Heurística do Afeto
O que é a heurística do afeto?
A heurística do afeto é um atalho mental, de acordo com o qual os seres humanos tomam decisões baseados em seu julgamento emocional de uma coisa, pessoa ou evento.
É inerente à natureza neurológica humana e tem origem nas necessidades de sobrevivência primitiva. Evoluímos, sim, mas ainda trazemos muitas dinâmicas da vida selvagem para o dia a dia moderno.
O efeito da heurística do afeto é tão ligado ao próprio raciocínio que, na maioria das vezes, nem sequer notamos que estamos seguindo-a.
Decidimos vestir essa ou aquela roupa, ajudar esse ou aquele colega de trabalho, vamos a essa ou aquela loja… E acreditamos ter decidido isso apoiados nos fatos.
Afinal, aquela roupa é mais “bonita”. Aquele colega de trabalho é um “babaca arrogante”. Aquela loja tem o “melhor atendimento”.
Ao definir isso, não criamos uma planilha com todos os atributos da camisa, nem valorizamos as boas ações do tal colega. O atendimento da loja pode até ser mais demorado que o das concorrentes, se pensarmos bem.
Mas ignoramos esses aspectos, visto que uma das características da heurística do afeto é que, no momento da escolha, tendemos a ignorar os defeitos/riscos do que gostamos e desvalorizar os feitos/benefícios do que não gostamos.
Essa dinâmica tem particular efeito sobre o consumo, a publicidade e até sobre os investimentos, como veremos adiante.
O que é heurística?
A heurística do afeto é apenas uma entre tantas categorias de heurística existentes: heurística da disponibilidade, da ancoragem, da representatividade…
Mas o que é a heurística, afinal?
É chamado de heurística um processo cerebral em que a mente, diante da necessidade de tomar uma decisão complexa, se utiliza de atalhos de raciocínio para facilitar a escolha.
Dentro da estrutura neurológica, a heurística tem dois objetivos: responder rapidamente às situações cruciais (sobrevivência direta) e poupar o desgaste mental (sobrevivência indireta).
É por isso que, muitas vezes, diante de desafios e questões difíceis, você opta por “encurtar” o caminho. Essa opção, é claro, costuma ser tão veloz que mal é percebida.
No primeiro parágrafo, citamos a escolha de uma camisa como exemplo. Agora reflita sobre como você escolheu a roupa que está usando hoje.
Você checou a previsão do tempo antes de se vestir? Fez um inventário de todo o seu guarda roupa e catalogou as peças por tecido? Pesquisou qual o tipo de tecido ideal para a temperatura prevista para hoje?
Acreditamos que a resposta seja “não”, certo? No máximo, você olhou pela janela e imaginou se faria muito calor ou frio hoje. Se a temperatura ontem estava alta, é mais provável que você tenha optado por uma roupa mais leve. E só.
Ao ser perguntado porque escolheu essa peça, você pode ter respondido: “porque era a mais bonita/fresquinha/acessível”.
Mas a verdade é que seu cérebro tomou um atalho de decisão (já imaginou passar por todos aqueles passos que citamos?) e escolheu com base em uma heurística.
Seja de disponibilidade (“se ontem fez calor, é mais provável que hoje faça de novo”), de representatividade (“hoje tem uma entrevista de emprego naquele banco.
Tenho certeza que todos usam terno por lá, é melhor não ir de regata”) e por aí vaí…
Como veremos, as emoções também têm forte apelo sobre o discernimento. O cérebro, animado em te ajudar, às vezes acredita que o melhor é confiar nelas e escolher com base no que dizem.
Uma dica: ele pode estar muito enganado. Principalmente no que diz respeito ao dinheiro.
Como a heurística do afeto funciona?
A heurística do afeto é a categoria que nos faz tomar decisões de acordo com aquilo de gostamos mais ou menos.
Calma, não é apenas uma questão de tomar café ou chá.
A questão é: para fazer uma escolha de acordo com a heurística do afeto, ignoramos os aspectos negativos de algo que gostamos e os aspectos positivos daquilo que odiamos.
Segundo essa regra, alguém que não goste do sabor do abacate, por exemplo, pode criar uma verdadeira aversão à aparência da fruta: cor, formato, tamanho.
Assim como quem adora o sabor do abacate, pode ignorar a quantidade de agrotóxicos da produção e comê-la inteira mesmo assim.
Ambas as decisões não seriam as mais corretas (pela lógica), mas o cérebro pula a lógica e cai na resposta mais conveniente emocionalmente: eu me senti uma droga comendo abacate (e agora tudo nele é uma droga) ou eu me senti muito feliz saboreando um abacate (então tudo nele é uma delícia).
Essa dinâmica se estende também ao mundo das compras, das finanças, das empresas... Pessoas compram pensando na satisfação de vestir algo novo, vão ao restaurante favorito pela nostalgia da memória e investem em companhias que produzem produtos bacanas.
Mas não tome a heurística do afeto como algo de todo mal, única responsável pelo seu descontrole financeiro.
Na verdade, ela apenas se torna perigosa quando perdemos a consciência sobre ela e deixamos que guie toda a nossa vida.
Você pode sim ir naquele restaurante onde saiu com a sua namorada pela primeira vez - mesmo que não seja o melhor da cidade. O que não pode é investir em ações furadas e comprar compulsivamente porque o “instinto” mandou.
Nesses casos, se policie para atuar sempre baseado também em dados, informações e visões externas. A heurística do afeto nunca irá embora (ainda bem), então por que não lidar melhor com ela?