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A hora das debêntures incentivadas: o caso da infraestrutura

A importância da infraestrutura Não é segredo para ninguém que a infraestrutura do nosso país é precária. A despeito do massivo investimento e gasto público nas…

Data de publicação:22/07/2019 às 04:40 - Atualizado 3 anos atrás
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A importância da infraestrutura

Não é segredo para ninguém que a infraestrutura do nosso país é precária. A despeito do massivo investimento e gasto público nas últimas 7 décadas, ficamos muito atrás dos outros países nesse quesito, o que tem impacto direto na produtividade e competitividade do país.

De fato, há estudos mostrando a relação intima entre infraestrutura, desenvolvimento e crescimento econômico. A título de exemplo, o artigo “The Effects of Infrastructure Development on Growth and Income Distribution” de Calderón e Servén (2004) mostram como infraestrutura pode ser uma arma para o combate da pobreza, com impactos bastante significativos na aceleração do crescimento e a redução da desigualdade, sobretudo na América Latina.

Em estudos mais recentes, Yilmaz e Çetin (2018) em “The Impact of Infrastructure on Growth in Developing Countries: Dynamic Panel Data Analysis” também encontraram o impacto positivo da infraestrutura no crescimento econômico. A literatura não para por aí e podemos passar o dia citando iniciativas que buscam compreender melhor a influência da infraestrutura na economia, sempre de forma positiva.

Olhando esses estudos e a situação do Brasil, há uma união de preocupação e identificação de oportunidades. De fato, o posicionamento do país nos rankings globais nessa área é péssimo. Usando o ranking divulgado pelo Banco Mundial, referente ao Global Competitiveness Index, o país fica na 73º posição, colado na Jamaica, ressaltando a debilidade da infraestrutura brasileira.

A solução de mercado: as debêntures incentivadas

Historicamente a infraestrutura brasileira sempre teve como grande fiador o setor público, com investimentos do governo e gastos do contribuinte para financiar as obras que o país precisava. Descobrimos mais tarde, como você sabe, uma porção de escândalos de corrupção envolvendo obras de infraestrutura que envolviam esquemas desde o século passado. 

O problema agora é que o Estado brasileiro não possui mais capacidade fiscal para avançar na infraestrutura, que tem ficado cada vez pior, atrasada e mais depreciada. Mesmo que tenhamos evidências de que o gasto na infraestrutura representa um ganho social maior do que seu custo, o país perdeu essa capacidade de gasto.

O que fazer? Nessas horas o setor privado se apresenta, obviamente por saber das oportunidades de ganhos que isso trará nas próximas décadas, visto que o investimento em infraestrutura será o próximo motor de crescimento do país, assim como foi o consumo das famílias na primeira década desse século.

Além disso, há outro fato importante: as mudanças no BNDES. O banco sempre foi um competidor nos financiamentos de longo prazo, oferecendo taxas tão subsidiadas que praticamente anulavam qualquer tentativa do setor privado em financiar obras de infraestrutura, por exemplo. 

Com a mudança da governança do banco, além de suas políticas e estratégias de atuação, a situação mudou. A mudança da chamada TJLP para a TLP no BNDES, que diminui grande parte subsídio do juro, é um dos importantes motivos do aumento da competitividade do setor privado para com esse tipo de projeto.

A forma do mercado privado entrar nessa dança é por meio do financiamento, em especial por meio das chamadas debêntures incentivadas. Não sabe o que é uma debênture? Veja em “O que são Debêntures? Vale ou não a pena investir?”.

As debêntures incentivadas e o caso da infraestrutura

Assumindo que o leitor agora já está ciente do que são debêntures, vamos ao caso das chamadas “incentivadas”. As debêntures incentivadas são esses títulos que as empresas emitem para se financiar, mas com um incentivo maior: são isentos de imposto de renda.

Sim, e isso faz toda diferença pensando no seu rendimento.

Mas por qual motivo não se cobra impostos? Justamente por tratar de empresas e projetos envolvendo o segmento da infraestrutura, ou seja, como o governo não pode atuar diretamente nessa área, ela dá incentivos fiscais para aquelas empresas que o fazem.

Conforme a própria Secretaria de Política Econômica (SPE) define: “As debêntures incentivadas instituídas pela Lei nº 12.431/2011, relacionadas aos projetos de investimento em geral e especificamente aos projetos de investimento na área de infraestrutura definidos como prioritários e regulamentado pelo Decreto nº 8.874/2016, usufruem de benefícios tributários e constituem um mecanismo de funding de longo prazo, via mercado de capitais, em alternativa às fontes tradicionais de financiamento”.

No fim do dia a empresa consegue mais recursos para executar as obras, o investidor paga menos para investir (ou ganha mais), e o governo consegue transferir uma parte de suas atribuições para outro agente. Todo muno sai ganhando.

Naturalmente o maior risco desse investimento é a falência da empresa que emitiu a debênture. Esse problema se torna maior pelo fato de não haver o seguro por meio do Fundo Garantidor de Crédito (FGC).

Desta forma, é preciso olhar bem o tipo de debênture incentivada que você eventualmente pensa em comprar.

O tipo importa, pois caso compre uma debênture em que a garantia é flutuante, receberá pagamento em casa da falência da empresa antes de todos os credores dela, ao passo que em uma debênture subordinada, só os acionistas da empresa irão ver a cor do dinheiro.

Como acompanhar esse mercado através de índices?

