Mercado tenta se recuperar após nova cepa do coronavírus ; semana tem payroll e PEC dos precatórios
Atenções estarão voltadas aos mercados internacionais na manhã dessa segunda-feira, 29
O mercado financeiro inicia a semana em clima de ressaca, mas com sentimento de redobrada cautela, nesta segunda-feira, 29, depois de ser sacudido por fortes solavancos na sexta-feira, 26, como consequência da descoberta da nova variante do coronavírus na África do Sul.
Investidores e gestores do mercado iniciarão os negócios do dia atentos ao comportamento dos mercados internacionais, os primeiros a sentir, na sexta-feira, o baque da notícia da existência da nova cepa sul-africana.
O temor de que a variante, batizada de Ômicron, provoque impacto negativo sobre a atividade global, ainda em processo de consolidação da retomada de atividade, derrubou as bolsas de valores pelo mundo e também aqui no fechamento da semana passada.
A Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, fechou o pregão com queda de 3,39%, em 102.224 pontos, e o dólar avançou 0,78%, para R$ 5,61.
As ações de empresas do setor de aviação e turismo foram os que mais caíram na sexta-feira, diante da decisão de alguns países de barrar a entrada de pessoas vindas da África do Sul – medida que o Brasil também deve adotar a partir desta segunda-feira.
Mercado teme fechamento de fronteiras
Investidores e gestores de mercado temem que uma extensão de medidas de fechamento de fronteiras em escala global, com restrições ao movimento de pessoas e mercadorias, tenha impacto negativo sobre a recuperação econômica mundial.
Felipe Leão, especialista da Valor Investimentos, diz que a descoberta da nova variante sul-africana, em meio ao recrudescimento de contaminações pelo coronavírus na Europa, agravou o cenário de incertezas dos investidores. “O receio de retorno aos lockdowns deixa as empresas que dependem do livre movimento de pessoas em compasso de espera”, explica. Situação em que “setores como o de turismo, viagens, varejo e combustíveis” podem vir a ser os mais afetados.
Especialistas afirmam que o cenário macroeconômico foi acrescido de novas incertezas, que adicionam risco maior às decisões, mas que parte do que se tem dito sobre a nova cepa ainda não passa de suposições, especulações, assim como medidas mais rigorosas para seu controle dependem de pesquisas e estudos que serão desenvolvidos a partir de agora.
Nesse cenário, em que há mais dúvidas que certezas, o investidor não deve tomar decisões intempestivas e vender ações desvalorizadas que podem passar por correção, dependendo de novas informações sobre a nova variante – como o grau de contágio, de letalidade e a eficiência de vacinas já existentes ou a criação de novas para combatê-la.
O mercado financeiro acompanhará os desdobramentos da nova descoberta relacionada ao coronavírus sem deixar de dispensar atenção à movimentação política no Senado, incumbido de dupla missão. Delas dependem a formalização do Auxílio Brasil e os recursos para bancá-lo.
A primeira é aprovar, em dois turnos, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) dos Precatórios, já analisada pela Câmara. A segunda é votar também, em duas rodadas, o projeto que cria o Auxílio Brasil.
O novo programa social do governo, que substitui o Bolsa Família, será financiado em parte com os recursos obtidos pelo parcelamento do pagamento dos precatórios, adiamento previsto na PEC.
Economia: nova cepa e PEC
O Ministério da Economia acompanha a evolução da nova variante da covid-19, A percepção na pasta é de que o governo já tem experiência na detecção da crise sanitária e de sua potencial intensidade, mas a forma como a equipe econômica colocará em prática qualquer ajuda extra necessária pode variar a depender do montante exigido e, sobretudo, do andamento da PEC dos Precatórios.
"Estamos monitorando", informou uma fonte da equipe econômica no dia anterior à reportagem do jornal O Estado de S.Paulo. "A região Norte, nas situações anteriores, foi um bom indicador antecedente da possível intensidade da crise sanitária para o restante do País. Se houver agravamento vamos adotar as medidas necessárias."
