Finanças Pessoais

Alocação de ativos: Paridade de risco

Nos artigos anteriores apresentamos ao leitor os conceitos iniciais da alocação de ativos pelo método proposto em Markowitz e o Goal-Based Investing. Neste texto daremos uma…

Data de publicação:14/10/2019 às 02:36 - Atualizado 4 anos atrás
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Nos artigos anteriores apresentamos ao leitor os conceitos iniciais da alocação de ativos pelo método proposto em Markowitz e o Goal-Based Investing.

Neste texto daremos uma pincelada no método de alocação baseado em Risk Parity.

O que é o Risk Parity?

A alocação baseada em Risk Parity (paridade de risco) é um método de alocação de carteira que bebe da água da Teoria Moderna de Portfólio (MPT) iniciada por Markowitz, utilizando o risco (medido pela volatilidade, como o leitor já deve estar cansado de saber) para determinar alocações de uma carteira.

De fato, a ideia é muito próxima daquela descrita no artigo anterior, dado que essa alocação tem por objetivo obter o nível ótimo de retorno no nível de risco desejado.

Apesar disso, há uma importante diferença em relação à MPT: enquanto essa tenta encontrar a melhor combinação de classes de ativos com base em seus retornos e riscos esperados, a Risk Parity aloca a carteira de forma a igualar as contribuições de risco de cada classe de ativos, sem (necessariamente) considerar seus retornos esperados.

Em seguida, utiliza a alavancagem para ponderar o risco igualmente entre diferentes classes de ativos, usando o nível “ideal” de risco (volatilidade) pretendido.

Desta forma, os gestores/investidores podem derivar shares de classes de ativos em uma carteira para obter sua diversificação otimizada para uma série de objetivos e preferências desses investidores.

Para se ter noção da dimensão aplicável desse tipo de gestão, podemos ressaltar que Ray Dalio (o fundador da Bridgewater, maior fundo hedge do mundo) teve papel determinante na propagação dessa gestão ao buscar uma estratégia de investimento que fosse capaz de resistir ou suavizar a qualquer tipo de ambiente econômico, mesmo o mais extremo. As ideias acabaram culminando no primeiro fundo de paridade de risco, em 1996.

Para conhecer um pouco mais dessa história, há um documento no site da Bridgewater que conta a história, além de tratar bastante da Risk Parity chamado: “Risk Parity is about balance”.

De forma operacional, visto que cada classe de ativos tem um desempenho diferente, dependendo das condições econômicas (ciclo), a expectativa dessa forma de gestão ao igualar a exposição ao risco de muitas classes de ativos é poder enfrentar uma série de resultados econômicos considerados adversos.

Vale lembrar que a abordagem mais clássica de alocação escolhe gerir com base em uma troca entre risco e retorno, de forma que se a sua expectativa é de maior retorno, aumenta-se a posição em ativos de maior risco (o que pode reduzir a diversidade da carteira).

O pessoal da Bridgewater alerta que esse tipo de atitude tem sido problemático nas últimas décadas, pois ao aumentar a concentração em ativos de maior risco, as perdas podem ser de tal dimensão (imagine a crise de 2009) em alguns cenários, que comprometem a recuperação da carteira.

Ou seja, as mudanças no cenário econômico acontecem com uma frequência mais rápida do que o tempo necessário para investidores se recuperarem de grandes tombos.

Já uma carteira equilibrada apresenta esses riscos de curto prazo, mas eles podem ser neutralizados para sustentar mudanças no ambiente econômico.

Isso significa que eventuais perdas de curto prazo podem ser recuperadas com o tempo, permitindo que o investidor chegue nos retornos que ele deseja.

Como funciona o Risk Parity?

No caso da abordagem de paridade de risco, o primeiro passo é construir uma carteira que equilibra o risco entre as classes de ativos sem alavancagem.

Então, se o retorno esperado for baixo no caso dessa carteira em que a contribuição dos riscos for igual, aplique alavancagem em toda a carteira, em vez de mudar a alocação apenas dos ativos de maior retorno.

A intensidade de alavancagem aplicada é a que corresponde às preferências de risco e retorno do investidor, em vez de alterar a alocação de ativos.

Exemplo prático

Vamos pensar numa carteira hipotética em que um investidor aloca a composição de 50% em renda variável (representado pela SPY, a ETF da S&P500) e 50% em renda fixa (sinalizado pela AAG, ETF que sinaliza os bonds do mercado americano).

Entre janeiro de 2007 e agora no começo de outubro de 2019, tal investidor teria acumulado retorno de 61%, com 9,73% de volatilidade anual (uma relação de 6,2% de retorno esperado por unidade de risco).

