Eletrobrás: incertezas sobre a privatização podem trazer volatilidade para o papel
Os investidores venderam as ações de Eletrobras nesta quinta-feira, 20, dia seguinte à aprovação, pela Câmara, do texto-base da medida provisória (MP) que reorganiza o setor…
Os investidores venderam as ações de Eletrobras nesta quinta-feira, 20, dia seguinte à aprovação, pela Câmara, do texto-base da medida provisória (MP) que reorganiza o setor elétrico e permite a privatização da empresa. A proposta segue para o Senado, que tem um mês, até 22 de junho, para aprovar o texto aprovado pelos deputados.
Editada em 23 de fevereiro, a MP tem força de lei, mas a privatização poderá ocorrer apenas depois que as duas Casas do Congresso (Câmara e Senado) aprovarem e confirmarem sua validade.
A ação ON da Eletrobras fechou com desvalorização de 1,88%, cotada por R$ 41,70, embora analistas avaliem como positiva a medida provisória, “que gera uma série de vantagens para a empresa”, pontua André Barbirato, especialista em Renda Variável da Valor Investimentos. “Os investidores estão realizando lucro, seguindo a máxima de que o mercado sobe no boato ou na expectativa e realiza no fato.” A ação PNB recuou mais, 3,02%, para R$ 41,13.
“Ninguém se surpreendeu, já era esperado”, comenta Marcelo Sandri, analista da Perfin, para quem os investidores tinham precificado a aprovação na quarta-feira. Até porque havia também ganhos anteriores acumulados.
Ganhos obtidos com as altas recentes ficam mais encorpados ainda se contabilizados desde fevereiro, quando as ações reagiram com forte queda à afirmação do presidente Bolsonaro de que vai “meter o dedo” na energia elétrica. Entendida pelo mercado como uma ameaça de interferência do governo no setor em que a estatal atua, a ação da Eletrobras se equilibrou no nível ao redor de R$ 29/R$ 30, na época.
De lá para cá, a ação acumulou valorização acima de 45% até quarta-feira, dia da aprovação da MP pela Câmara, quando fechou cotada por R$ 42,50. Um ganho que, de acordo com Barbirato, os investidores decidiram garantir, porque algumas incertezas persistem no cenário. “A medida provisória vale até 22 de junho e, se não for aprovada pelo Senado até lá, caduca, perde a validade”, explica.
Há clima e tempo para votar a MP?
“As dúvidas são muitas até chegar lá”, afirma Rodrigo Leite, professor de finanças e controle gerencial do Coppead/UFRJ. “Tem uma CPI (a da Pandemia) pelo caminho no Senado, é preciso saber se haverá clima e tempo para a votação da MP.” Duas condições, segundo Leite, jogam contra o governo nessa empreitada: prazo curto e ambiente desfavorável.
O clima é ainda de forte desconfiança entre os investidores quanto ao necessário capital político que o governo dispõe para levar a proposta adiante e a disposição que o Senado teria para aprovar, aponta Leite. “E, se aprovar, quando será a privatização. Ainda este ano, o que parece muito difícil, ou ficaria para o ano que vem, quando as eleições tornam o segundo semestre morto”, questiona.
O especialista da Valor Investimentos diz que, diante desse cenário ainda bastante incerto, as ações da Eletrobrás tendem a passar por acentuada volatilidade no curto prazo, mas sem fortes baixas, em meio a vendas para realização de lucros, acredita.
O professor de finanças do Coppead/UFRJ avalia que os preços das ações da Eletrobrás estão bem ajustados às incertezas de momento e podem permanecer em relativa estabilidade, a menos que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, dê alguma sinalização sobre a votação da MP.
Barbirato entende que uma definição de tendência, com perspectiva positiva, só deve ocorrer quando o Senado sacramentar a decisão da Câmara. Nessa hipótese, acredita, a ação poderia chegar a R$ 60, como apontam alguns relatórios de bancos e corretoras. Caso a expectativa seja frustrada, porém, ele não descarta a possibilidade de que os preços voltem para patamares mais baixos.
Uma escada para as cotações de Eletrobras
O professor de finanças imagina uma escadinha em que as cotações poderiam subir degrau a degrau de acordo com a sucessão de eventos esperados daqui para a frente: um nível de preço em torno de R$ 50, com a aprovação da MP pelo Senado; alta em direção a R$ 60, com a privatização ainda em 2021; e R$ 70, se, após a privatização, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica, que regula o setor) der sinal de que vai flexibilizar a política de preços de energia elétrica após a privatização.
“O setor de energia no Brasil é ainda muito regulamentado, e a lucratividade de quem comprar a empresa vai depender da flexibilização das regras de reajuste dos preços, hoje enquadrados na categoria de preços administrados.” Se não houver mudança na política de preços para o setor, com a adoção de regras livres, “as ações da Eletrobras podem retomar o caminho que pode trazer de volta à casa de R$ 30”, do fim de fevereiro, após o estresse com o ruído político da fala de Bolsonaro./Com Gustavo Cortes