A votação da PEC, que mexe no cálculo do teto de gastos e abre R$ 106,1 bilhões em espaço para despesas em 2022, sobretudo com o Auxílio Brasil - programa que substitui o bolsa família -, está marcada para ocorrer no Senado nesta semana.
A percepção é de que, se a PEC não passar, um possível socorro não caberia dentro do teto e a única alternativa seria abrir um crédito extraordinário para comportar a ajuda.
"Vamos ver se temos ou não a PEC", pontuou esta fonte. Conforme a Constituição, créditos extraordinários só podem ser abertos para cobrir despesas comprovadamente "imprevisíveis e urgentes", caso de guerras ou calamidades públicas, por exemplo.
A intenção do governo é votar a PEC dos Precatórios na próxima terça-feira, 30, tanto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) como no plenário.
Na última sexta-feira, 26 contudo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse não poder garantir que a PEC será votada nesta semana, após pressões por mudanças. O PSD, partido de Pacheco e que tem a segunda maior bancada da Casa, age para adiar a votação e ameaça dar votos contra se não houver alterações.
CPI da Covid: Aras indica medidas
Com a aproximação do prazo para apresentar seu parecer sobre os indiciamentos aprovados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, o procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um documento com dez medidas que devem ser adotadas com base no relatório final.
Os documentos foram encaminhados ao Supremo entre esta quinta-feira, 25, e sexta-feira, 26, em duas ações sigilosas instauradas na corte. O segredo de justiça imposto ao caso impede o conhecimento do conteúdo das providências exigidas pela PGR.
Os relatores dos processos são respectivamente a vice-presidente Rosa Weber e o ministro Ricardo Lewandowski - os dois ainda não se manifestaram sobre o caso.
Os senadores do G7 - grupo majoritário da CPI - entregaram o relatório a Aras no dia 27 de outubro, um dia após o encerramento dos trabalhos da comissão.
A partir daí começou a contagem regressiva dos 30 dias estabelecidos por lei para que o procurador-geral da República apresente denúncia, ou descarte as acusações contra personalidades com foro privilegiado, como o presidente Jair Bolsonaro.
Aras tem sido pressionado por senadores a se manifestar. Na terça-feira, 23, a Comissão de Direitos Humanos, do Senado, aprovou um requerimento que convida o procurador-geral para explicar as providências adotadas até o momento. Em nota, ele informou que apresentará sua posição sobre o relatório da CPI neste sábado, 27, quando completa um mês do recebimento do documento.
No exterior
Os futuros de ações dos Estados Unidos e os mercados europeus abriram a semana no terreno positivo, juntamente com os rendimentos do petróleo bruto e do Tesouro americano. Enquanto isso, de acordo com Filipe Teixeira, sócio da Wisir Research, os investidores tentam calibrar os riscos econômicos da nova cepa da covid-19, na tentativa de trazer um pouco mais de tranquilidade aos mercados.
Nesta semana, o mercado conhece os dados atualizados do payroll, relatório de geração de empregos do país.
Embora ainda haja muitas perguntas sem resposta sobre a nova cepa, dois especialistas sul-africanos sugeriram que ela apresenta sintomas leves até agora. A Organização Mundial da Saúde (OMS) pediu cautela, dizendo que demorará algum tempo para avaliar o novo patógeno.
O presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), de Atlanta, Raphael Bostic, minimizou os riscos econômicos de uma nova variante, dizendo que está aberto a uma redução mais rápida das compras de ativos para conter a inflação.
Os investidores estão tentando descobrir se o novo surto terá curta duração, segundo Teixeira, com os mercados se recuperando em poucos dias, ou um golpe maior para a recuperação econômica global.
Até então, a perspectiva de uma política monetária mais rígida para a enfrentar as pressões sobre preços já dificultava esse cenário.
