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Recompra de ações por parte das empresas cresce 265% em 3 anos; entenda o que está por trás do movimento

Acionista tende a ser beneficiado quando controlador recompra os papeis

Data de publicação:13/10/2022 às 05:00 - Atualizado 2 anos atrás
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O programa de recompra de ações vem em uma crescente nos últimos anos. Este ano avancou 23,8% em relação ao ano passado na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, mas em relação a 2019, o aumento é mais expressivo, de 265%. O que estaria por trás dessa movimentação que caminha em direção contrária à de redução de operações de recompra de ações pelas companhias americanas? Ações baratas? Aposta na própria empresa?

Até setembro, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidade que regula e fiscaliza o mercado de ações, recebeu 73 pedidos de registro de empresas em programa de recompra. Número que supera os 59 pedidos de empresas registrados na CVM no mesmo período de 2021.

Suzano foi uma das empresas qu entrou na recompra de ações em 2022: 20 milhões de papeis a R$ 967 milhões - Foto: Divulgação

Dados de relatório do BTG Pactual, de julho de 2022, demonstrar essa evolução nas recompras. O número de abertura de programas subiu de 20, anunciados em 2019, para 38 (+90%), em 2020, e para 59 (+55%), em 2021.

A expectativa de parte dos analistas é que as recompras na B3 superem a média dos últimos anos. Os mais otimistas estimam que as operações movimentem até R$ 65 bilhões este ano. Uma projeção que pode sofrer uma revisão para baixo com o fim do ciclo de alta dos juros, com a Selic em 13,75% ao ano e jeito de que permanecerá elevada bom tempo. 

Um especialista diz também que as incertezas econômicas, sobretudo a preocupação com a política fiscal do próximo governo, não dá ao mercado o alento de que precisa para apostas mais altas. Mas o que levam empresas a recomprar suas ações?

Por que ocorre a recompra de ações?

Especialistas dizem que o interesse pelas recompras está ligado basicamente ao baixo preço das ações, que torna a bolsa barata e a recompra atraente, principalmente para as empresas bem capitalizadas.

Outros dizem, no entanto, que esse interesse está em baixa. Embora as ações continuem baratas, uma das pernas que vinham sustentando as recompras, os juros baixos, mudou de patamar. Com a renda fixa remunerando com o CDI em 13,75% ao ano, passou a não valer a pena recomprar e entesourar as ações, ainda que estejam descontadas em relação ao valor patrimonial. A renda fixa está mais rentável e é um porto mais seguro neste momento de transição, argumentam.

“O valuation (valor com que a ação é negociada no mercado brasileiro) está muito abaixo da média histórica”, avalia Ubirajara Silva, gestor da Galapagos Capital. Uma cotação inferior à que a ação estaria valendo em relação ao valor patrimonial da companhia.

Estudo do BTG Pactual indica que o valuation ou os múltiplos da cesta de ações do Ibovespa, excluindo Petrobras e Vale, está em 9,1%, comparado com uma média histórica de 12,6%. Com a presença de ações da Vale e de Petro na carteira do índice, o valuation é revisto para 7,4%, em comparação com uma média histórica de 11,2%.

“Sob essa métrica, as ações estão baratas”, avalia Silva, para quem a operação vai além da vantagem financeira. Ela gera também uma expectativa positiva no mercado e nos investidores. “A recompra mostra e transmite confiança ao investidor”, acredita. “É uma sinalização muito positiva quando o principal controlador recompra as ações.”

A operação também passa uma mensagem ao mercado segundo a qual a ação está tão barata que a recompra é o melhor investimento, reforça Romero Oliveira, head de renda variável da Valor Investimentos.

Algumas empresas tentam aproveitar a expectativa positiva que o programa pode gerar para anunciar a recompra de ações como uma estratégia de sustentação das ações, em momentos de crise. “Criam uma expectativa positiva, mas, como têm a flexibilidade de não executar a recompra, podem desistir”, alerta o gestor da Galápagos Capital. A CVM prevê uma data-limite, após a abertura, para a conclusão da recompra.

Nem sempre também um programa de recompra anima o mercado. Em um programa desse tipo, diz um especialista, o investidor vê o tamanho do lote de ações e o prazo previsto para a recompra. Em geral, para o mercado, a operação perde atratividade quando o lote for pequeno e a execução da recompra for diluída por um período muito elástico.

Uma das empresas que recompraram ações em 2022 foi a Suzano (SUZB3). A companhia de papel e celulose concluiu o programa, deliberado em julho e iniciado em 3 de agosto, com a recompra, em 27 de setembro, de 20 milhões de ações, no valor total de R$ 967 milhões.

Estão na relação de empresas que concluíram o programa em 2022 ainda, dentre outras, a Vale (VALE3), com a recompra de 200 milhões de ações ordinárias (ON); Dexco (DXCO3), antiga Duratex, com a recompra no total, desde o início, de 20 milhões de ações ON; a Odontoprev (ODPV3), com a recompra de 10 milhões de ações ON, de um total previsto de 18 milhões; a SLC Agrícola (SLCE3), com a recompra de 2 milhões de ações ON.

As ações recompradas podem ter diversas destinações. O gestor da Galapagos afirma que as ações que saem de circulação são em geral canceladas. Ou são recolhidas à tesouraria e mantidas em estoque, para o pagamento de executivos. E podem até eventualmente voltar à negociação. Tudo depende da estratégia da empresa.

Empresas americanas tiram pé do acelerador

O intenso e movimentado programa de recompra de ações nos Estados Unidos em 2021, que estimulou iniciativas semelhantes por aqui na virada de 2022, desacelerou.

Reportagem do Wall Street Journal aponta que as empresas do Standard & Poor’s (S&P) pisaram o freio das recompras de ações no segundo trimestre. O volume de recompras teve redução de 21,8%, para US$ 219,6 bilhões, após o recorde US$ 281,0 bilhões, no primeiro trimestre.

Romero Oliveira, head de renda variável da Valor Investimentos, diz que “as empresas americanas tiraram um pouco o pé do programa de recompra de ações, muito forte até o ano passado”, devido à mudança de expectativas em relação à economia dos Estados Unidos.

O cenário de inflação e juros altos e a perspectiva de recessão, de acordo com Oliveira, deixaram as empresas americanas mais conservadoras, quando não cautelosas. “Nesse ambiente, em vez de recompra de ações, a preocupação passou a ser segurar e reforçar o caixa.”

Folga de caixa e ações baratas

A situação é inversa no Brasil, aponta Romero, onde o cenário macroeconômico dá seguidos sinais de melhora, com inflação em queda e juros estáveis. Além disso, “aqui as empresas estão gerando muito mais caixa e as ações caíram bastante, estão baratas”.

O especialista diz ainda que, mesmo com a retomada de atividade, as empresas não estão muito animadas em projetos de expansão. “Pela falta de oportunidades de investimento, acabam optando por remunerar o acionista via distribuição de dividendos e recompra de ações.”

Benefícios aos acionistas

Romero explica que a recompra, ao reduzir a quantidade de papéis em circulação, gera maior valor ao acionista da empresa. “Aumenta o lucro por ação, portanto o retorno para o acionista.”

Mas há outros benefícios, aponta o especialista. Um é a perspectiva de valorização dos papeis (principalmente com a redução da quantidade de ações em circulação no mercado). Outro é a maior distribuição de dividendos e bonificações (em menor volume, as ações passam a representar parcela maior de capital, que tem como efeito também o aumento da participação de cada acionista como sócio da empresa).

Sobre o autor
Tom MorookaColaborador do Portal Mais Retorno.