Economia

Auditoria da dívida pública: o que é e como funciona?

Em tempos de política efervescendo como agora, não é raro escutarmos planos exóticos de candidatos sobre a dívida brasileira. Volta e meia sempre aparece alguma proposta…

Data de publicação:01/10/2018 às 02:45 - Atualizado 4 anos atrás
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Em tempos de política efervescendo como agora, não é raro escutarmos planos exóticos de candidatos sobre a dívida brasileira.

Volta e meia sempre aparece alguma proposta como dar calote na dívida ou renegocia-la (que é quase a mesma coisa).

De fato, temos uma dívida grande e pagamos juros por isso (funciona como qualquer empréstimo pessoal, por exemplo, algo que espero que você faça de tudo para não precisar).

Claro, o governo tem de se financiar e paga juros para isso.

Mas voltando ao primeiro parágrafo, mesmo que achássemos razoável dar calote na dívida, quem seria, de fato, afetado com isso?

Será que apenas os bichos papões do mercado financeiro a detém?

Vamos conhecer um pouco mais do perfil da dívida brasileira hoje e entender quem financia nosso governo.

Por isso, continue lendo para saber mais sobre:

O que é e como funciona a dívida pública
Perfil da nossa dívida e quem a detém

O que é e como funciona a dívida pública

Como disse no início, não é porque se trata da dívida do governo que ela é diferente das outras. Pelo menos não em relação ao aspecto principal: Como qualquer outra dívida, o governo gastou mais do que ganhou e por isso teve de tomar um empréstimo.

A dívida pública bruta do Brasil está em R$ 3,7 trilhões ou cerca de 75% do PIB brasileiro.

Sim, é bastante e é preciso financiar isso.

Pessoas normais vão ao banco pedir dinheiro emprestado e (mesmo que a taxa de juros tenha caído muito) pagam um juro elevado para que tenham recursos liberados pelos bancos.

O governo consegue captar recursos de uma forma um pouco diferente.

Ele lança títulos públicos federais – esses mesmos que você pode adquirir pelo tesouro direto depois no mercado secundário.

Existe um leilão de compra e venda onde os dealers do Tesouro (instituições habilitadas a operar a dívida) lançam ofertas por uma taxa de juros que determinam. O Tesouro Nacional seleciona as melhores ofertas e vende os títulos.

Assim, o Tesouro Nacional se compromete a pagar a taxa de juros a que os títulos foram negociados. Lembrando que existem diversos tipos de títulos, sejam pré-fixados, pós-fixados ou vinculados à inflação.

O governo, dessa forma, captou recursos através da emissão de títulos e irá pagar juros quando os títulos vencerem.

O Tesouro ainda realiza a rolagem de títulos. Ou seja, quando a dívida está perto do prazo de vencimento, o governo emite novos títulos para pagar aqueles anteriores que estão vencendo.

Essa prática é comum. Todos os países têm dívida pública, alguns mais outros menos.

É por isso que a história de que o país gasta mais de 40% do orçamento com pagamento da dívida não é verdade. Afinal, a maior parte do pagamento de juros e amortização é apenas rolagem e não pagamento de fato com recursos arrecadados com impostos.

O que é importante é a ideia de sustentabilidade da dívida, algo que piorou no Brasil nos últimos tempos, por isso o debate fiscal ganhou terreno por aqui.

Mas isso é papo para um outro texto.

O fato é que após o Tesouro Nacional emitir os títulos e os vender, as instituições dealers, que são instituições financeiras credenciadas pelo Tesouro Nacional com o objetivo de promover o desenvolvimento dos mercados: primário e secundário de títulos públicos, repassam eles para o mercado em geral, ou seja, para os outros investidores.

São exatamente eles que serão os financiadores da dívida.

Mas quem são esses detentores de fato dos títulos? As instituições que possuem a dívida pública?

Perfil da nossa dívida e quem a detém

O Tesouro Nacional gere a dívida e tem alguns objetivos sempre em seu radar.

Ao longo dos últimos anos, o Tesouro sempre buscou reduzir a parcela da dívida em títulos pós-fixados e aumentar a parcela em pré-fixado. Isso dá maior previsibilidade para a dívida e reduz o risco em relação a taxa de juros.

Além disso, o Tesouro sempre busca alongar a dívida, isto é, ter um prazo maior para pagamento dela. Hoje o prazo médio da dívida está em 5,79 anos. Ou seja, teoricamente o governo teria de pagar toda a dívida nesse prazo, mas o Tesouro faz sempre a gerência disso.

O que o Tesouro tem menos controle é sobre quem detém a dívida. Mesmo assim, ele sempre monitora essa informação.

Sem mais delongas, a nossa dívida pertence a uma base relativamente bem diversificada de investidores.

Na verdade, três grandes perfis de investidores detém a maior parte: Fundos de previdência, Fundos de investimento, Instituições financeiras. Você pode conferir aqui no último relatório anual da dívida.

Os fundos de previdência são os maiores detentores com 25,5% da dívida, aumentando esse percentual em relação a 2016. Em segundo lugar estão os fundos de investimento com 25,2% e em terceiro estão as instituições financeiras com 22,3%. Ou seja, esses três perfis de investidores têm 73% da dívida Brasileira.

Assim, ao analisarmos esses dados, verificamos que grande parte da dívida está, no fim, com as pessoas físicas. Isso mesmo, você, investidor, muito provavelmente detém uma parcela da dívida pública ainda que indiretamente.

Afinal de contas, se você é cotista de um fundo ou tem um plano de previdência privada, muito provavelmente alguma parte da carteira desse seu investimento é composta por títulos públicos.

Além disso, o que está detido pelos bancos, também está indiretamente ligado as pessoas físicas já que elas também têm investimentos nessas instituições.

Logo, propostas de calote na dívida ou coisas do tipo, afetaria muito, no fim, a aposentadoria das pessoas no futuro. Ou pelo menos os rendimentos atuais através de fundos de investimentos.

É por isso, que não faz sentido falar em propostas do tipo.

Eu prezo muito para que o governo reduza os juros pagos em relação a dívida, mas existem meios normais de se fazer isso e não com “cavalos de pau” que irão apenas ter efeitos maléficos sobre pessoas comuns.

Conclusão

A dívida brasileira é uma preocupação hoje. Por isso falamos bastante em ajustes fiscais necessários para garantir a sua sustentabilidade.

O governo precisa, de qualquer forma, financiar essa dívida. Emitem-se títulos para que isso seja feito. Investidores adquirem esses títulos em troca dos juros que o governo irá pagar.

Grande parte desses títulos está direta ou indiretamente na mão de investidores pessoa física comuns, que querem ter algum rendimento ou mesmo garantir uma aposentadoria mais confortável. Os fundos de previdência e fundos de investimentos detém metade da dívida, por exemplo.

É por isso que não faz sentido falar em reescalonamento da dívida ou coisas do tipo. A dívida pública tem de ser reduzida de forma natural, como qualquer família faz: gastando menos do que se ganha.

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Sobre o autor
Vinicius AlvesEconomista, atuou no departamento econômico de empresas de sell side no mercado financeiro. Já foi Top-5 de projeção de inflação de curto prazo do BC.
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