Por que o Copom deve manter a Selic em 13,75%; analistas indicam os 5 principais motivos
Inflação ao consumidor em alta, incertezas com regras fiscais, juros altos nos EUA, expectativas desancoradas e mudanças na meta de inflação pressionam a Selic
Parece não haver dúvidas nem divergências entre os especialistas de que a Selic será mantida pela sexta vez consecutiva em 13,75% na reunião do Comitê de Política Monetária, que começa nesta terça-feira, 2. A discussão gira mais em torno do tom a ser adotado pelos diretores do BC no comunicado que é emitido logo após o término do encontro e sobre o início da trajetória de queda do juro.
A taxa básica da economia está engessada no mesmo nível desde agosto de 2022. Embora a continuidade da Selic em 13,75% tenha gerado críticas frequentes do presidente Lula e de seu partido, o PT, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto tem permanecido firme no propósito de usar a política de juros altos para não só segurar a inflação mas, e principalmente, para ancorar as expectativas do mercado sobre ela.
Analistas de mercado acreditam no prosseguimento da Selic em 13,75% por vários motivos, veja os principais.
Inflação
O IPCA-15 de abril, divulgado na última semana, veio com sinais ambíguos: a variação foi de 0,57%, abaixo dos 0,69% registrados em março e também das estimativas do mercado, que estavam acima de 0,60% para o período. Com isso, o acumulado do índice para a janela de 12 meses ficou em 4,16%, portanto, abaixo de 5%, o que não acontecia desde fevereiro de 2021.
Se o indicativo de desaceleração do IPCA era um bom motivo para comemorar, o mercado enxergou outros dados dentro do índice que trouxeram preocupação. É que os núcleos da inflação, que mostram com precisão a tendência dos preços distinguindo movimentos transitórios dos que são persistentes e generalizados, ainda trafegam entre 7% e 7,5%, bem acima do centro da meta (3,25% para este ano), e a difusão da inflação, que revela o porcentual de itens com aumento de preços, voltou a subir.
“A inflação no atacado continua negativa, em linha com a queda dos custos globais de produção. A inflação ao consumidor, no entanto, continua alta e resistente, com poucos sinais de melhora”, afirmam Caio Megale e Rodolfo Margato, economistas da XP em relatório. Em abril, o IGP-M ficou negativo em 0,95%, e -2,17% em 12 meses.
Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Campos Neto questionou como estaria a situação do País sem esse movimento firme do BC na elevação dos juros? Ele mesmo tem a resposta: “Teríamos uma inflação de 10% e, para controlar as expectativas do ano que vem (2024) que seriam mais altas dos que os 10%, teríamos juros de 18%.”
O Comitê não parece convicto de que o processo de queda efetiva da inflação está em curso, o que seria necessário para promover o recuo dos juros.
Arcabouço fiscal
Entre a última reunião do Copom em março e a desta semana, o evento de maior relevância foi a apresentação e envio do novo arcabouço fiscal do País ao Congresso. Há consenso de que a iniciativa do governo em propor regras para o controle de gastos foi positiva ao retirar parte da pressão do risco fiscal dos mercados, mas há muitas dúvidas.
“A notícia mais importante desde o último Copom foi a divulgação do tão aguardado arcabouço fiscal do governo. Em suas declarações públicas, o presidente do banco central, Roberto Campos Neto, se limitou a dizer que o arcabouço reduz os ‘riscos de cauda’. Acreditamos que o arcabouço ficou mais ou menos em linha com as expectativas do Copom,” afirmam os economistas da XP.
Os gastos ficam atrelados às receitas, mas o governo ficou devendo explicações ao mercado sobre como vai controlar as despesas, nem como pretende aumentar a entrada de recursos a seus cofres para que possa aumentar as depesas, ou ainda quais serão as providências em caso de descumprimento de metas.
“A taxa de juros deve começar a cair assim que a situação fiscal do País for melhorando”, afirma Paloma Lopes, economista da Valor Investimentos.
“A situação da âncora precisa ser resolvida, sabe-se que o texto que foi enviado passará por modificações, isso já foi anunciado. É preciso saber como será aprovado e até que ponto ele vai ser modificado" diz a economista. "Então, há um certo desconforto do mercado ainda em relação aos procedimentos para se chegar a um denominador comum”.
