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A indústria de Venture Capital e a variante Ômicron

Negócio é responsável pela capitalização de mercado de US$ 18 trilhões

Data de publicação:30/11/2021 às 05:00 - Atualizado 3 anos atrás
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Venture Capital, ou VC para os mais descolados, é o tipo de negócio que fomenta a inovação

Olhando para trás, há muito a se comemorar: 70% das maiores empresas do mundo cresceram por meio de aportes dos fundos de VC, que já financiaram desde a construção de carros elétricos até mesmo vacinas.

Originários da década de 60, eles investem em empresas cujo principal produto é uma ideia. Por mais abstrato que isso possa parecer, trata-se de um nicho das finanças responsável por uma capitalização de mercado de aproximadamente US$ 18 trilhões.

Esse número só tende a crescer, conforme novas investidas abrem o capital e fazem a roda girar novamente. Do outro lado da mesa, investidores institucionais que antes olhavam com desdém, mas que hoje se encontram encurralados entre taxas de juros baixas e ativos super valorizados.

Onipresente

A digitalização, acelerada pela pandemia, fez algo inédito pelo setor.  Aproximadamente metade das transações já ocorrem fora dos EUA. Dito isso, a próxima grande oportunidade deixou de se concentrar no Vale do Silício, ecossistema onde fundos especializados possuem uma grande rede de contatos, com o benefício do acesso a pessoas chaves. 

Hoje, para que um novo negócio seja conduzido pelas várias etapas do seu desenvolvimento, ele pode estar localizado em qualquer lugar, visto que basta uma série de reuniões via Zoom para que se consigam novos investidores. 

É o chamado “global venture”, para usar uma terminologia mais exata.  Esse movimento é liderado por parte da indústria de private equity (algo como o irmão mais velho dos VCs).  Isso tem atraído mais gestoras, permitindo que mais investidores participem dessas iniciativas.

Consequentemente, se antes as apostas se limitavam às startups de consumo, as alternativas agora são infinitamente maiores, abarcando tecnologias de setores como geração de energia limpa e biotecnologia. 

Perdas no Venture Capital

Venture Capital é a área do mundo dos investimentos onde, para cada 10 apostas, 1 vinga excepcionalmente bem, compensando todas as demais.  Não por outro motivo, atrai todo tipo de gente, o que faz com que o dinheiro não necessariamente vá para empresas que se tornarão referências em seus respectivos setores.

De um modo geral, das 100 startups que abriram o capital em 2021, mais da metade sequer apresentou lucro. Antes mesmo do IPO, muitas perdem o seu apelo, visto que, a cada nova rodada de investimentos, dilui-se a participação de todos, reduzindo os ganhos até para os que teriam as melhores condições para ganhar.

Apesar disso, ainda há fundos que preferem bancar tecnologias disruptivas a apostar em mercados excessivamente caros e expostos a qualquer reversão nos mercados. Afinal, startups não levantam recursos via dívida (intangíveis como propriedade intelectual dificilmente são aceitos como garantia), o que limita os estragos quando fecham as portas.

Nos últimos anos, muitas deixaram de ser compradas diretamente por grandes grupos de tecnologia, receosos com uma agenda governamental de maior controle e da taxação de suas atividades. Um vácuo ficou a ser preenchido.

Inovação

O venture capital se reinventou, incorporando novos hábitos.

Tal como em muitos fundos, existem aqueles que almejam uma carteira de startups, distribuída entre vários setores da economia, em vez da alocação com base no relacionamento.  Nesses casos, há pouco envolvimento na gestão.

Outros se encaixam na categoria do investidor-anjo que abre o seu próprio fundo para investir.  É aqui onde se encontra o fundador que vende a sua empresa e passa a fomentar ideias nas quais enxerga algum valor com parte do patrimônio que formou.

Como muitas startups acabam abrindo o capital, é comum que as casas de VC passem a funcionar também como gestoras de recursos.  Isso quer dizer que, em vez de devolver os recursos aos investidores após um período de 10 anos, direcionam as ações recebidas no IPO para uma nova categoria de fundos, abocanhando qualquer valorização adicional.

Venture Capital no Brasil

O fato de o País ter os seus problemas não intimida o setor. Ao longo do ano, R$ 33,5 bilhões foram investidos pelos fundos de VC, em empresas cujos empreendedores foram talhados para ambientes incertos.

Ainda assim, não se trata de uma realidade fácil. Poucas startups têm a oportunidade de aparecer no radar de um grande fundo internacional, o que lhes permitiria uma listagem no exterior. No Brasil, cada fundo de VC foca em uma determinada etapa da jornada de crescimento de uma empresa. 

Dependendo do estágio em que está (anjo, pré-seed, seed ou de séries A e posteriores), ela é vendida para o fundo mais adequado. Consequentemente, ao contrário do que ocorre no exterior, os investidores de varejo ficam de fora, seja por conta dos altos aportes exigidos, seja por conta do período mínimo de permanência no fundo.

Conclusão

A indústria de venture capital gira em torno de um único conceito: alavancar ideias para que atinjam escala comercial.  Com a quarta onda da pandemia chegando, é muito provável que elas formem um pipeline de negócios promissores.

Afinal, a inovação já não tem mais endereço fixo no Vale do Silício, onde fundadores e fundos de VC costumavam socializar. Novos participantes se juntaram ao grupo, por conta de dois fatores: baixas taxas de juros e a constatação óbvia de que grandes empresas de capital aberto podem sumir do mapa se a próxima ideia disruptiva vingar.

Os fundos de VC, que antes eram mais segmentados e faziam um bom filtro das candidatas, tiveram que se adaptar e contemplar novos setores e formas de atuação. Não se trata mais de lançar o próximo Uber ou Airbnb.

Hoje, esse trabalho envolve escolher a empresa com maiores chances de desenvolver tratamentos para doenças que afligem a humanidade ou a tecnologia que elevará o padrão de vida nas regiões mais pobres do planeta. Se idealismo combina com lucro é uma questão ainda em aberto.

Globalmente falando, o valor de mercado de startups que abriram o capital em 2021 se aproxima dos US$ 500 bilhões. Para o surgimento do próximo grande negócio, seja no Brasil ou no exterior, basta que mais uma tenha êxito no processo.

Sobre o autor
Nohad HaratiPossui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.