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ESG
Economia

Os desafios de um gestor ESG

Cúpula de Líderes sobre o Clima.  Esse foi um dos grandes temas de três semanas atrás.  Como intenção, colocar os EUA no centro do mapa novamente. …

Data de publicação:12/05/2021 às 05:00 -
Atualizado 4 anos atrás
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Cúpula de Líderes sobre o Clima.  Esse foi um dos grandes temas de três semanas atrás.  Como intenção, colocar os EUA no centro do mapa novamente. 

Boa parte do evento virtual foi para se comprometer com metas ambiciosas de redução de gases de efeito-estufa, ainda que não esteja claro para os países participantes como isso será alcançado.

No caso dos EUA especificamente, é fato que o esforço é significativo, pois o país contará cada vez menos com o impulso gerado a partir do xisto.

Metas são ambiciosas para a redução de emissão de gases de efeito-estufa - Foto: Pixabay

NDCs

Na agenda, os chamados NDCs (metas que os países apresentam às Nações Unidas).  Eles nada mais são do que reduções percentuais escalonadas, a serem alcançadas em diferentes anos. 

Estabelecidos em 2013, esses compromissos deveriam se adequar às características de cada país, eliminando os problemas gerados pelo Protocolo de Quioto, que impunha metas aos países desenvolvidos, mas deixava a China, altamente poluente, de fora.

Com o Acordo de Paris dois anos depois, alcançou-se um número maior de países que, por sua vez, deveriam apresentar os meios pelos quais reduziriam as suas reduções na COP26 (conferência da Nações Unidas), adiada em função da pandemia para novembro de 2021.

Execução

Como trade-off de todo esse processo, um novo ciclo de crescimento econômico, menos agressivo ao meio ambiente e que endereça adequadamente a desigualdade, via novas oportunidades de emprego. 

Porém, executar o que está sendo proposto é outra estória.  Justamente por esse motivo, o título desse artigo.  Para qualquer gestor ESG que tenha acompanhado o evento, eis algumas ponderações.

Criando o futuro

Zerar a emissão de carbono até 2050 significa recriar o mundo em que vivemos.  De acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), isso virá de tecnologias que sequer existem hoje.

A linha de frente

Usando a Noruega como exemplo, metade de sua frota é composta por veículos elétricos.  Para cumprir a meta de zero emissões por caminhões, o país trabalha para manipular o dióxido de carbono, capturando-o, transportando-o e armazenando-o. 

O país nórdico banca seus avanços tecnológicos com as enormes riquezas originadas da exploração de petróleo, algo que não pode ser replicado em qualquer lugar do mundo.

O desafio, nesse caso, é como tornar ideias promissoras em algo comercializável.

Os emergentes

A China, com a sua pujante indústria de painéis solares, é o país que mais emite gases de efeito-estufa no mundo, enquanto o Brasil ainda precisa melhorar muito no que diz respeito ao desmatamento. 

Parte por conta do modelo de concepção dos NDCs, adaptados para se tornarem politicamente viáveis entre governos mais resistentes, a verdade é que a questão do clima envolve também outros assuntos sensíveis como propriedade intelectual e política industrial.      

Percebe-se então que, ao se tentar endereçar uma questão urgente, o mundo estará também abrindo um fosso tecnológico e econômico entre os países desenvolvidos e os emergentes, eliminando todos os ganhos alcançados a partir da globalização.

No caso da gestão de recursos, poucas oportunidades fora dos mercados considerados como mainstream se traduz em preços altos para quem precisa rentabilizar o dinheiro.  Isso é agravado pelas formas de financiamento da nova economia, com as suas próprias limitações.

Financiamento

As SPACs, “empresas de cheque em branco” nunca estiveram tão na moda.  Aparentemente, elas são o instrumento ideal para a inovação que não pode esperar.  Usando uma fabricante de baterias de lítio (QuantumScape) como exemplo, ela obteve uma valorização de 1.115% com a sua SPAC.  A questão é onde investir daqui pra frente. 

A dificuldade se justifica pela opacidade das informações prestadas por companhias que ainda não são negociadas em bolsa ou que são tão incipientes que não passam de uma ideia em busca de dinheiro.  A fusão entre empresas é um processo complexo e vai muito além da “assinatura do cheque”.

Como resultado, muitos negócios apresentam um desempenho sofrível, para dizer o mínimo.  Parte por conta da grande participação detida pelo sponsor e parte em função das estimativas pra lá de otimistas.  Startups com valores bilionários inclusive já se tornaram cliché.

Felizmente os mercados se corrigem dos excessos e os preços se ajustam aos fatos.  Mas a realidade do resto do mundo é bem diferente.  Os mercados emergentes, por mais que tenham evoluído, não conseguem se desfazer de seu histórico de calotes.

Falta de dólar

Isso quer dizer que toda vez que os juros nos EUA sobem, as consequências são perversas: custo de financiamento proibitivo, além de ativos financeiros desvalorizados.  A última vez que isso aconteceu foi em 2013.  Não por outro motivo, a indicação dos 5 países mais expostos, também chamados de os “5 frágeis” (África do Sul, Brasil, Índia, Indonésia e Turquia).

A incapacidade de se alavancar e os preços baixos é o melhor dos cenários para países que se encaixam nesse grupo.  Como todo gestor de mercados emergentes sabe bem, qualquer país está sujeito a sanções dos EUA, visto que controlam o sistema financeiro internacional.

Mais eficientes que a diplomacia ou o conflito armado, elas acabam sendo usadas com bastante frequência (como demonstrou a presidência de Donald Trump).  Os países afetados se defendem como podem, reduzindo a sua dependência de recursos ou de tecnologia estrangeira (acertou quem pensou na Huawei). 

O resultado é uma série de arranjos locais, pouco desenvolvidos em termos do que podem oferecer para propulsionar programas de pesquisa e inovação, prejudicando empresas que precisam se financiar e crescer.   

Dito de outra forma, se não há inovação, também não há funding.

Conclusão

A liderança dos EUA na questão climática é um alívio em relação ao retrocesso visto na gestão anterior.

Com uma agenda que prega a cooperação global e a geração de empregos em um mundo pós-pandemia, agora é a hora de se tentar entender como as peças se movem no tabuleiro internacional. 

Para o gestor mais atento ao tema, isso vai muito além da alocação de recursos em um ETF politicamente correto.  Isso porque o clima é um assunto geopolítico, envolvendo também recursos para tecnologias que ainda não existem e o fundamental problema de como financiá-las.

Mercados mais desenvolvidos estão tentando assimilar o fenômeno das SPACs no mercado norte-americano, o maior e o mais líquido do mundo.   

No que diz respeito aos emergentes, eles não só não possuem a tecnologia como também podem ficar sem os recursos, seja porque muitos fundos estão impossibilitados de investir em economias problemáticas, seja porque podem ficar com os valores retidos na primeira ordem vinda de Washington, fielmente executada pelos bancos.

Há três semanas o mundo ficou mais imprevisível.  De concreto mesmo, apenas o “sonho americano”:

“Quando investimos em resiliência climática e infraestrutura, criamos oportunidades para todos.”

Joe Biden

*Este artigo não expressa necessariamente a opinião do portal Mais Retorno

Sobre o autor
Nohad Harati
Possui MBA em Finanças e LLM em Direito do Mercado Financeiro (ambos pelo Insper/SP). É gestora de uma carteira proprietária, além de ser responsável por um Family Office.