Renda Variável

Inflação em alta afeta Bolsa, mas ações de alta renda são menos impactadas que as de baixa renda

Impacto é maior na capacidade de consumo da população de renda mais baixa, que não tem como se proteger nas aplicações financeiras

Data de publicação:30/06/2022 às 05:00 - Atualizado 2 anos atrás
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Inflação em alta, que leva os juros também para cima, costuma não combinar com boa performance da bolsa de valores. Seja porque fortalece a concorrência da renda fixa com as ações, seja porque piora as condições financeiras das empresas que precisam de crédito ou estão endividadas. As que estão voltadas para consumo de alta renda, no entanto, parecem ser mais blindadas a esse cenário do que as ligadas ao varejo.

A inflação contribui ainda para criar desigualdade na renda das famílias, com impacto na bolsa de valores, via queda na receita e no lucro das empresas. A inflação corrói a renda e diminui a capacidade de consumo das pessoas. Com redução das vendas, encolhe o faturamento e o lucro das companhias listadas na bolsa.

Fonte: Mais Retorno

Mas dentro de um mesmo contexto, de inflação em alta e bolsa em queda, é possível identificar comportamentos distintos entre as ações, visível no gráfico acima. Ele foi elaborado no 'Comparador de Ativos' da Mais Retorno e considerou o trajeto feito por duas empresas de alta renda, Arezzo e Vivara, e duas do varejo, Magalu e Via, nos últimos 2 anos.

Maior resiliência na alta renda

Ações de empresas voltadas às famílias de renda alta, no setor de luxo, costumam ter maior resiliência nesse cenário, segundo especialistas, porque o consumo continua. As que têm foco nos consumidores de renda mais baixa sofrem mais no momento de inflação e juros altos.

“Com a inflação em alta, todos sofrem, mas a baixa renda é mais penalizada, porque sente na veia o aumento de preços”, diz Gabriel Meira, especialista da Valor Investimentos. Para Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama, dentre outros fatores, “pessoas de baixa renda são bem mais afetadas pela inflação que as de alta por ter renda menor e menos acesso também a aplicações financeiras”.

“A alta renda é o segmento de varejo que deve ficar mais protegido no atual cenário porque consegue repassar a inflação aos preços”, avalia Jennie Li, estrategista de ações da XP. “Vivara, Soma e Arezzo, com foco na clientela de renda mais alta, são as mais protegidas e resilientes no atual cenário de inflação”, acredita.                                                             

“Inflação e juros em alta impactam diretamente as empresas de consumo discricionário, obrigatório, como alimentos”, diz Meira. “As de consumo não discricionário, que têm foco na alta renda, sofrem menos ou nada”, porque seu público-alvo costuma preservar o poder de compra.

Maior impacto na menor renda

As empresas de varejo voltadas ao consumidor de menor renda são mais impactadas porque não têm condições de repassar a inflação aos preços concorda Vitorio Galindo, analista de investimentos CNPI e head de análise fundamentalista da Quantzed. 

A Via e a Magalu, dois dos destaques do comércio varejista, vivem uma situação mais desafiadora, de acordo com Jenniel Li, porque as empresas com múltiplos de preço ou valuations muito altos têm sofrido bastante em ambiente de inflação elevada.

A estrategista da XP diz que, combinado com juros altos, essas empresas enfrentam ainda a concorrência de competidoras estrangeiras, como o Mercado Livre, Shopee e a própria Amazon, que estão chegando ao País.

Dennis Esteves, especialista em renda variável da Blue3, inclui entre as mais resilientes no atual cenário também empresas que atuam em nichos de eletrônicos de alta qualidade. “Com clientes consumidores de alto poder de compra e interessados por marcas que têm status no mercado, essas empresas repassam aumentos ao preço sem dificuldades.”

As que precisam espremer os preços, achatando a margem e o resultado da empresa, “são as que mais apanham na bolsa, porque os juros pesam muito na dívida das que buscam expansão”.

Commodities e utilities

No segmento mais amplo de mercado, fora do setor de varejo, os especialistas têm clara preferência por ações de empresas do setor de commodities no atual momento de inflação e juros altos. O curto prazo convive com o risco de recessão global, diz Jennie Li, mas a perspectiva no médio prazo é ainda de uma oferta limitada para uma demanda crescente.

A estrategista da XP aponta ainda oportunidades em ações de empresas que devem continuar crescendo e repassando custos aos preços, “com pouca correlação com o crescimento da atividade”. E também em empresas de qualidade e saudáveis, com lucro e geração de caixa crescentes, que ficaram pouco mais baratas com a queda do mercado.

Nas com foco na alta renda, o analista cita a JHSF (JHSF3), empresa que atua nos setores de shopping centers, restaurantes, incorporação imobiliária, hotelaria e gastronomia, “negócios dirigidos aos consumidores de altíssima renda”.

Meira, especialista da Valor Investimentos, recomenda também ações de companhias do setor elétrico e de saneamento. “São empresas que sofrem pouco, porque conseguem repassar o custo para o consumidor, como a Sanepar (SAPR4); Eletrobras (ELET3) e Transmissão Paulista (TRPL4).  E ainda companhias ligadas à exportação de commodities, como Vale (VALE3), CSN (CSNA3) e Petrobras (PETR4).

Réguas para a inflação

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação para famílias com renda de até cinco salários mínimos, teve alta de 0,45% em maio. O INPC acumula alta de 4,96% no ano e de 11,90% em 12 meses. 

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial, subiu pouco mais, 0,47%, em maio. A alta acumulada no ano e em 12 meses, contudo, é ligeiramente menor:  4,78% e 11,73%, pela ordem. 

O IPCA mede a inflação de um conjunto de produtos e serviços consumidos por famílias com renda mensal de até 40 salários mínimos.

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Sobre o autor
Tom MorookaColaborador do Portal Mais Retorno.