário.

Algumas implicações desse cenário de juros

Essa tem sido uma grande preocupação nas últimas semanas envolvendo a política monetária do Banco Central. 

Há um certo temor por parte de nossa autoridade monetária em que reduções adicionais dos juros, que por sua vez vão diminuir esse prêmio de risco para o investidor, pode afugentar capital e fazer a nossa moeda perder ainda mais valor.

Também há uma discussão fiscal, envolvendo a curva de juros, mas não vou entrar nesses detalhes. Fiquemos apenas no caso da taxa de câmbio.

Um efeito que pode ser indesejável quando a moeda desvaloriza é algum repique na inflação, reflexo do aumento dos custos de algumas empresas. Faz sentido, não?

Pois é, mas esse não parece ser o caso atual, visto que esse repasse de custos é mais difícil em tempos de crise. Se já está difícil vender, imagina aumentando os preços?

Isso sempre foi uma preocupação, mas era tratada de forma diferente em gestões anteriores. Se você perguntar para um economista que lida com política monetária, provavelmente ele vai te dizer que o Banco Central “endogeinizou” demais o câmbio para o seu modelo.

Eu sei, o termo é estranhíssimo, mas no bom português quer dizer que o Banco Central tem colocado muito mais peso na taxa de câmbio para sua política monetária do que o usual.

Mas quais os efeitos desse diferencial de juro no câmbio? Vamos discutir um pouco mais e comentar os impactos das movimentações da taxa de câmbio na vida do investidor.

O modelo para a taxa de câmbio brasileira

Tentar estimar um modelo para a taxa de câmbio brasileira é um dos trabalhos mais árduos que os economistas enfrentam. 

Buscando pegar atalho na experiência de outros aventureiros, selecionei algumas variáveis que podem influenciar e ter relação com o nosso câmbio.

Antes de mais nada, vale a pena olharmos como a taxa de câmbio já estava se depreciando mesmo antes da crise atual, oportunamente acompanhando a constante queda do diferencial de juros (BR x USA) desde 2017.

Para tentar entender melhor essa relação, podemos listar as variáveis do nosso modelo de frequência diária: i) o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos; ii) o próprio CDS já citado; iii) o índice VIX (controlando os ânimos dos mercados); iv) alguns componentes e testes estatísticos que acabariam aborrecendo você se eu tentasse explicar.  

Abaixo temos a evolução da taxa de câmbio efetiva e aquela estimada pelo nosso modelo. Não é perfeito, mas tem um comportamento histórico relativamente próximo, pelo menos o bastante para tirarmos insights.

Segundo os resultados, e aqui pode ser a informação mais importante, um aumento de 10% no diferencial de juros pode gerar uma apreciação de 5% na relação R$ por US$. 

Você também pode ler de outra forma: uma redução em 10% desse diferencial de juro (situação que estamos vivendo) pode ter efeito de pelo menos 5,1% na depreciação da nossa moeda.

O risco também tem um papel importante: um aumento em 10% no CDS pode gerar uma depreciação da nossa moeda de 4,9%.

Aproveitando que temos um modelo, vamos traçar um cenário

Com esse modelo em mãos, podemos inclusive tomar coragem e elaborar alguns cenários para o futuro da taxa de câmbio. Para fazer isso, é necessário antes ter números para o diferencial, o CDS e o VIX para os próximos meses.

A primeira coisa é pegar as projeções para as taxas de juro feitas pelo mercado para o Brasil e para os Estados Unidos. Com isso já temos o diferencial de juro esperado, certo? 

O diferencial pouco muda no cenário, pois não está considerando nenhuma valentia adicional do Banco Central. Um corte adicional de 50 bp, levando o juro para 3,25% até o fim de 2020.

Segundo, precisamos de algum cenário para o VIX. Por conveniência, vou assumir que até o final do ano o índice vai normalizar e encaminhar para os 20 pontos. 

Provavelmente volte até antes, por conta da normalização das nossas vidas, mas ainda temos eleição na Casa Branca nesse ano, então, né? Nunca se sabe.

Por fim, para o risco-país representado pelo CDS vou aproveitar para fazer 3 cenários: 

  1. Um em que ele cai para a metade do nível atual, próximo de 150 pontos e pouco acima do início do ano (os tais 100 pontos); 
  2. outro em que ele evolui diariamente no mesmo ritmo em que evoluiu desde 2017 (o que resulta num CDS próximo de 350); 
  3. E por fim, um cenário médio entre os dois. 

