Logo Mais Retorno

Siga nossas redes

  • Instagram Mais Retorno
  • Youtube Mais Retorno
  • Twitter Mais Retorno
  • Facebook Mais Retorno
  • Tiktok Mais Retorno
  • Linkedin Mais Retorno
Andrea Damico
Economia

‘BC avaliou mal choque de commodity e vai romper meta de inflação’, diz economista

O Banco Central, que ontem elevou a taxa básica de juros para 3,50% ao ano, deverá furar o teto da meta da inflação estipulada para este…

Data de publicação:06/05/2021 às 12:08 -
Atualizado 4 anos atrás
Compartilhe:

O Banco Central, que ontem elevou a taxa básica de juros para 3,50% ao ano, deverá furar o teto da meta da inflação estipulada para este ano. A previsão é da economista-chefe da gestora Armor Capital, Andrea Damico.

Para a especialista, que foi por 16 anos economista sênior do Bradesco, o reajuste da Selic em 0,75% foi correto na proporção, embora tenha chegado atrasado.

Andrea Damico
Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital

"(O BC) demorou um pouco para perceber que a inflação era mais persistente", avalia. Eles enxergaram bem antes a alta dos preços das commodities lá fora, mas não conseguiram fazer o link com a inflação aqui dentro", diz Andrea, que projeta o IPCA, o indicador oficial para os preços no Brasil, em 5,30% ao final do ano, acima do teto da meta do BC para 2021, em 5,25%.

"Por tudo isso, acho que o Banco não vai parar (o aumento da taxa de juros) em 5% ao ano. Ele vai para os 6,5% em 2022", diz.

Confira a entrevista abaixo

Mais Retorno: Como a senhora recebeu a alta da Selic de 2,75% ano para 3,50% ao ano? A recalibragem da taxa de juros, em sua opinião, foi acertada?

Andrea Damico: Sim, acho que foi acertada. Os 0,75 não tem nem muita dúvida, acho que ninguém esperava nada muito diferente disso.

MR: E como avaliou o tom do comunicado?

Andrea: O BC sinalizou mais 75 pontos na próxima reunião. A comunicação dúbia, no entanto, provavelmente impedirá ganhos completos na ancoragem das expectativas. O trecho sobre a normalização parcial foi mantido, por ser adequada “a manutenção de algum estímulo monetário ao longo do processo de recuperação econômica”, segundo o BCB. Porém, o trecho veio com um novo um “adereço”: neste momento, o que pode sinalizar uma futura queda do ajuste “parcial”.

Além disso, o comitê enfatiza “que não há compromisso com essa posição e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação”. Esse já é um trecho dúbio, não sei se por, eventualmente, tentar adequar visões distintas dentro do comitê (alguns querendo tirar o parcial e outros não). Talvez na ata fique mais claro, mas dá a impressão que querem fazer menos juros por conta da atividade, porém apenas se inflação permitir. Mas, se metas de inflação forem colocadas em cheque, irão para o ajuste completo.

MR: Essa crise política, que tem na CPI da Covid um novo capítulo, teve alguma influência na decisão do Copom?

Andrea: Não acredito. O câmbio hoje até está mais apreciado do que na última reunião, em março, quando o dólar estava em R$ 5,70. Essa apreciação cambial de hoje mostra que, por mais que a gente do mercado tenha essa CPI no radar, bem ou mal a questão orçamentária teve alguma pacificação para a economia. Não foi a melhor solução possível a encontrada para o Orçamento, acho que nem a segunda melhor possível (risos). Mas tivemos alguma solução e no final da história os contingenciamentos foram até razoáveis. Isso apesar dos gastos extra ficarem muito maiores do que imaginávamos.

MR: Para a próxima reunião, a senhora vê que o ambiente político pode trazer impactos maiores?

Andrea: O risco existe. Mas o risco fiscal, que era não ter um Orçamento federal ou eventualmente ter que acionar um dispositivo de estado de calamidade pública, isso tudo perdeu um pouco de probabilidade ao longo desses 45 dias (entre a penúltima reunião do Copom, de março, e a última, ontem). Mesmo o fato de você ter aumentado as despesas extras, além do teto… Isso foi ruim, mas diminuiu a probabilidade do estado de calamidade pública.

