PIB: analistas revisam projeções para o crescimento da economia após dados do 2° trimestre
O resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, divulgado nesta terça-feira, 1, pelo IBGE, ficou negativo em 0,1%. Embora abaixo das expectativas do mercado,…
O resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, divulgado nesta terça-feira, 1, pelo IBGE, ficou negativo em 0,1%. Embora abaixo das expectativas do mercado, que esperava avanço marginal de 0,2%, os números do PIB não impactaram radicalmente as projeções dos analistas das principais instituições financeiras, que seguem com perspectivas de crescimento para a economia brasileira nos próximos semestres.
Alguns analistas, no entanto, apresentam uma visão futura um pouco mais cautelosa e já é possível encontrar quem considere que o País está entrando num período de estagflação.
Destaques do PIB do segundo trimestre para os especialistas
De acordo com Alexandre Almeida, economista da CM Capital, apesar do resultado do PIB ter vindo abaixo da mediana das expectativas do mercado, a maior surpresa ficou por conta da composição dessa queda trimestral. Rachel Sá, chefe de economia da Rico, compartilha da mesma opinião.
"O resultado acabou frustrando as expectativas dos analistas de mercado, especialmente por conta do consumo das famílias abaixo do esperado e do fraco desempenho dos setores industrial e agrícola. A inflação pressionada se torna um verdadeiro vilão no momento atual, pesando tanto sobre o poder de compra dos consumidores, quanto sobre os custos de matérias primas para produtores", explica Rachel.
Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, os dados do consumo das famílias, que ficou no zero a zero, pode ser explicado pelo atual momento do mercado de trabalho brasileiro. "Mesmo com o auxílio que foi renovado pelo governo, o mercado de trabalho ainda está muito fraco e as pessoas começaram a ter medo de perder seus empregos. Por isso, elas passaram a segurar mais suas contas", diz Cruz.
Almeida destaca ainda que o consumo das famílias é uma das variáveis mais importantes sob a ótica da demanda. Para o economista, o que vem sustentando o PIB de 2021 é o consumo do governo e o saldo comercial, "porém essas variáveis já não são suficientes para projetar um crescimento positivo da atividade econômica."
O time de economistas do BTG Pactual Digital comenta que já esperava um recuo nos números do agronegócio (que caiu 2,8%) e na Formação Bruta de Capital Fixo (que caiu 3,6%). Entretanto "essa queda se mostrou mais expressiva do que o antecipado".
O destaque positivo do trimestre ficou por conta do setor de serviços, que apresentou alta de 0,7%. O consenso entre os analistas é que esse crescimento veio em linha com o esperado, acompanhando o avanço da vacinação pelo País e o fim das medidas restritivas de mobilidade.
A chefe de economia da Rico ressalta também que "a indústria extrativa segue com crescimento robusto, assim como a de construção civil e as exportações, ainda na esteira da demanda aquecida e commodities em alta nos mercados internacionais".
Projeções positivas para os próximos resultados do PIB
Apesar do resultado abaixo do esperado, a maioria dos especialistas espera recuperação do PIB ao longo do segundo semestre, puxado sobretudo pela retomada do setor de serviços. No entanto, as expectativas são um pouco mais modestas do que anteriormente, principalmente para os números do próximo ano.
Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, considera que essa recuperação do PIB será impulsionada, além das perspectivas de crescimento nos serviços prestados às famílias, pela normalização gradual dos serviços públicos. "Por ora, antevemos que o PIB Total crescerá 0,7% no terceiro trimestre (em comparação ao anterior). Assim, atribuímos somente um ligeiro viés de baixa a nossa projeção atual de expansão de 5,5% para o PIB de 2021", explica.
Em relação aos números de 2022, Margato diz que a expectativa corrente da XP consiste em elevação de 2,3%, "levando em consideração um efeito de carrego estatístico próximo a 1,0% deixado pelo PIB de 2021".
Na mesma esteira de visão futura positiva, Gustavo Cruz, afirma que muitas áreas do setor de serviços ainda estão completamente paradas ou começando a reabrir agora. "O segmento de eventos, por exemplo, movimentava cerca de R$ 200 milhões antes da pandemia e ainda está sendo impactado", diz o estrategista da RB Investimentos.
Dessa forma, Cruz enxerga boas perspectivas futuras para a economia brasileiras com o avanço da vacinação e uma reabertura econômica mais ampla e saudável. "Fora que esses setores movimentam cerca de 2 e 3 milhões de postos de trabalho", destaca, o que deve contribuir para uma elevação no consumo das famílias.
"O Brasil ultrapassou os EUA em número de vacinação na semana passada, tem tudo para passar alguns países da Europa que começaram bem antes a vacinação e isso é um grande diferencial para o Brasil", comenta o estrategista. Para ele, esse diferencial será importante para o PIB dos próximos semestres, pois reduz as chances da adoção de novas medidas restritivas, favorecendo a retomada econômica.
Cautela com a desaceleração do crescimento
Alguns analistas, porém, apresentam uma visão mais cautelosa. Para André Perfeito, da Necton, o crescimento do Brasil está é em "raiz quadrada", ou seja, de lado, sem componentes dinâmicos mais evidentes na última divulgação. O especialista considera que os desafios são grandes para este ano e o ano que vem e destaca quatro riscos principais.
- Elevação da Selic
- Inflação ao produtor muito acima da inflação ao consumidor, o que tende a diminuir as margens de lucro e, por conseguinte, o investimento
- Crise hídrica, que afeta a inflação e o agronegócio, sem contar o custo da energia elétrica
- Tensão política que cobra um prêmio de risco ao longo da curva de juros
"Por uma série de fatores, podemos imaginar um crescimento mais modesto, reafirmando nossas projeções do PIB em 2021 em 5% e o de 2022 entre 1,8% e 2%", afirma André Perfeito.
Para Rachel Sá, da Rico, os movimentos negativos, atualmente, são "muito mais levados por discussões de cunho fiscal e político". O diretor de pesquisas para América Latina do BNP Paribas, Gustavo Arruda, ressalta também que o risco hídrico pode levar ao racionamento de energia, "mas, por enquanto, não faz sentido adicionar isso no cenário base".
Arruda considera que o resultado do PIB no terceiro trimestre deve ser "bem mais forte, tendo um número mais próximo de 1%". No entanto, se as perspectivas de racionamento se concretizarem, os números, principalmente para o ano que vem, devem cair do patamar de 2% para 1,5% de crescimento.
Simultaneamente, o economista da CM Capital, Alexandre Almeida, afirma que os dados sobre o consumo das famílias do segundo trimestre, "num ambiente inflacionário bastante preocupante, acaba lançando uma sombra encima do que esperar para as próximas divulgações do PIB em 2021".
Estagflação
De acordo com Alexandre Lohmann, economista da Constância Investimentos, os atuais números do PIB não apenas são uma má notícia, como também indicam que o contexto atual é de estagflação (estagnação e inflação) no País. "O Brasil vai entrar num quadro de crescimento baixo e de inflação elevada", afirma.
Lohmann considera, ainda, que a inflação não é um fenômeno transitório aqui. A crise hídrica terá repercussão também no próximo ano e os preços de 2022 devem ser reajustados com base na escalada da inflação de 2021, explica o especialista. "No Brasil, uma inflação alta em um ano tende a se transmitir ao ano seguinte, via uma deterioração das expectativas".
Frente à mesma base comparativa de 2020, o PIB cresceu 12,4%. Para o economista, essa comparação "não faz muito sentido", porque o número reflete mais "o trimestre catastrófico da primeira onda de covid-19 no ano passado" do que realmente uma recuperação acentuada.