Quebra dos bancos americanos e crise no Credit Suisse podem causar efeito dominó? Especialistas opinam
A expectativa é de desdobramentos em bancos americanos e europeus; no Brasil, a crise deve provocar queda dos ativos e alta do dólar
A liquidação de dois bancos americanos, o Silicon Valley Bank (SVB) e o Signature Bank, e o novo capítulo das dificuldades enfrentadas do Credit Suisse nessa última semana têm levado especialistas do mercado a prever e esperar por desdobramentos desastrosos no setor financeiro tanto nos Estados Unidos como na Europa.
As consequências podem bater aqui não pela exposição direta a esses bancos, mas de uma outra forma, pela alta do dólar e, por tabela, da inflação, ou por maior desvalorização da bolsa. O mercado já vem precificando a crença e o temor de que pode haver um a contaminação efeito no sistema financeiro mundial, como ressaltou Larry Fink, CEO da BlackRock, em carta anual aos investidores: “Mais dominós cairão”.
Por que os bancos dos EUA quebraram
A quebra do SVB e do Signature Bank nos EUA, embora tenha havido ação-relâmpago do Federal Reserve, banco central americano, para garantir depósitos, pode atingir outros bancos. Não necessariamente pelo tamanho ou exposição a eles, o SVB é relevante mas não é dos maiores, e sim porque deve piorar a situação de outras instiuições financeiras que, segundo Bruce Barbosa, sócio-fundador da Nord Research, estão cometendo o mesmo erro dos dois bancos em sua gestão.
“Bancos médios vão ter o mesmo problema”, diz ele, explicando que os dois bancos captaram dinheiro de clientes com remuneração dos fed funds (uma espécie de CDI do mercado americano) e investiram em títulos longos. Com a alta dos juros pelo Fed, desde o ano passado, a dívida desses bancos cresceu enquanto o rendimento dos títulos diminui, porque as taxas dos títulos longos são fixas e não acompanham o comportamento da taxa básica americana.
Barbosa não se conforma que haja bancos derrapando em erros básicos: “O SVB fez algo que todo banco sabe que deve evitar, por ser superarriscado, e eles fizeram mesmo assim. É um amadorismo tremendo, até a falta de regulação, um negócio inacreditável que aconteça em 2023”.
Ao que tudo indica há outros motivos que levaram o Silicon Valley Bank, o banco de financiamento das startups, a ter problemas de liquidez e quebrar. “É um banco que trabalhava com nível de diligência baixo, estava correndo muito risco, não foi à toa que quebrou”, pontua Rafael Schmidt, operador de renda variável da One Investimentos.
Para Rodrigo Cohen, analista CNPI e co-fundador da Escola de Investimentos, empresa de educação financeira, a falência dos dois bancos americanos e a deterioração financeira do Credit Suisse não são casos isolados. “Nesse momento, o sistema financeiro enfrenta dificuldades, não que o mundo vá acabar, mas a situação é complicada”.
Quando um banco demonstra fragilidade, e outros fazem o mesmo na sequência, há uma fuga de capitais dos investimentos de alto risco, lembra Cohen, ressaltando que o SVB e o Signature tiveram de vender seus ativos a preços bem mais baixos para poder cobrir os saques diante das dificuldades com a liquidez. “O Fed tem bala na agulha para poder ajudar os bancos, mas se isso começar a acontecer no mundo inteiro, não há Fed que resolva”.
Escala de preocupações
Já a crise no Credit Suisse ganha outra dimensão na escala de preocupações do mercado. "É um grande player, e tendo problema de insolvência pode acarretar um efeito dominó, não é o caso no momento", afirma Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos. A crise no banco suíço, com seus problemas de liquidez, já vinha se desenrolando há algum tempo, destaca o especialista, e pelo tamanho do banco, isso acaba trazendo um certo receio, porque o sistema financeiro está todo interligado.
Rafael Schmidt, da One, destaca que, além dos dados fracos do balanço, ajudaram a complicar a situação do Credit as declarações do presidente do Saudi National Bank, um dos principais acionistas do banco, Ammar Al Khudairy, que não investiria mais no banco. Depois disso, as negociações com ações do banco tiveram de ser supensas, e o papel fechou com queda de 24% nesta quarta-feira, 15.
“A gente não sabe de fato o tamanho da exposição dos bancos europeus aos Credit Suisse, mas o Banco Central Europeu contatou alguns bancos para questionar sobre essa exposição”. Por conta isso, o mercado já precifica um risco muito alto, segundo Schmidt.
As ações do Credit Suisse vêm caindo desde 2008, relata Bruce Barbosa, desde que o banco apresenta dificuldades na geração de lucros. “Outros bancos europeus estão com o mesmo problema. A Europa como não cresce há bastante tempo tem os juros muito baixos, o que traz dificuldades para rentabilizar o capital. Com o Deutsch acontece o mesmo, as ações vêm caindo desde meados de 2007 e 2008".
Reflexos no Brasil
Esse contexto elevou o estresse nos mercados, incluindo o Brasil. Luives não acredita que haja correlação direta entre os bancos digitais daqui e os bancos falidos dos EUA. Para ele, as repercussões serão mais sentidas nos ativos financeiros, bolsa e fundos imobiliários. Além disso, um movimento de aversão ao risco pode fazer o dólar subir aqui, pressionando os preços dos produtos importados e a inflação. Efeitos que chegam ao consumidor de um forma geral.
“Eu não acho que vá ter um contágio, os bancos no País são muito melhor geridos que lá fora. Tem uma regulação muito maior e o sistema é mais sólido. Não imagino que a gente não tenha problemas desse nível aqui no Brasil, acho difícil", opina Barbosa, da Nord.
A percepção de Cohen, da Escola de Investimentos, é a de que “aqui no Brasil estamos numa situação diferente porque começamos a subir os juros antes, e os bancos digitais já divulgaram que não têm dinheiro investido nos bancos que deram problema lá fora”. A recomendação dele para esse momento de tensão e incertezas é a diversificação, com uma carteira mais imune a essas adversidades, e o planejamento financeiro. O investidor precisa manter a calma e agir de acordo com seus seu perfil de risco, conhecimento, e prazo que vai precisar mexer no dinheiro.