“Ainda há várias dúvidas sobre o arcabouço fiscal. Embora tenha sido uma notícia melhor, um pouco do que estava precificado no mercado, ele é pior, por exemplo, que o teto de gastos”, destaca Marília Fontes, sócia-fundadora da Nord Research.
Mudança nas metas?
O mercado também torce o nariz para a possibilidade de mudança de metas de inflação. Para 2023 o centro da meta está fixado em 3,25%, com uma margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual para cima (4,75%) ou para baixo (1,75%). Já para o ano que vem o centro da meta cai para 3%, também com mobilidade de 1,5 pp para o piso e para o teto da meta.
Lula e sua equipe econômica não escondem a pretensão de elevar essas metas, de modo a ter mais flexibilidade para o aumento de preços e, por tabela, para os seus gastos.
Esse é mais um fonte de incerteza e de pressão para as projeções de inflação do mercado, que acompanha de perto o desenrolar da questão a ser decidida até junho, quando o Conselho Monetário Nacional irá se reunir e tomar uma decisão.
Expectativas desancoradas
Por essas inseguranças sobre a eficácia das novas regras fiscais, uma convincente queda dos preços na economia, provável alteração na meta de inflação, é que as expectativas de inflação ainda não estão ancoradas. Ao contrário, elas estão piorando para 2023.
Pelo último boletim Focus, o mercado subiu a projeção de inflação de 6,01% para 6,04%. O mercado trabalha com aumento do IPCA anual especialmente no segundo semestre, quando saem da composição do índice porcentuais mais baixos referentes a meses em que houve renúncia fiscal de ICMS com energia e combustíveis em 2022 e produziu uma inflação artificial, mais baixa, e entram dados reais da economia deste ano.
Para 2024, as estimativas mostram um número também acima da meta, de 4,18% de acordo com o Focus.
“Para 2024, esperamos que a projeção para o IPCA cheio suba de 3,6% para 3,7%, em linha com o aumento das expectativas de inflação e a menor taxa Selic projetada pelo Focus para 2023” destacam Megale e Margato da XP.
Juros nos EUA
Da mesma forma que fecha a aposta de que o Copom vai manter a Selic em 13,75%, o mercado também espera que nesta quarta-feira, 3, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) aumente os juros em 0,25% ponto porcentual, entre 5% e 5,25%.
A expectativa é que após essa elevação, o Fed mantenha os juros americanos nesses níveis por alguns meses sem novos ajustes. Principalmente porque os últimos dados sinalizam uma desaceleração da inflação e também para não gerar mais pressão em um mercado que sofre com os problemas financeiros dos bancos médios.
Os juros altos nos EUA também são observados pelo Copom na medida em que os juros domésticos precisam manter-se competitivos na disputa do capital estrangeiro.
O que o mercado espera
A Selic deve seguir em 13,75% até a próxima reunião do Copom em junho, ninguém duvida. Há divergências, no entanto, sobre quando será iniciado o processo de redução dos juros.
“A taxa Selic permanecerá em 13,75%, sem sinais de queda em breve” esperam os especialistas da XP. "Acreditamos que o comunicado pós-decisão reforçará a mensagem da última ata do Copom, de que é preciso “serenidade e paciência” para que apareçam os efeitos das elevações passadas da taxa de juros. E, portanto, a política monetária permanecerá contracionista“.
Paloma, da Valor Investimentos acredita que a ata do Copom traga indícios de que os juros serão reduzidos de acordo com a melhora da situação fiscal no País.
Para Pedro Domingues, sócio da Nexgen Capital, “no atual momento a expectativa é que a taxa permaneça nesse patamar que ainda está hoje, até o final deste ano, e comece a cair no final deste ano para início do ano que vem”.
Há, ainda, quem aposte em um corte dos juros na reunião dos dias 21 e 22 junho, enquanto boa parte acredita que isso aconteça apenas no segundo semestre, no encontro dos diretores ou no início de agosto, ou meados de setembro.
Por essas indefinições sobre quando e quanto as taxas vão cair é que a projeções para a Selic no fim de 2023 também são diferentes, variam de 12,75% a 13%.