Utilizando o arcabouço da gestão de paridade de risco, sabemos que o SPY tem 4 vezes mais volatidade do que o AGG, o que poderia sinalizar uma carteira de composição 20%/80% respectivamente.

Com essa carteira assistiríamos um retorno de apenas 32,7% no período, mas volatilidade de 5,2% (a mesma relação de 6,2% de retorno esperado por unidade de risco).

É possível construir uma carteira, por meio de alavancagem, para atingir os mesmos 9,7% da carteira anterior, mas com um pouco mais de retorno.

Desta forma, com uma alavancagem que permita obter 40% de SPY e 158% de AGG, teremos um retorno de 70% no mesmo período, com 9,7% de volatilidade (uma relação de 7,2% de retorno esperado por unidade de risco).

É importante notar que essa composição de carteira tem alocações em que a contribuição de cada classe de ativo para o risco total da carteira é igual (ou muito próximo).

A evolução do retorno desse exemplo está ilustrada no gráfico abaixo. O ganho adicional pode parecer pouco, mas é pelo fato de estarmos lidado com o mercado americano, em que os juros são relativamente baixos quando comparado com o cenário brasileiro. Vale destacar também como foi relativamente menor a perda durante o período da crise global.

Obviamente há um ponto fundamental aqui: a alavancagem. É imprescindível que o custo de alavancagem seja suficientemente baixo, de modo que o retorno esperado da alocação alavancada por paridade de risco, líquido dos custos de financiamento, exceda o retorno da alocação “tradicional”.

Isso costuma ser um entrave para o investidor pessoa física, sendo mais comum em fundos, visto que o investidor comum pode não obter tal alavancagem e/ou o custo de alavancagem pode ser alto de tal forma a eliminar todo o benefício da estratégia.

Mesmo que você captar recursos para a alavancagem, é importante notar que o risk parity não anula os riscos da sua negociação, mesmo suavizando momentos de turbulência.

No exemplo acima, durante o período da crise mundial, em que essa carteira básica estava acumulada retorno negativo, se você estivesse alavancado, arcaria não só com a perda da operação, mas também com o custo dessa alavancagem (dependo do tipo que for, veja o artigo linkado).

Dependendo da situação, o dano financeiro pode ser intragável, o que aumenta o risco de uma possível inadimplência. E a inadimplência, como o amigo leitor deve saber, pode criar uma situação em que a dívida vira uma bola de neve.

Por isso a alavancagem costuma aparecer mais na gestão dos fundos do que das pessoas físicas, visto que esses conseguem mais facilmente o acesso aos instrumentos financeiros e, possivelmente, com o menor custo. Além disso, em uma situação complicada, o fundo tem muito mais recursos e braços para lidar com a situação.

O exemplo é anedotal, sendo que na prática é esperado uma carteira com uma quantidade muito maior de ativos, com classes diferentes, além de uma desejável correlação nula ou negativa.

Cabe lembrar também que a composição de uma carteira que tenha como base a estratégia de Risk Parity precisa ser periodicamente reequilibrada (em termos de risco), em resposta às mudanças na volatilidade esperada das classes de ativos.

Essas mudanças alteram a composição da carteira, bem como a quantidade de alavancagem que deve ser aplicada a ela, a fim de atingir um nível fixo de volatilidade.

Conclusão

A estratégia de Risk Parity é mais um da caixa de ferramentas de métodos de alocação, sendo utilizado por grandes fundos ao redor do mundo.

A ideia de encontrar a composição de classes de ativos de modo a igualar a contribuição de cada para o risco total da carteira é bastante interessante, podendo ser vital na hora de grande turbulência por conta de mudanças no cenário econômico.

Obviamente o tipo de ativo que entrará na carteira também faz diferença, sendo que essa equalização de risco tem seu potencial efeito melhorado quando os ativos apresentam correlação negativa ou são descorrelacionados, podendo anular situações e ondas negativas.

A alavancagem é uma arma poderosa nesse caso, permitindo o acesso a um volume de recursos que possibilitam a construção dessa certeira, reduzindo o risco em relação as outras estratégias, mas sem perder “competitividade” no retorno esperado.

Sobre o autor
Arthur Lula MotaEconomista, já atuou no mercado financeiro e em departamento econômico, com elaboração de cenários macroeconômicos e estudos setoriais. Atualmente é Mestrando em Economia pela Universidade de São Paulo (USP) e dono de um dos maiores sites independentes de economia no Brasil – o Terraço Econômico.
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