Para facilitar o acompanhamento do mercado de debêntures em geral, a ANBIMA estabeleceu o Índice de Debêntures ANBIMA (IDA), que serve como referência ao representar a evolução, a preços de mercado, de uma carteira de debêntures.

O índice é subdivido em dois subíndices, o IDA-DI e o IDA-IPCA, sendo que o primeiro compõe aquelas debêntures com rendimentos atrelados ao DI ou DI+spread e o segundo grupo compõem aquelas debêntures com IPCA+spread.

As debêntures de infraestrutura fazem parte do segundo grupo, e são classificadas conforme o art. 2º da Lei 12.431, ou seja, que são destinadas “à captação de recursos com vistas em implementar projetos de investimento na área de infraestrutura, ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação, considerados como prioritários na forma regulamentada pelo Poder Executivo federal”.

O IDA-Infraestrutura começou a chamar mais atenção recentemente por um motivo óbvio: o rendimento começou a aumentar.

Se observarmos no gráfico abaixo a evolução do rendimento acumulado desde maio de 2016, o índice que representa o seguimento de infraestrutura estava rendendo abaixo ou próximo daquele que trata do DI, ou do índice geral.

O rendimento considerado é aquele com gross up no ativo isento, considerando a alíquota descrita na Instrução Normativa RFB nº 1585 da Receita Federal.

Essa situação não revelava a atratividade desses papéis, mas a partir de 2018 o jogo mudou, sobretudo impulsionando a regulação dos fundos incentivados de investimento em infraestrutura por parte da CVM no começo de 2019, do qual trataremos mais à frente.

Naturalmente o leitor pode ter ficado interessado por esse movimento. Veja só, parece um retorno interessante e estão batendo os seus “concorrentes” dentre o mercado de debênture. Nessas horas devemos respirar e nos perguntar: mas e o risco (volatilidade)?

A despeito desse maior retorno acumulado, há de brinde uma maior volatilidade no pacote, conforme o gráfico abaixo, que mostra a relação de risco e retorno dos dias 05/05/2017, 04/05/2018, 06/05/2019 e 17/06/2019, ou mais precisamente, a relação entre a volatilidade anualizada dos retornos diário dos últimos doze meses e o retorno acumulado em doze meses.

De cara o gráfico já sinaliza alguma coisa estranha. Se olharmos as linhas horizontais, é possível ver retornos muito próximos para riscos muito distintos, embora em períodos diferentes.

Se fizermos uma espécie de índice Sharpe (mas sem a taxa livre de risco) para os parâmetros dessas debêntures, ou seja, verificarmos quanto de retorno para cada unidade de risco, a estranheza salta aos olhos. Olhando por essa métrica, o retorno das debentures em infraestrutura ficam muito menos interessantes. 

De fato, quando comparado ao desempenho do IDA-DI é baixíssimo em todos os períodos, dado o baixo risco envolvendo os IDA-DI, embora cabe destacar que essa relação está melhorando. A relação sai de 4,3 contra 81,0 no dia 05/05/2017 para 7,2 contra 67,0 num período mais recente.

Fundos incentivos de infraestrutura

Outra forma de entrar nessa “brincadeira” é por meio dos Fundo Incentivado de Investimento em Infraestrutura (ou FI-Infra), que foram regulamentados esse ano em linha com o aumento de apetite pelas debêntures desse segmento.

De fato, agora os FI-Infra também estão disponíveis para investidores não qualificados, além de flexibilizar os limites de investimentos dos FI-Infra em outros tipos de fundos, como os Fundos de Investimento Imobiliário (FII) e os Fundos de Direitos Creditórios (FIDCs), e em ativos, como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA).

Mas qual a vantagem em investir em um fundo desse tipo e não comprar diretamente as debêntures? O grande diferencial é que o fundo possibilita o acesso a uma família de debêntures incentivadas, o que pode minimizar o risco da carteira. 

Outro ponto é que, em geral, os gestores daqueles fundos despendem muito mais tempo avaliando as empresas que emitiram debentures do que os investidores pessoas físicas (seja pelo mercado primário ou secundário) e em tese mostrando uma melhor seleção.

Isso minimiza o risco de encontrar debêntures com rendimento baixíssimo, e em alguns casos abaixo da NTN-B (veja exemplo na página 38 desse relatório).

A não ser que você seja especialista num setor específico e conheça muito a situação financeira de uma dada empresa, talvez sua capacidade de decisão na escolha de carteira com debentures incentivadas não seja tão boa quanto a de um fundo.

Conclusão

O texto teve por objetivo informar o leitor de um tipo de investimento que deverá ganhar mais atenção nos próximos anos. 

A despeito de um risco ainda grande, vis-à-vis seus pares, é interessante monitorar o desempenho das debentures incentivadas para a infraestrutura, que são isentas de imposto de renda e podem até acumular bom rendimento. 

Esse é um mercado bastante promissor nos próximos anos, haja visto que o setor de infraestrutura deve ser o motor de crescimento do país nos próximos anos. 

As estatísticas mensais desse mercado estão sendo publicadas no Boletim Informativo de Debêntures Incentivadas, sobretudo mostrando os setores e empresas que estão recebendo maior aporte.

Sobre o autor
Arthur Lula MotaEconomista, já atuou no mercado financeiro e em departamento econômico, com elaboração de cenários macroeconômicos e estudos setoriais. Atualmente é Mestrando em Economia pela Universidade de São Paulo (USP) e dono de um dos maiores sites independentes de economia no Brasil – o Terraço Econômico.