Mercado Financeiro

Onde investir com a Taxa Selic a 5%?

O nível da taxa de juros não é uma preocupação apenas dos investidores brasileiros. Um pouco de contexto nessa introdução ajuda a entender, primeiro, como chegamos…

Data de publicação:24/09/2019 às 09:41 - Atualizado 4 anos atrás
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O nível da taxa de juros não é uma preocupação apenas dos investidores brasileiros.

Um pouco de contexto nessa introdução ajuda a entender, primeiro, como chegamos nesse ponto e, segundo, quais as implicações de anos de taxas de juros baixas.

Olhando para o que está acontecendo lá fora, a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, com as suas idas e vindas, além do pouco crescimento da zona do Euro, indicam que as taxas de juros no exterior alcançaram as máximas, mesmo sendo tão “mínimas”.

Os juros norte-americanos nos dão um bom exemplo. Hoje na faixa entre 2,00% e 2,25% e, contemplando uma meta de inflação de 2% ao ano, o juro real (acima da inflação) é risível, para dizer o mínimo: apenas 0,25% ao ano.

A título de ilustração, há não mais do que 19 anos atrás, o juro real (lembrando, acima da inflação) nos Estados Unidos era de 4%!

Formar riqueza ficou muito mais difícil. Portanto, viver de renda, como tantos sites promovem por aí, vai ser praticamente impossível. Diante dessa realidade, resta a todos nós:

  • Trabalhar por mais tempo;
  • Criar uma reserva mais robusta;
  • Investir em novas opções.

Esses são os caminhos para se evitar problemas mais à frente.

A Selic vai baixar ainda mais?

Tudo indica que sim.

O motivo é que a condução da política fiscal mudou. Até alguns anos atrás, o governo gastava mais e o Banco Central, para compensar, tinha que manter os juros mais altos para cumprir a meta de inflação. Era mais ou menos como tentar acelerar com um pé enquanto se freia com o outro.

Hoje, com o teto de gastos e outras formas de controle das despesas do governo, o trabalho do BC é olhar os outros componentes da economia: capacidade ociosa e taxa de desemprego. Ambos estão bem abaixo do que seria o normal. Isso dá condições para que o Comitê de Política Monetária (Copom) continue baixando os juros.

Não porque um banqueiro central é bonzinho, mas porque sua credibilidade depende disso. Ninguém quer ter de escrever a carta para o Paulo Guedes explicando os motivos do não cumprimento da meta de inflação.

Como se adaptar?

Com a Selic a 6%, nosso juro real já era de apenas 1,63%. Com o novo valor de 5%, o juro real já foi para 0,92%!

Não se trata de uma situação trivial. Imagine alguém que tenha uma carteira de investimentos de R$ 10 milhões. Se essa pessoa não quiser perder o seu poder de compra ao longo do tempo, sua retirada anual não poderá ser superior a R$ 163 mil. Isso é algo em torno de R$ 13.580 por mês.

Percebe-se então que alguns ajustes serão necessários, até mesmo para quem, em princípio, não deveria se preocupar. Considerando que esse ambiente de baixas taxas pode perdurar, e a taxa básica cair ainda mais, o jeito é adotar novos hábitos, aos poucos.

Esse processo precisa ocorrer de forma gradativa. Nem pense em tentar fazer tudo de uma vez, pois medidas muito drásticas não duram por muito tempo. A simplicidade e bom senso devem prevalecer.

Caso ainda não use o recurso da aplicação automática para a sua reserva de emergência, esse é o momento de ativa-lo. Mais importante do que escolher o fundo mais agressivo para “tentar tirar a diferença”, a intenção aqui é se disciplinar.

Rever o seu orçamento também é fundamental para aumentar o valor que você guarda mensalmente. Com o tempo tão escasso, você faz uso de todas as opções de entretenimento que paga? Consegue usufruir de forma satisfatória? Se a resposta é “não”, você já sabe o que fazer.

O mesmo pode ser dito em relação ao seu relacionamento com as instituições financeiras. Anuidades de cartão de crédito, taxas de administração de fundos, além das taxas dos planos de previdência, que podem chegar a altíssimos 3%, tanto para a gestão quanto para a taxa de carregamento.

Procure por outras opções que lhe atendam minimamente bem e mude!

É preciso tomar mais risco?

Sim. Você precisa se informar melhor se não se sente confortável com as opções mais arriscadas. Afinal, os juros, que eram de 14% há 3 anos atrás, são menos da metade disso hoje.

Qualquer aplicação de renda fixa que esteja atrelada à Selic vai render bem menos. Portanto, a não ser que seja aquela reserva de emergência, que precisa ser sacada a qualquer momento, toda a sua carteira precisa migrar, seja para prazos maiores ou para um grau de risco mais elevado.