Talvez a melhor forma de dizer seja: o risco político aumentou, mas o risco fiscal está um pouquinho melhor, porque temos um Orçamento. E isso acabou com o cenário externo de alta de commodities, que está contribuindo mais favoravelmente para a apreciação do real.

MR: Por falar nisso, estamos vivendo esse super ciclo de commodities que, tradicionalmente, favorece moedas de países emergentes, em especial o real, já que o Brasil é grande exportador. Andrea: Até pouco tempo, no entanto, essa equação não vinha favorecendo muito o real, que começou as reagir bem em abril. A senhora vê pressão do câmbio sobre a taxa de juros para o médio prazo?

Andrea: As commodities estão 5% mais elevadas em reais, exatamente porque, apesar da apreciação cambial, o preço das commodities subiu muito. O preço da soja subiu 11% da última reunião do Copom, em março, para esta, agora. E o câmbio apreciou 2% no período. Então, teoricamente, O BC deve subir a expectativa de inflação para este ano, e subir a taxa de juros entre 20 e 30 pontos base para acomodar esse choque que houve das commodities.

MR: Qual patamar para a Selic no final do ano? E para 2022?

Andrea: O BC não vai parar nos 5% ao ano (no final do ciclo de alta da taxa Selic, em 2022). Ele (o BC) vai para os 6,5% ao ano. Essa é um pouco a nossa visão. A gente, aqui na empresa, acha que o BC estará com 6% ao ano, até o final de 2021, e chegará a 6,5% ao ano na primeira reunião de 2022.

MR: E por quê o BC não foi, então, mais agressivo ontem? Muita gente queria uma alta de 1%…

Andrea: Talvez o mais correto fosse elevar para agora esses 100 pontos mesmo. Qual seria, em minha visão, a razão para isso não ter acontecido? Embora o efeito máximo desse aumento de 100 pontos fosse observado somente no começo de 2022, seria uma forma do BC ajudar (a esquentar a economia) em 2021. Em nossa visão, o BC irá romper a meta da inflação neste ano de 2021.

MR: É mesmo?

Andrea: Sim. O câmbio tem atrapalhado muito a análise da inflação, por essa dinâmica do preço de commodity. A gente viu que mesmo o real apreciando um pouco ao longo de abril, não foi o suficiente para zerar o impacto do ponto de vista dos preços dos insumos em reais. Então, eu acho que o fato de estarmos vendo um câmbio abaixo dos R$ 5,50, até um pouco abaixo dos R$ 5,40, vai um pouco contra a gente ter uma alta de 100 pontos na taxa de juros, embora tenham razões para isso, como a persistência da inflação.

O núcleo da inflação, embora tenha cedido um pouco na margem no último dado do IPCA, ainda é incompatível com a meta. Os preços industriais, os IGPs desaceleraram, mas o núcleo dos IGPs continua muito elevado, acima dos 3%. A gente não viu o final do choque dos preços das commodities na economia. Esse é o ponto. A gente está achando que esse choque acabou desde o fim do ano passado. Mas aí veio janeiro… Agora, o minério está chegando a US$ 200 dólares. Isso é algo impensável. Nossa projeção para inflação neste ano é de 5,30%, sendo que o teto da meta é 5,25%.

MR: Como a senhora, então, avalia o desempenho do BC neste ano e desde o início da escalada dessa crise sanitária?

Andrea: Eu acho que o BC, desde a penúltima reunião, tem se comunicado e atuado de forma adequada, mas demorou um pouco para perceber que a inflação era mais persistente. O BC insistia nisso quando colocava que o choque era temporário. Desde a penúltima reunião, portanto, ele tem atuado de uma forma bem adequada, mas em reuniões anteriores a gente já tinha elementos para dizer que o choque já não eram tão temporários assim, que eram mais persistentes, e que existiam núcleos mais pressionados. O próprio BC cita que desde setembro ou outubro ele se comunicava com outros BCs sobre o reflation trade. Só que aqui eles mantiveram o forward guidance na reunião de dezembro. Então, acho que o BC enxergou bem antes a alta das commodities lá fora, mas não conseguiu fazer o link com a inflação aqui dentro.

Sobre o autor
Renato Jakitas
Editor-chefe do Portal Mais Retorno.