Desta forma, teríamos as seguintes taxas de câmbio em cada cenário: R$/US$ 5,53 no cenário em que o CDS avança na taxa média entre 2017 e 2020; R$/US$ 3,90 no cenário em que o risco-país cai bastante e; R$/US$ 4,74 no cenário considerado intermediário. 

Particularmente esse último me parece um número mais interessante (os R$/US$ 4,74), lembrando que a mediana do mercado, representado no boletim Focus, está em R$/US$ 4,60 para o final de 2020 (no dia 13/04/2020).

Os cenários apresentados servem para o leitor monitorar o movimento do câmbio, mas cuidado para levar os números ao pé da letra. Dentro o mundo dos economistas, temos algumas máximas que justamente refletem a dificuldade em se prever o câmbio. 

Uma delas é que “o melhor preditor do câmbio amanhã é o câmbio de hoje”, ironicamente para nos lembrarmos das limitações dos nossos próprios modelos.

E o investidor neste cenário dos juros baixos?

Como já ressaltado anteriormente, a taxa de câmbio é um dos preços mais importantes de qualquer economia, sendo balizador para diversas situações, podendo impactar diretamente na vida do investidor.

Primeiramente devemos lembrar que a nossa Bolsa de Valores conta com diversas empresas exportadoras e a desvalorização cambial por tempo prolongado pode ter efeito especialmente positivo na performance dessas empresas, sobretudo nos novos contratos. 

Geralmente o câmbio se desvaloriza em tempos difíceis, então é bom ter na mira empresas que sintam esse movimento como um vento um pouco mais favorável, não? 

Óbvio, é importante que a demanda mundial também ajude, o que pode ser um limitante no curtíssimo prazo.

Além disso, vale notar que o investidor estrangeiro, que tem forte presença na nossa bolsa, precisa levar a taxa de câmbio em consideração na hora de investir.

Isso vale tanto para a sua entrada (sua grana valer mais), quanto na saída. 

O nível do câmbio e sua perspectiva de valorização ou desvalorização pode, no limite, impactar bastante o volume de negociações por parte dos nossos amigos gringos.

Há um ponto também em relação a remessas de lucros. Olhando o nosso balanço de pagamentos, é possível ver que movimento ascendentes do câmbio tendem a reduzir o volume de remessas de lucros ao exterior. 

A grana acaba ficando em parte por estas terras, o que pode inclusive se transformar em reinvestimentos e novos projetos. 

Ah, claro, não dá para esquecer o próprio dólar é uma ativo negociável, inclusive podendo ser instrumento de hedge para alguns. 

Por fim, o movimento do dólar impacta também a performance de ETFs como o caso da IVVB, que replica o S&P 500 e reflete também um pouco da variação do dólar. O investidor que tem uma carteira diversificada e optar por essa ETF também deve acompanhar o cenário para a taxa de câmbio.

Conclusão

O diferencial de juros entre o nosso mercado e o americano tem sido um importante para a determinação da taxa de câmbio brasileira, e desta forma, a continua redução desse diferencial para patamares menores nos sugere que a nossa moeda deve continuar por mais tempo nesse patamar depreciado.

Talvez seja a hora de adiar algumas viagens e aproveitar os recursos para avaliar ativos que se beneficiam do câmbio num patamar superior, como caso de empresas exportadoras ou aquelas que não tem sua situação financeira negativamente afetada pela desvalorização.

Dependendo de qual direção o câmbio vai, essas empresas são afetadas em qualquer uma das pontas que elas fazem negócio, seja importando produtos que ficaram mais caros (ou baratos) ou vendendo produtos que agora estão mais caros (ou baratos), influenciando diretamente as expectativas dos analistas de mercado em relação a empresa e, por último, impactando o preço de suas ações.

Sobre o autor
Arthur Lula Mota
Economista, já atuou no mercado financeiro e em departamento econômico, com elaboração de cenários macroeconômicos e estudos setoriais. Atualmente é Mestrando em Economia pela Universidade de São Paulo (USP) e dono de um dos maiores sites independentes de economia no Brasil – o Terraço Econômico.
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