Com deflação, como ficam os títulos indexados ao IPCA? Mantêm ou perdem a atratividade?
Inflação negativa de julho é esperada também para agosto, mas de forma pontual
Os títulos, públicos e privados, indexados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) não perdem o apelo, mesmo com a inflação negativa em julho e provavelmente em agosto. Senão por outros motivos, porque a inflação tende a retomar sua trajetória nos próximos meses. E, tudo indica, mais pressionada no ano que vem, estimam especialistas.
Nesse cenário, aplicações que protegem contra a inflação, pela indexação ao IPCA, devem ocupar espaço cativo na carteira do investidor, avaliam. “A deflação em julho e a esperada também para agosto é muito pontual, não vai se manter”, alerta Eric Jorge Allam Barros, economista e especialista em investimentos da Blue3. Em julho houve uma deflação de 0,68% e em agosto está estimada entre -0,20% e -0,30%.
“A deflação impacta a rentabilidade da aplicação, mas mantém o poder de compra do dinheiro investido”, avalia. “A inflação vai continuar, porque a deflação foi produzida por medidas do governo” – as que reduziram impostos e o teto de ICMS para combustíveis e energia elétrica.
A inflação negativa em dois meses reduzirá o rendimento dao investimento atrelado à inflação, pelo corte na correção monetária. A expectativa do mercado é que, no pós-deflação, o IPCA permaneça baixo no curto prazo e a correção monetária também, afirma Victor Zucchi Meneghel, especialista em renda fixa da Valor Investimentos.
Os juros, de certa forma, compensam a correção menor. “As taxas de juro (que compõem o ganho híbrido com a correção monetária) estão atraentes por causa da estimativa de IPCA mais baixo”, avalia Meneghel.
Nesta terça-feira, 23 de agosto, o Tesouro IPCA+ 2026 foi oferecido na plataforma do Tesouro Direto por IPCA + juro prefixado de 5,60% ao ano e o Tesouro IPCA+2035, por IPCA + taxa de 5,87% ao ano.
As taxas de juro estão bastante próximas nos títulos com vencimentos próximos, uma indicação que os especialistas não têm uma ideia clara do que virá de inflação. “As taxas refletem a expectativa de inflação do mercado, estão flat (emparelhadas), mas devem se ajustar mais à frente”, acredita Meneghel, em resgates antecipados no mercado secundário.
O investidor que levar o título até o vencimento e fizer o resgate no prazo final receberá tudo como previamente contratado: os juros pela taxa combinada mais a correção monetária acumulada, descontada a deflação.
Allam Barros, especialista em investimentos da Blue3, diz que dois meses de deflação, ainda que com impacto sobre a correção monetária, não devem levar a pânico ou mudança precipitada na carteira, “porque se sabe muito bem porque isso aconteceu”. Principalmente se a carteira estiver bem montada, conforme o perfil e a necessidade do investidor.
Uma carteira bem estruturada, para o especialista da Blue3, é aquela que contempla também a diversificação dos ativos: títulos de curto prazo indexados ao IPCA, “mais adequados ao momento econômico (à inflação e aos juros), que garantem o poder de compra mais uma taxa”; título prefixado, com pequena parcela de recursos, porque a Selic está no fim do ciclo de alta, e Tesouro Selic, como estratégia para a reserva emergencial que precisa de liquidez.
Títulos IPCA públicos ou privados?
Embora com mais risco, os títulos de emissão privada, bancária e corporativa, oferecem uma rentabilidade mais atraente, na comparação com os títulos públicos, pela adição de um prêmio de risco.
O cardápio de emissão bancária contém basicamente três títulos indexados ao IPCA: Certificado de Depósito Bancário (CDB); Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e Letra de Crédito do Agronegócio (LCA). São títulos que remuneram o investidor com IPCA mais uma taxa de juro.
“Com a Selic alta (13,75% ao ano), todos esses papeis estão com taxas bastante atraentes”, avalia Allam Barros. O especialista da Blue3 diz que os três ativos contam com a cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Crédito), para valores até R$ 250 mi), sendo que a LCI e a LCA têm ainda a isenção de imposto de renda sobre o rendimento.
Outro ponto importante, para o especialista, é a liquidez, para quem pretende fazer resgates antes do vencimento. “O CDB indexado ao IPCA, ao contrário do atrelado ao CDI, oferece liquidez só no vencimento”, afirma. Se houver resgate antes, passará por recálculo do valor, pela marcação a mercado, no mercado secundário, com alguma possível perda.
O especialista lembra que, para quem precisa de liquidez diária, existem opções de CDBs, LCIs e LCAs indexados aos CDI. Só que com rentabilidade pouco menor. “Tempo, risco e retorno caminham para o mesmo lado.”
Zucchi Meneghel, especialista em renda fixa da Valor Investimentos, aponta também como opções interessantes “as debêntures, que rendem IPCA mais prêmio, normalmente isentas de imposto de renda”. É uma referência às debêntures incentivadas, vinculadas a projetos de infraestrutura, como transportes e logística.
A rentabilidade média dessas debêntures gira em torno de IPCA mais 5,80% a 6,00% ao ano. “É uma taxa próxima da do Tesouro IPCA, só que o rendimento da debênture incentivada é isento de imposto de renda.”
Grosso modo, por uma conta grosseira e simples, equivaleria a uma taxa em torno de 7,00% a 7,30% que o título estaria pagando se não houvesse isenção tributária sobre o rendimento. Os títulos do Tesouro são tributados por alíquotas que variam de 22,50% a 15%, com intermediárias de 20% e 17,50%, de acordo com o prazo.
Allam Barros chama a atenção para o risco de crédito, ou à possibilidade de não ter o dinheiro de volta, para quem pretende investir em debênture. “É preciso não se esquecer de que está emprestando dinheiro para a empresa que emitiu a debênture”, alerta. Sem a cobertura do FGC.
Zucchi Meneghel recomenda uma análise criteriosa da empresa e escolher a com rating (nota de classificação de risco) elevado, do tipo triple A ou duplo A+, com duration máximo de cinco anos.