Ter ciência desse detalhe é importante. Toda a curva de juros se ajustou para baixo, então, tanto para as opções de renda fixa (títulos) como para a renda variável (fundos imobiliários, por exemplo), você vai precisar ser mais paciente.

Um bom norte são os ativos de infraestrutura: sejam eles papéis de dívida ou de ações, como possuem uma receita recorrente, valem mais, dado o seu retorno acima da Selic. O mesmo se aplica às companhias abertas, que se valorizam quando são descontadas a uma taxa menor.

Com eles, seu prazo se estende para qualquer coisa entre 6 e 10 anos, pelo menos.

Quais as alternativas de investimento?

Diante desse novo contexto, onde investir?

Indústria de fundos

É possível escolher entre investir em fundos de índice (ETFs), gastando pouco, ou aplicar em opções um pouco mais “ecléticas”.

Hoje, nada menos do que R$ 15 bilhões estão distribuídos entre os 16 ETFs negociados na B3, inclusive o mais recente deles, o de renda fixa.

Fundos especializados em outros tipos de ativos também estão surgindo. Conhecer qual o seu nicho de atuação e os riscos associados é o primeiro passo. Aplique um pequeno percentual do patrimônio para testar a aderência do fundo ao que está sendo proposto.

Ações

O segundo semestre será bem mais movimentado que o primeiro. Com a queda da taxa de juros, é normal que haja maior interesse nos investimentos em renda variável, dando um empurrão para que as empresas ofertem mais ações no mercado.

O montante de recursos não é desprezível. Fazendo uma conta de padaria, se 10% da renda fixa migrar para a renda variável, são R$ 636 bilhões que vão para a bolsa. Os bancos de investimento estão trabalhando em vários mandatos e a previsão é alcançar um volume de operações de até R$ 100 bilhões até o final do ano.

Companhias que já são abertas pretendem emitir novas ações. Outras empresas vão acessar o mercado pela primeira vez. Os setores são os mais variados possíveis:

  • Caixa Seguridade: seguros;
  • Vivara: joalheria;
  • Saneago e Iguá: saneamento;
  • Celg GT: energia elétrica;
  • Boa Vista SCPC: análise de crédito;
  • BMG, Bonsucesso e Votorantim: instituição financeira;
  • Saber: educação;
  • Rede D’Or: rede de hospitais;
  • Agibank e Ebanx: banco digital;
  • Smartfit: rede de academias;
  • Tok&Stok: decoração.

Obviamente, nem todo mundo vai comprar os papéis dessas empresas diretamente. Mas, se os fundos de ações começarem a receber mais recursos de investidores, eles precisarão de novas operações para colocar na carteira. Limitando-se ao que está disponível hoje, o gestor possui pouca margem para manobra, visto que os preços já andaram bastante.

Um exemplo são ações da Ambev. Elas subiram 9,8% em apenas um dia, por conta da divulgação de resultados acima do esperado.

Fundos de participações

Fundos de private equity, que compram participações em empresas que podem ir à bolsa em alguns anos, são uma boa pedida. Eles são ofertados ao investidor por meio de FIPs (fundos de investimento em participações). Bastante numerosos, eles já somam aproximadamente mil fundos, administrados por 150 gestoras, em um total de R$ 250 bilhões em ativos.

Eles são mais arriscados que o mercado de bolsa mas, ao mesmo tempo, oferecem retornos maiores. Ainda assim, boa parte desses fundos estão alocada em modelos de negócios mais promissores para consolidação e crescimento: são os voltados para um público jovem, que reside nas grandes cidades, possui poder de compra e consome via celular.

Com a redução das taxas, projetos que antes não faziam sentido passam a ser viáveis. Isso tem feito alguns fundos buscarem inclusive operações de venture capital, típicas de empresas nascentes.

Com mais alternativas à disposição, qualquer um pode diversificar.

Conclusão

O mundo dos juros baixos veio para ficar. O que começou como uma consequência do envelhecimento populacional e da queda da produtividade vai permanecer na nossa rotina, visto que está fora do controle de governos e bancos centrais.

Cabe a cada um de nós fazer voluntariamente os ajustes necessários. Nada muito drástico, evitando-se assim o famoso “efeito rebote”, quando sabotamos tudo o que foi feito anteriormente.

Adotando uma postura mais paciente e apostando em novas formas de se investir, qualquer um pode minimizar o impacto dos baixos juros na sua vida. O mercado financeiro cresceu e se aperfeiçoou. Está na hora do investidor fazer o mesmo.

Conhecer bem os seus hábitos de consumo e investir de forma consciente são as melhores dicas para se chegar do outro lado, sem sustos.

“Não são as espécies mais fortes que sobrevivem, nem as mais inteligentes, e sim as mais suscetíveis a mudanças”.

Charles Darwin
Sobre o autor
Nohad HaratiPossui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.
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