Enquanto isso, o diretor médico da Moderna, Paul Burton, disse que uma nova vacina, reformulada para combater a nova cepa, poderá estar disponível no início do próximo ano.
Na sexta-feira, 26, as bolsas americanas foram sacudidas com a notícia sobre o novo vírus. O índice acionário Dow Jones encerrou o pregão em baixa de 2,53%, a 34.899,34 pontos, maior perda diária desde outubro de 2020, o S&P 500 caiu 2,27%, a 4.594,62 pontos, e o Nasdaq teve queda de 2,23%%, a 15.491,66 pontos.
Após o fechamento dos mercados, que ocorreu mais cedo por conta da Black Friday, a Casa Branca anunciou restrições de viagens da região sul da África.
No S&P 500, os subíndices de energia (-4,04%) e financeiro (-3,27%) lideraram as quedas. As ações da petroleira Chevron cederam 2,29% e as do Bank of America caíram 3,93%. Os papéis da companhia aérea American Airlines recuavam 8,79% e os da operadora de cruzeiros Royal Caribbean, 13,22%. A Boeing teve perda de 5,41%, mas as farmacêuticas Moderna e Pfizer subiram 20,57% e 6,11%, respectivamente.
Na visão do analista Nigel Green, do Grupo deVere, a nova variante afetará temporariamente os mercados financeiros, mas as preocupações serão rapidamente ignoradas pelos investidores.
"As ações globais saltaram 16% este ano, com os investidores se concentrando na recuperação econômica pós-pandemia. Eles praticamente ignoraram a variante delta, que causou uma pequena onda de nervosismo no mercado no verão do hemisfério norte", afirma.
Nos Estados Unidos, a Black Friday foi ofuscada pela nova variante. Embora a alta da inflação seja um fator negativo para os consumidores americanos, havia uma elevada expectativa de que eles poderiam ir às compras para aproveitar as promoções.
Na Ásia, as bolsas fecharam majoritariamente em queda nesta segunda-feira, seguindo as fortes perdas nos mercados ocidentais na última sexta-feira, em meio a preocupações em relação à variante Ômicron do coronavírus.
Em Hong Kong, onde um caso da mutação foi detectado, o índice Hang Seng encerrou a sessão com perda de 0,95%, aos 23,852.24 pontos. Os temores de que a nova cepa prejudique a recuperação do setor de viagens penalizaram as ações de companhias áreas, com Cathay Pacific Airways em baixa de 3,55%, acompanhada por China Southern Airlines (-2,64%).
Na China continental, Xangai cedeu 0,04%, aos 3.562,70, enquanto o Shenzhen, de menor abrangência, subiu 0,22%, aos 14.810.20 pontos. Já o índice Taiex, de Taiwan, recuou 0,24%, aos 17,328.09 pontos.
Na Coreia do Sul, o Kospi teve desvalorização de 0,92%, aos 2.909,32 pontos, na Bolsa de Seul. Samsung C&T Corporation, dona do maior parque de diversões do país, cedeu 3,15%.
Em Tóquio, o índice Nikkei perdeu 1,63%, aos 28.283,92 pontos. O governo do Japão anunciou que fechará as fronteiras para turistas estrangeiros, a fim de conter a Ômicron.
Ações de empresas ligadas à logística, entre elas Nippon Yusen K.K. (+2,44%) e Mitsui O.S.K. Lines (+2,31%), contrariaram o tom negativo dos negócios japoneses, em meio à expectativa de que a nova cepa mantenha os preços de frete elevados.
Na Oceania, o índice S&P/ASX 200, de Sidney, baixou 0,54%, aos 7.239,80 pontos. Investidores aguardam a divulgação da leitura do Produto Interno Bruto (PIB) australiano no terceiro trimestre, que deve mostrar contração, na próxima quarta-feira, 2. / com Júlia Zillig e Agência Estado